Capítulo 2

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O dia havia acabado, mas não o meu interesse pelos acontecimentos da noite. Deitada em minha cama comecei a remontar os fatos, a imagem linda do San surgiu do nada, e junto com ela uma luz quente me atingiu no rosto. Lutei com meus olhos para abri-los; percebi que tinha caído no sono sem concluir minhas lembranças e aquela luz era só o sol entrando pela minha janela. No mês de maio o tempo é bem esquisito, mas alguns dias são de bastante sol e temperaturas altas o suficiente pra acordar suada. Não me lembro de ter tido nenhum sonho, normal ou maluco como os que eu ando tendo ultimamente. Acho que estava mesmo muito cansada ou sob o efeito do vinho, caí no sono tão rápido que nem tive tempo de pensar nas coisas legais que aconteceram.

Desci a escada e segui até a cozinha onde minha avó estava preparando o almoço. Só então percebi que havia dormido muito além da conta.

— Bom dia, bela adormecida! — eu adorava a voz da minha avó, era como um calmante pra mim. Meu pai me dizia que ela contava histórias pra ele dormir; e que ele nunca ficava acordado até o meio delas. Minha avó tinha o dom de acalmar qualquer pessoa, mesmo uma criança agitada.

— Bom dia Vó! Que cheiro bom. — dei um beijo em sua testa e peguei uma caneca pra tomar café. Parei encostada na pia e deixei os olhos perdidos; pensava em San e no quanto tudo me entusiasmou naquela noite.

— Está tudo bem querida? Parece muito pensativa hoje. ― ela me perguntou curiosa e com ar fraternal. Desanuviei os pensamentos e fui trocar de roupa falando enquanto subia a escada. — Não é nada não, eu estou me sentindo muito bem na verdade, há tempos não dormia tanto.

O dia passava rápido; fiz alguns serviços domésticos e conversei bastante com a minha avó. Carol me ligou e ficamos um bom tempo conversando ao telefone. Era bem mais fácil falar com ela à distância. Eu podia fazer careta e até conseguia esconder algumas informações. Fiquei aliviada quando percebi que na verdade ela queria me contar o lance que estava rolando entre ela e um amigo da nossa sala na faculdade. Isso fez com que ela esquecesse um pouco do ocorrido na noite anterior e não me abarrotasse de perguntas constrangedoras.

Depois da conversa com Carol, procurei me ocupar com outras coisas: vasculhei coisas sem sentido na internet, assisti a um filme de ficção e fiz um trabalho sobre citologia para a faculdade. Resolvi deitar e fazer novamente uma reconstituição da noite anterior. Eu não conseguia tirá-lo da cabeça.

— Já vai se deitar? Conversamos bastante hoje, mas você ainda não me contou como foi ontem à noite. ― vovó sorriu e estendeu a mão indicando com a outra que eu sentasse a seu lado no sofá.

— Não teve nada de especial, a noite foi divertida em alguns momentos. A senhora sabe como eles são engraçados, mas às vezes bem "desgostáveis". Posso definir a noite como um sucesso, para o meu padrão, porque conheci um rapaz que tem a voz mais encantadora do mundo, até mais do que a da senhora. Não sei bem como definir, mas ele parecia ter a voz de um anjo.

— Que bom, acho que você precisa sair mais, conhecer pessoas diferentes e talvez chegar perto de ser feliz de novo.

Além da minha amiga Carol, minha avó também se preocupava demais comigo. Por mais que eu dissesse que estava bem, ela sempre me dava uma lição de moral.

— Vó, eu sou feliz, só não sou a pessoa mais animada do mundo.

— Minha filha, o seu pai não iria gostar de ver em quem você se tornou depois que ele se foi. Você não é nem sombra do que era quando ele ainda estava por aqui. Não pode se culpar a vida toda, meu bem! Você sabe muito bem que não tinha nada que ele quisesse mais do que ver você sorrindo, mesmo que pra isso precisasse se vestir de palhaço e dar cambalhotas. O seu sorriso o fazia lembrar-se de sua mãe.

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