Não-heroína

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O rei discursou para o público, e eu me extasiei com todos os vivas que me eram direcionados. Afinal, eu era a solução para todos os problemas. Para os ladrões que se esgueiravam pelas janelas na calada da noite. Para os elfos que chegavam com suas pregações sobre a natureza e suas ameaças de guerra. Para as criaturas estranhas e poderosas que rondavam as florestas do reino — naquela época, Selestrya era apenas um reino.

Mysanna se debruçou sobre a balaustrada e observou seu império, os dedos tamborilando na pedra. Céu cinza, construções altas com telhados pontiagudos, carros andando lentamente pelas ruas estreitas e molhadas. E Daeva. Caminhando por entre as milhares de almas desesperançadas, estava Daeva. Mysanna não podia vê-la, não ainda, mas era capaz de senti-la. Seu poder era enorme — como um sol brilhando entre centenas de estrelas.

Deixou a varanda e foi se postar diante do painel que ficava acima de sua cama. Olhou para as armas ali penduradas, contemplando o brilho das espadas, facas e pistolas enquanto tentava se decidir pela melhor. Havia muito tempo que não precisava se preocupar tanto com aquela etapa durante a preparação para um embate.

Quando finalmente se decidiu pela maior espada, uma pistola e duas facas extras, batidas soaram na antiga madeira da porta.

— Entre — ela comandou.

Era Nalise. A jovem piscou para ela, um tanto surpresa, e Mysanna demorou a entender por quê; fazia tempo que não via necessidade de vestir sua armadura.

— S-senhora — Nalise balbuciou. — Daeva está aqui. Ela... Ela deseja vê-la.

Mysanna assentiu para a amiga.

— Deixe-a entrar.

Nalise hesitou por um segundo — o suficiente para Mysanna reparar nos trejeitos de seu semblante que denotavam genuína preocupação —, então fez uma reverência e se retirou.

Mysanna suspirou. Chegara a hora de enfrentar sua maior inimiga.

Não-heroína [AMOSTRA]Onde histórias criam vida. Descubra agora