O Grito da Banshee

211 16 44
                                    

Eu odeio funerais. Sempre tão melancólicos... E recentemente tive que passar por vários funerais.

- Mamãe, a vovó está indo pro mesmo lugar que o papai? Quem os levou?

- É a peste, filho. Está judiando nossas plantações e matando nossos familiares, um a um.

São tempos difíceis esses que vivemos na Irlanda. Uma doença estranha infectou todas as plantações de batatas da região, que é basicamente todas as plantações que temos. Estamos sem alimento e os que se aventuram a comer as batatas estragadas acabam adoecendo e morrendo... Me aproximei de minha mãe e falei baixinho em seu ouvido.

- Mãe... eu a ouvi de novo

- Deixe de traquinagens, pequeno Johnny

- É verdade mãe, eu ouvi ontem a noite, o grito da moça que vovó costumava chamar de "banshee".

Segundo minha vó, a banshee era um espírito do reino das fadas que tinha o poder de prenunciar a morte. Sempre que alguém morria, as pessoas próximas e a própria vítima ouviam de longe seu grito.

- Pare de bobagens filho, sua vó não está mais aqui, então em sua memória, deixe essa história de fadas de lado e deixe sua pobre mãe em paz por um segundo, sim?

Minha mãe nunca gostou das histórias da minha vó, eu amava cada uma delas. Basicamente cresci com essas histórias. Fadas, elfos ,duendes e leprechauns. Meus pais eram mais centrados na vida real, e não era difícil entender o porque, pois a vida aqui era muito dura.

- Molly, você conseguirá pagar o aluguel das terras desse mês? - Pude ouvir nossa vizinha comentar com minha mãe

- Como? Com as plantações estragadas... Eu devo dizer Kara, nada disso é nem um pouco justo

- Não é como se eu gostasse de pagar aluguel a um senhorio que está gastando nosso dinheiro em algum lugar de Londres... Mas precisamos de um lugar para viver, não é mesmo?

- Sim, mas está tudo tão terrível, não sei se irei suportar... e a doença que levou minhã mãe, eu acho que... Filho, vá brincar lá fora, por favor.

Atendi prontamente, afinal não gostaria de ficar mais um segundo lá dentro. Do lado de fora pude ver as nossas plantações e as de nossos vizinhos, uma a uma destruída. Rapidamente ocupei a minha mente com algo que me atormenta desde anteontem.

Na noite antes de vovó morrer, quando fui me deitar, escutei um grito estridente e assustador que me gelou a espinha. Ele vinha de longe e não parecia exatamente humano. Corri para perguntar a minha vó o que era e ela havia me dito que se tratava do grito da banshee, e que... bem, ela sabia que esse espírito iria buscar ela aquela noite.

Dei um abraço apertado nela e pedi para que não nos abandonasse, e lembro claramente das palavras dela nessa última noite.

- Meu netinho, no mundo há coisas que não podemos controlar, e uma delas é a morte. Todos nós estamos aqui na terra mas temos nosso tempo, e o meu está chegando... mas não tem problema, irei finalmente me juntar ao mundo mágico das fadas e elfos. Por isso não tenho medo.

- Mas... eu te amo, vovó.

- E eu te amo também, meu neto. E se você me ama de verdade, vai entender porque tenho de ir.

- Vovó, eu não entendo... se vamos todos morrer dia ou outro... pra que continuar a vida, para que sofrermos antecipando tudo?

- Olha meu neto... Não há porque sofrer antecipadamente com o que está por vir... temos sim é que viver com alegria e determinação, aproveitar o máximo que pudermos e sempre estarmos abertos para a vida. Um pequeno elfo uma vez me disse que "o sol nunca brilha em portas fechadas".

O Grito da BansheeOnde histórias criam vida. Descubra agora