Mas o que fiz de errado? Quais foram suas razões para fazer o que fez comigo? Usar-me como seu brinquedinho particular enquanto eu estava lá, achando que todas aquelas palavras de amor eram verdadeiras e profundas? Deixar-me chorando rios de lágrimas após nossas piores brigas enquanto você não sofreu nem mesmo um segundo por mim?
Acho que, afinal, nunca passei de um passatempo divertido para suas horas vagas. Alguém a quem você recorria nos seus tempos mortos e treinava sua habilidade persuasiva, convencendo a mim e a si mesmo de que tudo que sentia era válido, quando na verdade você sabia que era apenas uma mentira bem bolada. Alguém a quem você recorria quando sua boca secava e o desejo do corpo insistia em crescer.
Fico imaginando o que fazia quando voltava da minha casa, saciado. Será que se arrependia, mas a tentação de continuar até onde conseguisse era maior? De ver onde chegava e até onde eu acreditaria em você? Ou será que ria da minha ingenuidade enquanto eu rolava na cama pensando nas promessas de amor feitas entre lençóis? Não, não. Provavelmente você apenas se deitava e dormia, sem nem ao menos se preocupar com minhas emoções.
Achava que essa dissimulação não viria à tona um dia? Que eu seria estúpida o suficiente para nunca perceber a falsidade dos abraços, a amargura dos beijos, a opacidade dos olhares apaixonados...
Agora me afogo no desespero de te abandonar como se nada houvesse acontecido, deixando para trás esse passado quimérico e tentando, dessa vez eu mesma, convencer-me de uma vez por todas de que tudo não passou de um sonho. Essa marca a ferro quente continua em meu peito, lembrando-me de que um dia fui inocente o suficiente para acreditar nas suas mentiras; lembrando-me sempre para que num futuro próximo, homem nenhum me trague em seu oceano de inverdades e me iluda com seus gestos gentis e sorrisos complacentes e abraços ternos.
Traiçoeiros.
Mas hoje... Ah, hoje trago meus pés novamente à terra firme e sigo meu caminho. Bato meus sapatos antes de partir, pois desta relação não quero nem os restos sujos que se grudam em minhas solas.
Sigo, enfim, sem olhar para trás.
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Quimera
Non-FictionMonólogo dramático desenvolvido para apresentação durante um sarau universitário.