Quadro branco

18 4 5
                                    

   Esses dias eu estava pescando e por algum motivo não aparente lembrei quando eu tinha minhas asas. Recordei-me de todos os lugares que passei voando, das coisas horríveis que vi também, por mais que isso seja razoavelmente bom, me fez querer ter assas novamente, e sei que não vou tê-las de volta. 

   Mas foi bom ver os pinguins, eles são bem simpáticos, brincalhões, e muito solidários uns com os outros. Foi meio ruim pra voltar pra casa depois, mas valeu muito a pena vê-los.

   Horrível mesmo foi não ter forças pra defender os leões dos caçadores, quando fui ajuda-los a fugir dos caçadores levei um tiro no  braço, e eles me prenderam numa caminhonete junto com os corpos dos leões, isso foi horrível... Ver aqueles leões chorando de dor foi a pior coisa do mundo, e eles nem se preocupavam com o que estavam acontecendo, na verdade eles estavam rindo muito, quando a porta abriu tive que fugir... Voando de volta pra casa que percebi que eu tinha que tomar mais cuidado...

   Quando eu me lembrei disto, eu perdi a vontade de pescar. Remando para uma parte mais segura do rio me senti mal, mal por está ali, remando... É difícil e doloroso olhar pra água e não ver seu reflexo... Quando eu chego ao porto, estou só... Amarrei meu barquinho no porto, peguei minha mochila e fui caminhando pela trilha.  Fiquei com pena de pisar nas plantas, de respirar perto delas, elas tem vida, e creio que isso é muito importante... E cada vez que eu caminhava mais eu me sentia mal, mas eu me sentia humano... Humanos sempre destroem as coisas... E quanto mais eu pensava mais eu me sentia mal, mas eu me sentia um corpo sem alma, uma flor sem cheiro... Eu não sabia que isso poderia acontecer logo comigo, isso que eles chamam de tristeza realmente existia... Meu corpo amoleceu, depois de caminhar uns 7 minutos eu caí, gritei socorro varias vezes, e ninguém me ouvia, os pássaros foram embora e eu fiquei caído no chão, as formigas passavam do meu lado, e o sol já estava se pondo... Naquele momento eu achei que seria melhor me despedir, e me desculpar com a natureza que eu tive pena, sentir pena é a pior coisa que se sentir por alguém ou por algo. Minha mente estava a descansar, meus lábios estavam secos, e meus pulmões estavam a me dizer adeus. E eu? Eu achava que aqui em baixo era belo, uma parte é, mas eu achava que o ser humano vivia nela sem que a destruísse, isso me fez chorar, me fez perder certa esperança que tinha... Meu peito doía, e isso deixava minhas pernas mais leves, e eu não gostei disso. 

Começou a ventar, agora tudo parece fazer sentido, conforme o vento ficava mais forte mais o meu corpo se desfazia...
Eu senti saudade do lugar que eu não devia ter saído, sinto falta dos abraços, dos beijos, das palavras suaves, dos meus irmãos, dos meus sonhos, das minhas crianças, das minhas asas...
E agora? Ficarei aqui? Parece que tudo que estava acontecendo a algum tempo eu merecia... Ou não? Eu ainda posso mudar alguma coisa? Posso fazer diferente? Posso fazer alguma coisa? Silencio...
É hora de eu ir embora? Parece que sim... Sabe o meu corpo? Ele já era agora... Sabe esse vento forte? Ele não queria me fazer mal, ele só estava fazendo seu trabalho... E eu? Eu queria fazer tudo de novo... Protege-la como eu tinha que proteger, amar do jeito que eu tinha que amar, ser amado como eu devia ser amado, socializar do jeito que devia, sorrir do jeito que se podia... E agora? Agora eu vou embora, porque meu tempo acabou... E depois disso? Depois disso não tem mais nada... Só as lembranças de quase todos os dias que morri, e também todos os sorrisos que vi que são as lembranças mais gritantes... Uma voz bem doce me diz adeus... E essa voz me conforta... E agora finalmente é hora de ir embora...  

Conversa de LoboOnde histórias criam vida. Descubra agora