As ruas da pequena cidade estão frias e escuras,e com a minha presença se tornam ainda mais.Os humanos que ali estão culpam o vento, inexistente naquele momento, pelo frio repentino. Não eles não conseguem me ver,apenas quando eu quero, devo isso aos ''dons'' que Ele me deu.
Cruzo toda a pequena cidade lentamente, sem pressa, afinal tenho toda a eternidade pela frente. O relógio da velha matriz bate exatamente meia noite quando chego ao meu destino, o cemitério. Enquanto caminho por entre os túmulos consigo sentir o ódio que emana das almas que ali estão presas, elas me odeiam eu sei, mas apenas fiz meu trabalho, se elas ainda estão presas aqui a culpa é delas e dos assuntos que deixaram pendente, segundo Ele diz.
Meu destino final é o último túmulo,já nos limites do lugar, um túmulo totalmente negro, que ainda mantém o mesmo brilho do dia que foi construído. É um túmulo sem adornos,sem nome, sem citação, apenas um anjo negro, feito do mesmo material do túmulo, adorna o mesmo.
O anjo tem suas asas sobre o túmulo como se pudesse proteger a jovem que ali descansa, com a espada em mãos o anjo protege a jovem ao mesmo tempo que, pela expressão de dor em sua feição, sofre pela morte da mesma.
A jovem que ali tem seu sono eterno amava a natureza, queria ser livre, apesar de viver em uma família extremante controladora, gostava de ler e estava sempre com seu moletom preto,mas isso foi a muitos anos atrás, cem anos mais especificamente. Eu sei disso porque aquela jovem sou eu.
Eu não sabia que aquele dia em que minha mãe e minha vó me convidaram para sair seria o último de minha vida. Elas nunca me amaram, eu era apenas um boi de abate criado para o sacrifício. De repente todo aquela proteção fazia sentido, eu não podia sair sozinha, não podia namorar, sequer beijar na boca. Mas é claro, sacrifícios devem ser de moças jovens e virgens, pena que nunca percebi isso.
Enfim, aceitei o meu destino, esperando que minha morte me trouxesse paz, o descanso eterno, o céu, qualquer coisa. Mas eu havia sido morta em nome de magia negra, em nome do mal, as sombras, e a elas eu pertencia.
Passei anos e anos como escrava de uma entidade,até que Ele surgiu. De alguma maneira ele me levou para seu reino, sua casa,me marcou como sua, os círculos sobrepostos no me braço. Eu não fiquei feliz com isso, pelo menos na Terra da Sombras eu sabia minha função e como me portar. Mas e ali? O que Ele queria comigo?
Minhas perguntas foram respondidas muitos dias depois, quando ele veio até meu quarto e me ofereceu uma vaga em seu exército, disse que eu seria uma de suas servas e teria a liberdade de ir e vir conforme suas ordens. Mesmo com medo eu aceitei, afinal alguma liberdade é melhor que liberdade alguma. Com o passar dos tempos me tornei a melhor dentre todos, fui promovida a seu braço direito,e ainda o sou até hoje.
Desde o dia que morri, eu nunca mais pisei nesta maldita cidade, minha cidade natal, meu lar, mas nunca senti que pertencia a esse lugar. Sinto um vento gelado bagunçar minha capa, rapidamente minha mão esquerda vai para a espada que carrego na cintura, uma vez que minha mão direita segura minha foice,minhas asas negras como a noite mais escura, ficam eriçadas.
Relaxo quando uma mão gelada toca meu ombro e desliza pelas minhas asas, me viro e dou de cara com Ele.
-Então finalmente criou coragem e veio visitar?
-Sim senhor, acredito que já estava na hora. Digo
Ele vai até o anjo de mármore e toca suas asas,que são idênticas as minhas, Ele mesmo havia colocado aquele anjo ali, para mostrar que eu era uma de suas protegidas.
-Fico feliz criança que tenha vindo, isso mostra o quanto cresceu e amadureceu. Mas agora tenho um trabalho para você aqui mesmo na cidade. Diz ele sorrindo
-Nome e endereço? Pergunto friamente enquanto tiro de dentro das minhas vestes um pergaminho e uma pena de sangue, ele me diz os nomes e então me despeço dele,sumindo logo depois em névoa. Não me olhem assim esse é meu trabalho e posso dizer que sou muito mais humana fazendo isso do que aqueles que tiraram minha vida.
Ele é o Ceifador. E , eu sou o pesadelo de muitos, eu sou a criatura mais letal, a última que vai ver em sua vida, eu sou o fim, eu sou a Morte.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Eu sou a Morte
Short StoryAlguma vez você já se perguntou quem é a pessoa que todos chamam de Morte? Talvez aqui tenha uma resposta