Capítulo XXXVII

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E por mais que ela quisesse que aquele momento não chegasse, aquele momento em que Folks batia em sua porta e aguardava sua presença estava ocorrendo. Do lado de fora ele a chamava para a tal caminhada, combinada "em comum acordo" no dia anterior. Se por um lado a situação a desagradava ao ponto de querer chorar só de lembrar no que teria de fazer logo mais, por outro ela queria, e muito, que isso ocorresse, ou melhor, queria mesmo era uma chance para comunicar sua decisão de abandonar a comitiva e ver-se livre de todo aquele peso que carregava. E melhor ocasião que esse famigerado passeio ela sabia que não haveria.

– Um momento, ainda não estou pronta – disse após a segunda leva de batidas enérgicas de Folks.

– Certamente – respondeu uma voz calma e baixa do outro lado.

E se – por obra da prepotência ou quem sabe do carinho e, talvez, até do amor – seu par imaginou que ela estivesse lá dentro aprontando-se e correndo para ficar ainda mais bela para o momento, constranger-se-ia ao saber da triste realidade, literalmente: Hage encontrava-se sentada à beira da cama há quase 1 hora, com uma expressão de total descontentamento. Além da situação em si, tentava encontrar a melhor forma de dizer a Folks o que tinha de ser dito. Seus únicos momentos de alegria e sorrisos rápidos eram quando imaginava que até o final do dia estaria finalmente livre para ficar no império e tratar exclusivamente de seu futuro com João.

– Podemos ir – disse ela, ao abrir a porta e ver a felicidade do homem, enquanto tentava esconder o seu sentimento infenso.

Ao saírem pela porta do Hotel do Imperador, o mesmo rapaz que havia a visto sair com João há cerca de 2 dias atrás, agora a via sair com mais um rapaz. O pensamento imediato dele, e de quem mais a visse naquela situação, foi de que a jovem nobre de corte europeia não era assim tão digna de respeito. Hage percebeu o olhar inquisitivo, de malícia e maldade. Por dentro inflou-se de raiva. – Quem ele acha que é para me olhar desta forma? Se soubesse de minha história de tristeza e fosse assim tão honrado quanto pensa, honrado ao ponto de julgar as atitudes que desconhece e daqueles com os quais não tem intimidade, certamente viria impedir-me de sair por esta porta com este homem.

Já na rua, na praça de São Francisco, Hage fizera questão de, no passeio, segurar no braço de Folks e andar sempre ao seu lado, não deixando que ele disparasse à frente, nem por 1 metro que fosse. A intenção dela, diferentemente daquela que o rapaz havia imaginado, não se dava por gosto e sim porque desta forma ela poderia ditar os passos, predizer por onde iriam caminhar e escolher quem a veria naquele momento. Se havia considerado ser o seu limite aguentar o simples menino da recepção olhando-a com cara de algoz, não podia nem imaginar o que sentiria e como reagiria caso cruzassem por aquela mesma senhora que, há menos de 24 horas, havia interrogado João, referindo-se a ela como sua noiva. Provavelmente cairia em lágrimas ao ver o olhar de confusão daquela negra que nada entenderia. Chorar. Isso era tudo que ela queria. Porém, por baixo daquele tenro e pálido rosto havia mais mulher do que poderiam dizer. Hage era mais forte do que aparentava e seguia dura como uma rocha, agarrada ao braço de quem odiava, pois era preciso, tudo pelo seu objetivo maior e amor verdadeiro.

– E então, senhorita, não se sente melhor depois de respirar um pouco desse ar fresco?

– Reitero que em nenhum momento estive mal ou sentindo-me de forma que inspirasse cuidados, senhor. Mas não posso negar que um ar fresco é sempre bom.

– Que ótimo. Sempre soube que estava certo a esse respeito. E quanto a senhora, que gênio forte possui, nem assim para dar o braço a torcer e admitir que estava equivocada. Pois bem, gosto deste tipo de mulher.

Aquelas eram as atitudes que mais a irritavam em se tratando de Folks. Altivo, achava que sempre estava certo e que somente ele tinha poder de discernimento. Que todos que pensavam diferente dele estavam errados. Talvez não tivesse falado aquilo para provocar a moça, pois era natural de sua personalidade, mas para ela soou como uma estocada. Respirou então e tentou responder com o máximo de calma que pôde.

O Preço De Se Tornar RodrigoOnde histórias criam vida. Descubra agora