Parte VI

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               No alto da montanha, onde sempre era noite e os deuses, eternos, Sileno encontrou-se com Apolo. Não foi preciso chamá-lo; o deus já o aguardava, numa visível expectativa.

             — Então? Trouxe?

             Sileno o mirou, incrédulo, a flauta e a lira escondidas nas costas.

             — Você ainda duvida? Não viu tudo?

             — Não sou Zeus, Sileno. Para mim há limites até onde posso enxergar.

             — Perdeu um belo espetáculo. Pã é muito bom na música.

             — Então você entregou minha lira para aquele bode velho? — acusou Apolo, furioso.

             Aquela reação deixou Sileno alarmado.

           — Eu disse que Pã era bom, mas não foi o melhor — e lhe mostrou a lira, depois a flauta.

            Apolo ficou mudo. Seus gestos congelaram. Sileno lembrou-se das estátuas que os mortais reproduziam do deus ‒ não havia nenhuma diferença. De súbito, ele voltou a se mover e um grande sorriso se abriu no belo rosto, mostrando dentes alvos.

            — A Flauta de Pã — Seus olhos brilharam de uma cobiça doentia ao tocar os tubos de bambu ainda nas mãos de Sileno.

            — Quero que me torne um mortal. Um homem completo — cobrou o jovem fauno, devolvendo-lhe a lira, um objeto que não lhe pertencia. Tinham um acordo.

            — Um mortal. Um homem perfeito à imagem e semelhança do grande criador — Apolo dizia, enquanto tirava de seu manto um arco e uma flecha. — Nosso acordo está selado.

            Rápido, apontou a flecha para Sileno, que não teve tempo de se defender. O risco incandescente atingiu-lhe no meio de testa, e ele caiu. O vento ficou mudo. E tempo parou.

CLAIR DE LUNEOnde histórias criam vida. Descubra agora