Eles podem se inverter quando você menos espera.
Como naquele dia, por exemplo.
Eu estava de volta à Terra e devia ter mantido distância do meu humano irritante, afinal.
Mas não.
Eu precisava vê-lo, ter certeza de que estava aleijado e de que nunca mais incomodaria mais ninguém.
Precisava vê-lo sofrendo.
Machucado.
Chorando se possível, como a criatura frágil e repugnante que era.
Ou eu pensava que era por isso.
Mas estava enganada.
Embora eu não fosse admitir aquilo naquele momento, ah, não.
E por que não?
Ah, não se apresse. Você não vai querer correr com o seu tempo, não é?
Foi o que eu pensei.
- Era um anjo, Henry, eu juro.
Oh.
Lá estava ele, deitado em um leito de hospital, a perna atacada enfaixada, o rosto coberto por hematomas, e arranhões agora limpos por algum anti-séptico barato.
Tentei ordenar meus lábios a se contorcerem em algo que pudesse lembrar vagamente um sorriso, mas eles não me obedeceram. Eles não iriam me obedecer, e não iriam porque o verme e a bactéria pareciam ter reivindicado o controle do meu corpo, e faziam dele seu hotel cinco estrelas.
Anjo.
Outra vez aquela palavra equivocada que se revirava dentro de mim como um ciclone tropical.
- Você bateu a cabeça, imaginou coisas. – respondeu o primo loiro bonitão que eu não tinha reparado estar ali. – Agora durma.
Isso, durma.
Assim eu não teria mais que ouvir sua voz grossa acordar meu verme intrometido, e nem teria que prestar atenção nos olhos azuis brilhantes.
Mas é claro que ele não dormiu.
Quanta pretensão da minha parte.
- Eu estou falando sério, eu vi! Ela levou o urso. Ela o matou!
Uh-oh, havia alguma coisa errada.
Ele não podia ter me visto.
Não devia.
Humanos não podem me ver, não até que chegue sua hora.
E aí já não faz diferença, uma vez que não podem tagarelar sobre o fato com ninguém.
Ao menos que eu queira.
Mas eu não queria.
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O homem que me chamava de anjo [FINALIZADA]
ParanormalEu poderia dizer que essa é uma história com um final feliz. Uma história de amor, talvez, e então você se importaria em lê-la. Mas não. E não, simplesmente porque eu não estou aqui para te agradar, e sim para reunir o que sobra da minha memória fra...