De inverno à primavera

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    Casamento.

    Essa palavra oculta tantos sentimentos, os mais diversos, e, em meu caso, os mais contraditórios possíveis.

   Quando eu havia completado minha décima sétima primavera, iniciara pela vila uma onda de boatos infundados e inadmissíveis, sendo que o principal deles relatava que eu iria me comprometer -- diante de Deus e dos homens -- com um conde português.

   Imagine só como fiquei pasma e abismada! Eu, que era zelada por minha família como a mais rara jóia, iria comprometer-se sem demais explicações? Com um estrangeiro, sobretudo, um estrangeiro de alto título! Tal fato implicaria em mudar-se para outro país, viver longe de tudo e todos que conhecia e amava.

   Era um absurdo e fui imediatamente ao escritório de meu pai, numa tentativa de ficar a par da situação. Ele, numa calma de impressionar até santo, apenas disse:

   "Deveras, ao final de três meses, não estará mais à solta pelo mundo."

   Fui contra a todos os ensinamentos éticos em mim inseridos e retruquei-lhe, dize-lhe que não haveria de casar-me com um homem que não amava, pelo Céus, um homem que não conhecia! Meu pai, conhecia-me e estava preparado para retomar o total controle daquela conversa, logo disse que não permitiria que eu continuasse só por muito tempo, que toda jovem honrada de minha idade já possuía alguém para estender-lhe o braço ao descer do tiburí.

   "Além do mais, seu noivo é o primogênito do Sr. Brás, antigo amigo da família."

   Eu tentara, com todas as forças do meu ser, converter as ideias de minha família. Utilizei de todos os argumentos ao meu dispor. Mas já era tarde, meu pretende e a parte de sua família que morava em Portugal, a parte materna, já havia chegado em solo brasileiro. Acordos e negociações já haviam sido feitos, restava a mim apenas os detalhes frívolos da cerimônia.

   E assim como dito, fora feito. Mal tive tempo de aproveitar os ventos gelados do inverno paulista. Em três meses, tudo estava perfeitamente arrumado. Mas ainda não me fora permitido conhecer meu futuro esposo e, honestamente, não possuía ânimo para discutir ainda mais com meus pais.

   Assim, restou-me apenas esperar.

  Quando as portas da casa divina se abriram e a música matrimonial ressoou em meus ouvidos finalmente pude vê-lo. Era...majestoso. Ah, áurea que o cercava fazia parecer que havia saído diretamente do palácio do próprio rei! Mas o mais intrigante era forma que sorria, um esticar sutil de lábios que iluminava seus olhos. Como alguém permitiria sorrir de forma tão dócil perante tamanha farsa?

  Eu certamente não o entendia, porém suspirei junto a seu sorriso que, por aquele momento, se mostrava digno de ser desvendado.

O Conde de CoimbraOnde histórias criam vida. Descubra agora