Abri os olhos e olhei para o relógio na cabeceira. Quatro e meia da manhã e eu estou novamente acordado. Quantas noites já fazem? Perdi as contas... Todos os dias, exatamente às quatro e meia, eu acordo ofegante com uma estranha sensação muito semelhante à de medo, mas não é medo propriamente, é como a sensação de estar coagido, de fragilidade. Cogitei que isso talvez se desse por conta de algum pesadelo sombrio, contudo, fosse este o caso, não era capaz de me lembrar do que o suposto sonho havia se tratado depois que acordava.
Sempre quando desperto na madrugada e abro imediatamente os olhos, vejo da cama a janela que fica imediatamente à minha esquerda, por onde é possível ver uma fração retangular do céu escuro que aos poucos da lugar ao dilúculo do novo dia. É comum que neste horário a cidade esteja coberta por uma tênue névoa que, imagino, deve cobrir tudo até onde a vista alcança. Digo "imagino", porque nunca tive vontade de me levantar e ir ver como é a cidade nesse horário, me contentando apenas em assistir, com o rosto junto ao travesseiro, à noite lentamente desvanecendo, sempre com a esperança de que com ela a sensação desagradável a que me referi, desapareça.
Hoje, porém, assim que abri os olhos, notei imediatamente que o vento ululava através das árvores com uma violência incomum. Mesmo não havendo muitas árvores na rua onde eu vivia, naquela noite, as poucas que havia, faziam um barulho perturbador que só fez agravar a sensação incômoda que me acometia. Encolhi-me na cama e cobri o rosto esperando que a sensação, como nas outras as noites, passasse, mas a infantil tentativa de desvencilhar-me daquilo provou-se inútil quando, de repente, lá fora, um som hediondo pareceu somar-se ao já perturbador ulular. Não era um som cuja autoria eu pudesse atribuir ao vento, nem tão pouco, associar ao de qualquer animal conhecido, ou pelo menos conhecido por mim, e só pude concebê-lo de uma forma: um grunhido.
Levantei a beirada da coberta e espreitei pelo pequeno espaço a janela retangular, para descobrir que aquela noite não se parecia com nenhuma outra noite que eu já tivesse visto. O céu lá fora possuía um curioso aspecto de cor esmeralda. O céu não amanhece com esta tonalidade, pensei.
Reunindo certa coragem — o mesmo tipo de coragem que é motivada pela curiosidade — me levantei tentando não fazer nenhum barulho, o que admito, não fazia sentido, mas foi como uma reação instintiva, e me esgueirei agachado até a janela. Quando alcancei o batente, lentamente fui erguendo a cabeça até que pude olhar para fora. A rua estava coberta pela névoa, mas era muito mais densa do que o normal, de tal modo, que eu não pude ver muito além, a visão alcançando apenas um raio de alguns poucos metros. Meus sentidos perscrutaram em busca da fonte daquele som repugnante, mas fui incapaz de identificar sua origem, como se ele ecoasse, fazendo parecer que vinha de toda parte.
Pavor. O que senti foi uma espécie de pavor primitivo, algo dentro de mim gritava, mas eu não entendia as palavras. E, quando voltei meus olhos na direção do céu o pavor se multiplicou, pois o que encontrei lá fez meu estômago revirar: A névoa que cobria tudo espiralava sob a luz esverdeada e espectral, como se estivesse indo em sua direção ou como se viesse dela. Cheguei a pensar que ainda dormia, e que aquilo se tratava do hipotético sonho misterioso do qual nunca me lembrava. Fiquei estático, ajoelhado sob a janela enquanto assistia o redemoinhar da névoa sob o céu esmeralda, cujas cores se assemelhavam com as de uma aurora boreal, algo que não poderia ocorrer ali e que eu só havia, desinteressadamente, visto por fotos. De repente, senti que os pelos do meu corpo se eriçaram, como se uma mão fria deslizasse pela minha espinha. O vento se agitou com ainda mais violência, ululando raivosamente através das árvores e, no meio da agitação, o grunhido contínuo pareceu tornar-se próximo de maneira alarmante, carregado agora com uma espécie de hostilidade consciente. Instintivamente, me abaixei sob o parapeito tampando os ouvidos com as mãos e, mesmo com eles tapados, continuava ouvindo o grunhido terrível. Meu corpo começou a tremer e eu voltei a fechar os olhos até que, da mesma maneira repentina que o guinchar começou, ele parou. Eu destapei os ouvidos e tudo que consegui ouvir foi o som da minha respiração e os sons comuns da noite. Mais uma vez e lentamente espreitei sob o batente. A estranha e fantasmagórica luz no céu havia desaparecido, e a névoa era como a de qualquer outra madrugada, porém, não houve tempo para que a serenidade se instalasse em mim, pois fui tomado de um horror dilacerante quando ouvi novamente o som abominável recomeçando, sussurrante, não na névoa lá fora, mas junto à minha nuca.
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4:30 AM
Mystery / ThrillerHá quem diga que nosso universo é apenas um de muitos, e que nas condições ideais janelas podem se abrir. Resta saber quais seriam as consequencias quando um hipotético indivíduo, tendo sido confrontado pela temerária curiosidade diante do desconhec...