Cecília engoliu em seco quando a porta do seu carro foi fechada. Por impulso, apertou ainda mais o volante deixando seus dedos dormentes; sentia uma mistura de nervosismo e entusiasmo. Estava acostumada com a presença de Arthur, afinal, trabalhavam juntos, mas estar tão perto dele em outro ambiente era, de certa forma, um choque.
Algumas horas atrás, havia acordado assustada com ligações insistentes em seu aparelho celular. Quando atendeu, ainda sonolenta, se apavorou ao perceber que era ele do outro lado da linha, ainda mais pedindo-a um favor como aquele.
Ele precisava de ajuda com uma encomenda e, sabe-se lá por que diabos, imaginou que Cecília seria a pessoa ideal.
— Está com o mapa?
— Sim, o caminho parece bem simples. — Arthur observou, divertido, a garota tremer ao ouvir sua voz grave.
— Para você, que não está dirigindo.
O tom deixava claro a insatisfação de Ceci ao ter que seguir os comandos de Arthur. Estava enfezada de ter que obedecê-lo até no seu dia de folga. Não bastasse todos os dias ter que submeter a ele quando estavam trabalhando em algum dos bolos, tortas ou doces, agora deveria seguir suas ordens até dentro do seu próprio carro.
— Não estou porque você não deixou.
No fundo, ele sabia que a ruiva apenas não queria deixá-lo no comando, ao menos não ali, no seu lugar por direito. Arthur sabia que, mesmo depois de quase dois anos, Ceci ainda não lidava muito bem com o fato de que ele era o melhor confeiteiro daquela loja.
— Porque o carro é meu!
Ela não queria se exaltar, mas era inevitável. O conflito que se instalara dentro dela era complexo demais: em um minuto queria socar Arthur e no segundo seguinte, queria beijá-lo. Ela sabia que se sentia atraída por ele — gostava dele, até — mas não havia percebido o quanto até precisar ficar um final de semana inteiro em uma cidadezinha do interior em sua companhia. Só esperava ser capaz de se concentrar.
Ela deu uma sacudida mental e pôs o cérebro para trabalhar.
— Qual o evento?
— Casamento do meu irmão. Precisamos fazer algo legal, diferente de tudo que já fizemos, um bolo bem especial mesmo.
Cecília sorriu. Algo na forma como ele falou aquilo os conectou, como se fossem uma equipe — ou um casal, juntos em uma missão. Ela constatou que apreciava muito a ideia, mas aí se repreendeu. Eles não eram nem uma equipe: Arthur era o melhor confeiteiro da cidade, e ela, uma aprendiz.
E, de qualquer forma, ela estava maluca por se sentir atraída por Arthur. Ele não havia a convidado para a cerimônia e festa; só precisava de alguém para pegar no pesado enquanto ele se dividiria entre curtir a família e gritar palavras de ordem. Mesmo que desejasse que ele o tivesse feito — e, se fosse sincera, ela desejava —, seria maluquice aceitar ser sua companhia. Tinha que manter o controle. Não podia colocar em risco seu nome nem seu trabalho. Ela era uma jovem moderna e independente, jamais sacrificaria um trabalho por um homem, por mais apaixonante que fosse.
***
Arthur pulou para fora do carro bastante surpreso. Sabia que o irmão escolheu se casar em uma casa de fazenda, mas não imaginava que o lugar fosse tão bonito. Atravessou o pátio carregando a sua mala e a da ruiva. O campo estava brilhante, com aquele verde fresco que só se vê em filme de tv. Aquilo seria realmente inesquecível.
Com a bolsa a tiracolo, Cecília observava tudo com muita atenção. Era um harmonioso dia de verão e ao seu lado estava Arthur, carregando sua mala para dentro de uma casa incrível. Naquele momento, tudo estava bem no mundo — pelo menos para ela. Após alguns minutos, enquanto ele imaginava se havia guiado para o lugar correto, a porta foi aberta por uma mulher de sorriso caloroso. O rapaz largou as malas no chão para abraçar a mãe.
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Receita do Amor [conto]
Short StoryArthur, o melhor confeiteiro da cidade, precisa fazer o trabalho mais importante de sua vida para o casamento do seu irmão. No entanto, o rapaz percebe que jamais conseguirá fazer a encomenda com sucesso sem Cecília, sua ajudante, ao seu lado. xx G...