Broken

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"E os braços do oceano estão me carregando, e toda essa devoção avançou sobre mim. E este peso é um paraíso para uma pecadora como eu, mas os braços do oceano me libertaram. E está acabado, e eu estou afundando. Mas não estou desistindo, apenas estou me entregando."

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Um trovão cortou os céus e a água caiu como cachoeira. A escuridão era apenas interrompida quando os clarões dos fortes relâmpagos arrastavam-se pelo imerso céu. Era uma tempestade. Típica e comum. Uma tempestade que arrastaria tudo que estivesse a sua volta, como a mensagem recebida por Henry Mills fizera com o mundo de Regina. Uma tempestade que faria a água colidir firme e violenta contra o chão, assim como seus pés fizeram ao correr o mais rápido que podiam pelas ruas daquela cidade até chegar ao seu apartamento. E a voz de seu pai soava em seus ouvidos como os trovões ressoavam lá fora, envoltos de desespero e angustia. A terra tremia como seu corpo, arrepiado pelo vento frio; como seu cérebro, sendo bagunçado pelos próprios pensamentos e confusões. Suas roupas estavam pesadas pela chuva que recebera durante o percurso. Pesadas, como seus sentimentos pesavam em seu peito. Como a culpa pesava sobre seus ombros. Como as lembranças e as lágrimas a atormentavam.

"Regina, é o papai. Sua irmã, ela... ela está desaparecida. Encontraram sangue. Eu... eu acho que ela está morta, filha. Nossa garotinha está morta..."

Seus olhos fixavam-se na imagem pregada à parede. Um homem de olhos azuis e cabelos claros sorria para a câmera, enquanto um rosto tão conhecido por ela estava virado em sua direção, repleto de amor e alegria ao admirá-lo. Para quem não os conhecia, aparentavam um casal feliz. Regina quase riu com a ironia. A mulher de cabelos ruivos que sorria bobamente para aquele homem na foto realmente o amava, e fora feliz por um curto período de tempo, mas não soubera a hora de ir embora. Faltou-lhe coragem para deixá-lo, quando a encenação de bom moço deu lugar a violência e aos maus tratos. Seus dedos se ergueram para tocar a imagem, traçando caminhos invisíveis pela face da falecida irmã. Zelena sempre acreditara no amor verdadeiro, no encontro de duas almas, no perdão, na luz dentre a escuridão, e pagara caro por isso. Morrera por entregar seu coração à um canalha sem escrúpulos.

Regina permitiu que as pálpebras se fechassem por um instante e que uma lágrima solitária percorresse seu rosto cansado. Quando sua mãe morreu, prometeu que cuidaria da caçula. Jurou em seu leito de morte que a protegeria com todas as suas forças, e falhara miseravelmente. Acreditara em suas palavras quando à escrevia dizendo que estava bem. Pôs o trabalho em primeiro lugar, deixando as falsas promessas de um reencontro para depois. Sua última carta, contado-lhe sobre os abusos, implorando por socorro, chegara tarde demais. Quando ligou para seu pai em busca de notícias, Zelena já estava morta. Assalto, dissera a polícia. Jóias e aparelhos eletrônicos estavam desaparecidos, assim como o corpo de sua irmã. A única coisa deixada para trás era uma poça de sangue na sala, e o coração partido dos que ficaram.

Sentiu o celular vibrar no bolso e o pegou em mãos. Havia uma mensagem de Kilian Jones, seu melhor amigo e parceiro, que mesmo sendo contra seu plano, estava ajudando-a a concretizá-lo. Killian sabia o que a sede por vingança poderia causar à alguém. Fora ela que o tornara tão bom em seu trabalho. Não era o tipo de homem que poupava uma vida, se esta merecesse a morte. Sua alma já estava condenada há muito tempo, quando assassinara o responsável pela perca de sua esposa. Regina era a única pessoa no mundo com quem ele se importava, e não queria vê-la seguindo o mesmo caminho. Mas ainda assim, estava ali, sendo seu apoio como sempre.

"Consegui documentos falsos para você e comprei sua passagem. Mandei seu currículo para o seu cunhado, conversei com ele por um tempo como se fosse você e ele me respondeu a aprovando. Amanhã mesmo você viaja para Nova York como Regina Sanderson, a nova babá da casa dos De Locksley. "

Apertou o celular, suspirando profundamente, e guardou-o para responder mais tarde. Robin De Locksley não fazia ideia de sua existência. Para um mundo além de Zelena e Henry, Regina era um fantasma. Seu trabalho como investigadora particular era perigoso demais para que arriscasse manter contato com sua família. Mas pelo menos agora, graças à isso, poderia se infiltrar naquela casa e descobrir o que de fato acontecera com sua irmã. Sua vida era difícil, sim, no entanto, depois de se envolver neste mundo onde ela não era nem criminosa, nem justiceira, não conseguira mais sair. Havia tantas pessoas que ajudou a pôr atrás das grades, ou que simplesmente provou a culpa e entregou à seus contratantes sedentos por vingança, e hoje desejavam a mesma vingança sobre ela, que sempre pensara estar mantendo sua família a salvo distanciando-se totalmente deles. Em mais um suspiro, quis novamente se esbaldar em uma risada irônica e melancólica. Estava enganada. Era considerada uma das melhores investigadoras particulares do país, treinada para matar, para ocultar-se nas sombras sem nunca ter sua presença notada. Nunca deixara de encerrar um caso. Chegara, certas vezes, a ajudar agências do governo, mas não fora capaz de proteger sua própria irmã. Não conseguira manter a promessa que fizera à mãe antes de morrer.

Por um momento, Regina deixou que seus pensamentos voassem de encontro ao sobrinho. Roland tinha quatro anos e era o verdadeiro amor da vida de Zelena. Nas cartas que lhe escrevia, sempre dizia em um tom de brincadeira sentir vontade de bater na cara da irmã mais velha, pois o filho, mesmo tendo nascido de suas entranhas, era uma pequena cópia de Regina. Era triste saber que só o conheceria por causa de sua morte. Com cuidado, rasgou a foto pregada na parede ao meio. Outra lágrima se libertou, caindo sobre a imagem e escorrendo pelo rosto sereno de Zelena. Regina prontamente a secou, com a delicadeza de quem acariciava o rosto da caçula com saudade, lembrando-se de suas últimas palavras borradas na carta que provavelmente escrevera aos prantos.

"Eu o ameacei, Rê. Não falei exatamente sobre você. Mas eu disse que se ele levantasse o dedo para mim outra vez... se algo me acontecesse, alguém o faria conhecer o inferno. Meu marido têm amigos importantes, ele nunca será preso. Por favor, Rê. Se algo me acontecer, mate-o. Proteja meu filho deste monstro."

-Eu vou descobrir o que aconteceu com você, Ze. - Seus olhos se ergueram para aoutra metade da foto, ainda pregada na parede. Fitou o rosto do homem porsegundos que pareceram horas, com uma raiva contida, prestes a explodir. -E eu juro por Deus que vou matá-lo. Ele vai pagar por cada lágrima quevocê derramou. Por cada dia que perderá da vida de seu filho. - Mordeu olábio trêmulo, prendendo um soluço na garganta. - Eu prometo. 

Never Let Me GoOnde histórias criam vida. Descubra agora