Capítulo 21 - A Dor

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Isadora...

Sinto que morreu um pedaço de mim, mas ainda sinto o fio que ligava nossas almas, conectado. As lágrimas não caem mais do rosto, por que já se esgotaram, mas por dentro minha alma ainda chora. Não consigo movimentar meu corpo, sinto como se minha morte também está próxima, minha vida não tem mais importância para mim, pois o que eu amava verdadeiramente se foi. Ainda tenho Lobo, que me consola nessa hora, ele parece sentir o que sinto, nem seus olhos brilham mais. Sra. Peter e meus pais tentaram me fazer reagir, mas até as palavras não saem de minha boca.

Os momentos com Kaliel ficam vagando por minha mente, como um filme que sempre se repete, o metal frio da espada me faz sentir que ainda estou viva. As folhas do livro branco não conseguem escrever palavras que me consolem.

O uivo de Lobo a noite é um sinal de dor, parece querer enviar uma mensagem aos céus e pedir compaixão por mim, mas eu não mereço isso, tudo que estou sentindo é conseqüência de um amor proibido, mas verdadeiro.

Os dias continuam a passar de forma lenta e dolorosa, sinto a morte próxima, como uma carta enviada de longe, sua chegada me fará feliz.

Meus pais entram no quarto, em seus rostos vejo dor e me sinto ainda mais culpada. Ela senta ao meu lado na cama.

– Filha, eu e seu pai conversamos – ela respira fundo – como você não está melhorando, achamos melhor interná-la, se pelo menos você disse-se o que a deixou assim.

Eles estão com aparência cansada, será que devo contar? bem vão me internar mesmo, e se iram acreditar ou não, é problema deles.

– Bem... querem mesmo saber? – digo devagar, eles confirmam com a cabeça, meio espantados por ouvir minha voz depois de tantos dias.

– Havia alguém, que não morava aqui, morava longe, ele era um anjo, guerreiro e confiava no Senhor, como eu também confio.... Eu o amava mais que tudo nessa vida e ele também... Não podíamos ficar juntos, mas mesmo a distância, não foi capaz de impedir nosso amor... Mas ele morreu.. ele morreu... – sinto meu rosto úmido, as lágrimas voltaram a cair.

Mamãe fica branca – Miguel?

– Não mãe, não estou me referindo a Miguel – digo triste, mas feliz por ele não estar morto.

– Ele realmente era tão importante para você? – papai diz.

– Sim, ele era um anjo – desvio de seus olhos e encaro minhas mãos unidas no colo.

– Minha filha querida, vai ficar tudo bem – Mamãe me abraça.

– Não mãe, ele morreu – digo e choro em seu ombro.

– Você disse que confia no Senhor – papai diz e confirmo com a cabeça – Coloque nas mãos do Senhor e ele te ajudará – e me abraça forte.

A noite cai e resolvo pegar o livro.

– Abra – ele se abre, folheio suas páginas em silêncio até encontrar escrito: "coloque sua dor nas mãos do senhor".

– Bem se é isso mesmo que devo fazer – lembro do que papai havia mencionado. Resolvo escrever no livro minha dor, pego uma caneta e começo a escrever:

"Senhor, me ajude, socorro.. desejo, desejo que isso tudo acabe, essa dor, angústia, tristeza.. Choro para desabafar, mas minhas lágrimas não escorrem no meu rosto e sim em minha alma, como o fogo que queima em meu coração e se torna cinzas. Minha cabeça lateja, os dentes doem e a dor de meu amor corre em minhas entranhas. Sinto frio em meus pés e mãos, sinal que ainda estou viva, pelo menos uma parte, pois a outra está morta. Sinto saudade de minha alegria, do sorriso na face, a tristeza me toma conta só em lembrar. A sensação é de morte, a mente diz que a sobrevivência se faz necessária, mas o coração não respeita ela. Me ajude a sobreviver, me ajude a retirar essa dor, que fique apenas as boas lembrar, como algo para se recordar que um dia eu tive bons momentos ao lado do meu amor, que os poucos momentos se tornem jóias raras em minha mente. E que a dor seja uma triste lembrança, mas não tão forte que possa ser maior que as boas lembranças. O amor é algo bom e doloroso, que mesmo a morte não consegue destruir."

Quando acabei de escrever, apareceu: "O amor é tão poderoso quanto a morte." Largo a caneta sobre o livro, me deito abraçada a ele, respiro fundo e logo adormeço.

Acordei e senti os raios do sol aquecendo o quarto, não me lembro quando foi a última vez que consegui dormir dessa maneira, me sinto leve. Olho o livro sobre o peito e o fecho. Lobo acorda e me olha, late e se aproxima de mim pedindo carinho, não preciso mandar, ele pula na cama e se anima do meu lado, sentindo minha mão alisar seu pelo.

Sinto um sorriso de leve no meu rosto e a vontade de levantar da cama e percebida, me levando devagar, sentindo o piso abaixo dos meus pés. Caminho devagar até o banheiro e abro a torneira, deixo um pouco de água escorrer e jogo no meu rosto, procuro a toalha e o seco. Olho meu reflexo no espelho e a pele clara, está branca como leite.

Escuto Lobo latir e volto para o quarto, ele olha pela janela, o vento balança levemente a cortina, ele me olha e volta a olhar para fora, como se estivesse alguém conservando com ele, late e vem ao meu encontro, rodeia minhas pernas e para sentado ao meu lado.

Sinto um vento forte e me aproximo da janela, que não lembro de ter aberto, um feixe de luz sobe para o alto, olho para Lobo que late.

– Era um anjo, era amigo seu? – falo com meu cachorro que apenas dá um pequeno latido, afirmando a minha pergunta. Não poderei saber se é verdade ou não isso que aconteceu, só sei que impossível não é, afinal Kaliel era um anjo também. Fecho a janela e encontro uma pena branca com a ponta preta, meio grande para ser de uma ave, olho para Lobo que abana o rapo feliz.

– Como eu queria que você fala-se para me dizer quem era – digo rindo para Lobo que entorta a cabeça – Pelos céus, você fala? – digo o encarando, ele só late e sai do quarto, já pensou se Lobo realmente fala-se, isso ia ser mais louco do que encontrar um anjo, bem talvez não tanto.

Novo Começo (1/romance/fantasia)- DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora