Pouco mais de uma semana havia se passado desde que João se instalara na hospedaria da Sra. Menon, e desde lá, há alguns dias que ele pensava constantemente em ir encontrar com o padre que conhecera a bordo. Não sabia bem onde encontrá-lo, o que ia dizer quando tivesse a oportunidade de uma fala, ou até mesmo se devia manter esperanças naquela cartada incerta. Mas dentro das possibilidades, era a melhor na qual podia se agarrar.
Para que tudo desse certo e a história se concretizasse, primeiramente tinha de descobrir onde podia estar o padre, e a única pessoa que podia lhe ajudar com isto, claro, era a francesa Camille. Sua senhoria, além de anfitriã, era seu contato no Brasil que mais conhecia o Rio de Janeiro e arredores. Sra. Menon se encontrava por estes lados havia décadas, e embora João não soubesse bem há quanto tempo ela havia chegado, já tinha ouvido da própria mulher que estava aqui desde antes da vinda da corte portuguesa e até mesmo antes da revolução liderada por Robespierre e Marat em seu país de origem. Se alguém sabia onde encontrar Benedito, portanto, esse alguém era sua senhoria. Sem mais delongas e tempo a perder, no desjejum, sentado à mesa com ela, João aproveitou e interpelou a francesa:
– Sra. Menon, por acaso sabe de algum lugar onde padres que chegam à cidade são recebidos? Onde eles podem se alojar e viver a sua vida religiosa?
– A cidade é imensa, João, há diversas ordens e conventos espalhados pelo Rio. Mas como vejo que está procurando alguém em especial, diga-me se teria mais alguma informação que nos ajude a encontrá-lo.
– Procuro um amigo que viera na mesma embarcação que eu. Em nossas conversas ele disse que portava uma carta endereçada ao bispo Dom Gabriel...
Nesse momento Camille deu um grito tão alto que, além de interromper João, acabou o assustando e emudecendo:
– Por que não me disse logo? Dom Gabriel é o bispo da diocese do Rio de Janeiro, e não só eu, mas todos o conhecem por aqui. É um homem muito bom e caridoso. Em todo este meu tempo de Brasil ainda não vi alguém que falasse mal dele, e olha que eu o conheço desde o início de sua carreira clerical. – Tomou mais um gole de água na caneca de barro endurecido para ajudar a engolir o bolo de fubá massudo e continuou: – Eu sei onde está o seu amigo, ele está no mosteiro de São Cristóvão que está anexado à igreja matriz. Você provavelmente deve tê-la visto quando desembarcou, pois é visível do porto. Se quiser chegar lá procure por um templo construído sobre um morro e com certeza não terá dificuldades em encontrá-la.
João tentou por um instante, mas não conseguia se recordar de tê-la visto quando desceu em terra, provavelmente devido ao fato de ter efetuado um desembarque um tanto quanto cauteloso e conturbado e não ter tido a oportunidade de se prender às minúcias como certamente faria em uma ocasião convencional. Por essas e outras que ele não tinha certeza se a busca seria tão fácil como Camille o dissera. O Rio de Janeiro era uma das cidades com a maior profusão de morros no entorno que ele havia conhecido. Nem mesmo a escarpada divisa entre a França e a Espanha, ou a costa da Grécia conseguiam acomodar populações inteiras em terrenos tão irregulares como aquele. Pelo menos essa era a conclusão que ele havia tirado a partir de suas observações de cabotagem.
– Vejo pelo seu rosto pensativo que não deve estar se lembrando do morro, correto? Pois não se assuste, é realmente fácil João. Qualquer coisa pode perguntar para alguém na rua. Se conseguiram fazer-lhe chegar à minha humilde pousada, imagine se não vão o guiar à diocese da capital reinol – disse ela, rindo e gesticulando com as mãos, sem largar o pedaço de bolo que se preparava para comer assim que terminasse a sua fala.
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O Preço De Se Tornar Rodrigo
Ficción históricaQuando não se tem nada a perder, por que não arriscar? Afinal, para quem nada tem, qualquer pouco que for alcançado já será muito. Este é o pensamento de João, um jovem português que, no século XIX, sem nada que o segurasse em sua terra, resolve par...