Madrugada. Não tenho sono novamente. Não há nada que justifique isso, a não ser que uma frustração quase plena de minha vida sirva como argumento. Geralmente quando o meu sono resolve tirar férias, faço algo para atraí-lo de volta como assistir a um filme ou série na Netflix ( o que não dá muito certo ) ou leio algo no Wattpad, o que definitivamente não resolve a situação, porque, uma vez a plataforma aberta, é muito difícil deixá-la. Hoje escolhi o Wattpad. Mergulho numa história mítica com um protagonista encantador e caio, literalmente caio, mergulho, sou puxada para dentro da plataforma.
Não vejo nada e não sinto o meu corpo. Só há a escuridão e uma sensação de estar sendo desfeita, como se alguém estivesse "te misturando" num caldeirão ao mesmo tempo em que despenca livremente sem parar.
"BASH!"
Finalmente vou de encontro a uma superfície estatelando-me em algo que acho ser o chão.
"O que é isso?!?" Escuto alguém dizer, há espanto em sua voz.
"Quem é você? O que houve comigo?" Interrogo a pessoa enquanto levanto tirando a sujeira de mim e curvando-me de dor.
"Jura? Não sabe mesmo? Acho que a única pessoa que deveria questionar alguém aqui sou eu." Diz a voz, cuja posso atribuir um rosto agora.
Ele é alto, de pele bronzeada, cabelo longo extremamente preto, com incríveis olhos verdes e seus músculos esguios são visíveis por baixo da sua camisa branca de linho.
"Oh! Você é o..."
"Sim. Afinal, você lembrou anjo caído." Ele diz cruzando os braços e rindo de mim. Rindo de mim!
"Como isso é possível? Isso sequer é real? E não ria de mim!" Desando a falar já recomposta.
"Você fala demais, mas vou esclarecer suas dúvidas. Aqui vai... Não faço ideia." Fala se aproximando de mim. "Isso responde a todas as suas perguntas." Para na minha frente e encaro sua face de traços finos.
"Não tem graça. Isso foi inútil. Você é inútil." Ponho o dedo no seu peito. "Vou embora." Começo a andar.
"Adoraria ver como." Ele fala atrás de mim.
"Se sabe como ajudar, por que não me diz?"
"Seria fácil demais. Você parece ser o tipo de garota insatisfeita com a vida." Ele anda a minha volta, pega numa mecha de meu cabelo. Eu só o observo.
"Aqui esta a sua chance. Pegue-a." Acena com os braços para a nossa volta.
"Não posso. Não pertenço a este lugar. Esta história." Explico. "E você? Não parece ser o cara da história que leio. Você já tem uma vida. Um destino totalmente traçado."
"E o que há de bom nisso?" Faz uma careta, acho que de indignação talvez. "E as possibilidades, onde ficam? Não tenho perspectiva de mudança. Você, no entanto, tem um mundo de infinitas possibilidades. E o que faz? Só reclama! Aqui e com certeza no lugar de onde veio..." Ele solta a respiração presa e faço o mesmo, nem sabendo que a tinha prendido.
"Isso... Não é verdade... Quer dizer, não posso, não sei o que fazer.... Aqui ou... Lá." Atrapalho-me com as palavras.
"Deixe-me te mostrar. Sua vida não precisa ser um fardo e nem a minha." Segura minha mão com intimidade. "Isso que aconteceu com você foi um presente, acho que para ambos na verdade."
"Mas sequer faz sentido, era para seu coração já ter um dono e você estar feliz com sua vida, no entanto..."
"Não me ouviu?" Ele interrompe.
"Certo. Não sei o que estou fazendo, o que aconteceu, não sei de nada. Mas aceito. Me mostre." Desisto simplesmente.
Ele sorri e arrasta-me correndo para não sei onde.
Chegamos numa espécie de lagoa com água totalmente azul. Linda.
"Pula." Ele diz.
"O que?! Por quê?"
"Só pula!" Gargalha. "Vamos juntos."
"Tá bem.." Começo a contar... Um... Dois... Ele segura minha mão e me puxa, caímos juntos na água. Abro os olhos e não estamos mais na lagoa.
"Como fez isso?"
"Te disse. Um mundo de possibilidades. Só precisava que alguém tornasse possível."
"Eu torno isso possível?" Fico boquiaberta.
Estamos no topo de uma montanha com uma vista perfeita. Lá embaixo um rebanho de ovelhas pasta na relva. Uma mulher com vestido marrom longo as segue junto com um cão preto e branco.
"Então... É só querer que seja possível?"
Ele olha para mim e consente com a cabeça.
"É só isso... Tudo esta resumido a isso. Querer."
"Mas eu sempre quis e nunca aconteceu nada. Sempre quis muitas coisas. Coisas como formar-me em Arquitetura em uma faculdade de minha escolha, abrir meu escritório, dar uma vida melhor para minha mãe, viajar... Nunca aconteceu." Termino.
"Talvez você nunca quis com muita força... Eu quis com todo o meu ser que algo mudasse e aqui está você. Minha possibilidade." Ele segura minha cintura aproximando nossos corpos, nossos rostos estão tão perto que sua respiração exala sobre mim. E sinto, sinto seus lábios nos meus, abraçando-me para onde achei que não fosse possível, assim como tudo o que já havia pensado.
"Não." Afasto dele.
"Mas..."
"Shhhii.." Faço com que se cale "Você é minha possibilidade..." O beijo "Mas não posso ficar."
"Pode sim... Fica..."
"Vem comigo!" Digo... "É possível..."
"Eu vou."
O abraço fortemente, beijo sua testa e despencamos do topo da montanha, querendo com toda a força que caíssemos em meu mundo. Meu mundo de possibilidades.
