— Quando começou? — Ouviu sua voz dizer. O som soou estranho aos próprios ouvidos.
Então parou para pensar e matutar. Meditar e refletir. Tentar entender "o que aconteceu com a sua existência?".
Onde foi que tudo começou a dar errado?
Pensou.
E nada.
Nenhum traço de memória fluía...
Terminou por perguntar-se: Quando os cabos deram curto circuito a primeira vez? Quando foi a primeira manutenção? Quando as engrenagens foram invertidas, fazendo com que tudo ficasse fora do lugar? Por que a partida foi dada e não funcionou? Quando? Onde? Por quê? Afinal, por que deu PT?
As perguntas se acumulavam em algum lugar dentro de si, sem resposta. Apenas sentia, não podia fazer nada.
Foi até a janela e olhou através. Observou o céu cinzento e a garoa fina que caía. Apesar do mal tempo, a luz do dia entrava, iluminando o quarto.
Quarto... A melhor definição para aquilo era "cela"; sem cor, sem graça, sem móvel algum.
Olhou para trás. A porta de aço continuava fechada. Parecia esbravejar insultos e zombar de sua cara.
— Por quê? — perguntou às paredes. Sua voz foi um pouco mais que um sussurro.
Nada mais funciona comigo, pensou. Foi perda total. Não pega, nem liga. Travou. E manutenção não resolve, conserto não resolve, reconstrução não resolve.
— O que vai resolver? — Levantou as mãos para cobrir o rosto e descobriu lágrimas quentes que nem sabia que estavam lá. "Nada vai resolver" sussurrou uma voz no seu interior.
— O que eu faço comigo? — Ao não ouvir resposta, berrou: — O que vão fazer comigo? — Esta pergunta era ainda mais desesperadora. Não sabia o que esperar vindo deles.
Sua garganta se apertou, pois segurou as lágrimas. Não deixaria que nem mais uma gota se derramasse. Seria forte, mesmo que fossem seus últimos momentos de vida.
A sociedade é renovável, tem seus experimentos, criações... Coisas que a favorece. Mas um robô quebrado... Não era útil. Tornava-se descartável.
Finalmente, não encontrou o que dizer para si, ou respostas para suas perguntas intermináveis. Nem Deus iria responder suas perguntas intermináveis. Então apenas esperou naquele quadrado sem vida.
Não esperou muito, porém. A porta de aço se abriu minutos depois. O vento entrou e gargalhou perante seu destino iminente.
Era uma peça amaldiçoada e este... Bem, este era o seu fim.
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Porta de Aço (Conto)
Historia CortaBaseado no poema "Peça Amaldiçoada" de Gritos Mudos. Este pequeno capítulo é uma narrativa sobre alguém - ou algo - que se questiona sobre a sua existência, enquanto espera por um destino desconhecido. Leia Peça Amaldiçoada em Gritos Mudos.