Assim Disse Almofadinhas

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Era sabido em todo o país que naquele dia passaria um cometa nos céus e pra minha sorte, não era um dia chuvoso. Eu, que sempre amei essas coisas, estava ansioso por tudo isso. Acordei naquela manhã radiante, tomei meu café, preparei meu telescópio amador, e levei Almofadinhas para passear. Meu cachorro adorava esses dias claros da primavera. E quem não gosta?
Levei-o ao parque e brinquei um pouco com ele, mas sempre de olho no relógio, afinal, não queria perder o grande evento que seria naquela tarde.
Finalmente, as 11:40 hrs, decidi voltar com ele pra comermos e depois assistir a passagem do cometa. Na volta, passei na frente de uma banca de jornais na qual haviam notícias sobre o cometa e Almofadinhas, estranhamente avançou em cima dos jornais. Ele nunca havia se comportado assim antes, por isso foi tão estranho. Ouvi falar de cometas que modificavam o comportamento de animais em alguns livros de ficção científica, mas não é algo que possa ocorrer de verdade. Se fosse, eu me sentiria num romance de H. G. Wells.
Fomos para casa, onde comemos, o almoço pra mim e a ração pra ele e o deixei dormir em sua casinha enquanto eu ia até o telescópio na janela. Olhei pra ver se estava tudo certo. Olhei então, para o relógio, e fiquei aguardando. O cometa deveria passar as 14:00hrs e duraria até as 14:15hrs. Aguardei até que lá estava ele.
Belo, brilhante com uma calda estranhamente azulada. Ele em si era branco e de um brilho intenso, algo quase divino.
Fiquei contemplando aquela maravilha quando uma voz que parecia ser de um adolescente falou atrás de mim e me deu um susto de gelar a espinha.

- Belo, não é? Pena que não dure muito por aqui.

Olhei em volta, mas não havia ninguém além de Almofadinhas.
Achei ser coisa de minha cabeça e voltei a observar o cometa. Então a voz disse novamente.

- Esse aparelho permite que veja bem?

Novamente assustado, olhei a minha volta, mas lá só estava Almofadinhas com a língua pra fora e balançando o rabo enquanto me olhava. Então falei brincando...

- Hey garoto, você fala agora? Haha

- Sempre falei, você que nunca me entendeu.

Dei um salto e fui parar do outro lado da sala. Aquilo não podia ser real... Meu cachorro estava falando.

- V-você fala?! Isso deve ser um sonho.

- Eu sempre falei, nós é que nunca entendemos a língua um do outro.

- Mas você é um cachorro!

- E você é um Xilophante... Espera, eu sou um oque?

- Um cachorro.

- Não senhor. Eu sou um Gardenu, me chamo Yöxun III, e sou de uma família nobre. Descendente do Rei Icantus.

- Mas do que você está falando? E porque está falando?

- Estou falando da minha linhagem. E não me pergunte porque entendemos a língua um do outro. Eu não faço ideia... Talvez seja a bola brilhante que esteja fazendo isso.

- Você está falando do cometa? - Falei enquanto me acalmava e chegava mais perto dele.

- Você disse comida? Sim, eu quero.

- Oque? Eu não disse comida. Disse cometa.

- Oque é um cometa? - Disse ele olhando-me com cara confusa.

- Como vou explicar? - Apontei para o cometa e disse... - Aquilo é um cometa.

- Aaah, a Bola Brilhante.

- Isso. - Disse, cedendo ao seu jeito. E então uma súbita curiosidade me ocorreu. - Escute do que você me chamou mesmo? Xilo... E oque você disse que era? Seu nome?

- Deixa eu te explicar. Talvez vocês Xilophantes achem que sabem das coisas, mas nós não somos cachorros como você disse. Somos Gardenu. Essa é a nossa raça e sempre foi desde o reinado do Rei Algury.

- Nunca ouvi falar deste rei.

- Claro que não, você não viveu no antigo Reino de Argomnia... Bem, eu tambem não, mas isso não faz diferença. Ouvi as histórias contadas a mim pelos outros de minha raça.

- Pode me contar essa história?

- Bom, já que não tenho nada para fazer... Sente-se, Xilophante.

Apos eu haver me sentado em uma poltrona, ele subiu no sofá a minha frente e sentando-se lá, principiou a falar. Eu mal acreditava que meu cachorro me contaria uma história. Ele disse:

- Tudo começou a muitos anos atrás. Sabe? Antes dos Xilophantes serem numerosos na terra. O planeta era nosso. O grande planeta Armuria. Tínhamos nossas cidades, que eram muito bem escondidas para não correr o risco de algum animal selvagem invadir. E caçavamos por aí para nós alimentarmos. O Nosso Rei era sempre alguém justo e os sub-reis de todas as cidades da Armuria deviam obediência a ele. Nosso maior Rei, foi meu antepassado, o rei Icantus. No seu tempo, éramos um povo numeroso, mas haviam aqueles entre nós, que eram traidores da lei. Diziam que a era dos Gardenu havia acabado. Que era a vez de uma nova raça governar. Ora, nós estávamos no poder desde a Guerra Mamifera. O povo escolheu, e decidiram se aliar a Xilophantes. Comendo os restos do que eles jogavam para fora da caverna. Ora nós éramos um povo inteligente, até construímos oque vocês chamam de Stonehenge. É claro que era um templo onde adorávamos ao grande Deus Agol, o qual alguns de vocês chamaram mais tarde de Anúbis, e achavam que era Deus de uma coisa só. Que tolos. E ainda sim tinham aqueles que se contentavam com as sobras de um povo que vivia em cavernas. Ta certo que vocês sabiam fazer aquela luz vermelha que queima quando toca nela...

- Fogo? - Interrompi.

- Essa parada aí. Mas nosso Reino ainda era grandioso. Mas como a maioria era a favor de deixar os Xilophantes governar, acabamos por ceder.

- Então vocês... Ahn... Gardenu não gostam de nós?

- Do que está falando? Nós os amamos, vocês são os melhores amigos que nós poderíamos querer. É claro que o antigo Reino era um paraíso, com carne a vontade. Cidades majestosas, campos verdejantes para correr até cansar... Mas isso não volta. É passado. O nosso presente é ao seu lado. Vocês Xilophantes não teriam chegado onde chegaram sem nós. Precisam de nós, assim como nós precisamos de...au au, au au au.

De repente Almofadinhas voltou a latir como um cachorro comum. Olhei pela janela e vi que o cometa havia ido embora, oque provava sua teoria sobre toda aquela loucura.
Olhei para ele e notei seu olhar tristonho, talvez por não podermos mais nos comunicar, e um vazio veio em meu peito.
Sentei-me ao seu lado e abracei-o. Então notei que eu estava errado. Nós sempre iríamos nos comunicar.

Assim Disse AlmofadinhasOnde histórias criam vida. Descubra agora