A História de Aiko: 1- O Mundo de Aiko
Ainda estava escuro, mas o calor de janeiro já abafava o pequeno quarto onde Aiko dormia. Havia espaço apenas para uma cama e um guarda-roupa, ambos em paredes opostas, a cama encostada na parede. Nas duas restantes ficavam a porta e uma janela gradeada que dava para um corredor estreito.
As cortinas estavam abertas, e aos poucos o sol nascente inundava o quarto, revelando as prateleiras onde Aiko colocava seus livros e algumas bugigangas de enfeite. Tudo o que não cabia no armário era colocado em caixas organizadoras que ficavam em baixo da cama. Aiko e sua mãe trabalharam muito para fazer desse quarto o mais funcional possível, e não seria errado dizer que tiveram sucesso.
O despertador, que havia sido astutamente colocado por Suzana, a mãe de Aiko, no alto da prateleira no dia anterior, começou a apitar estridentemente. Depois de em vão tentar abafar o som com o travesseiro, a menina se pôs de pé na cama e desligou-o. Agora já estava de pé e não havia desculpa para voltar para a cama. Essa batalha Suzana havia vencido.
Esfregando os olhos ela desceu da cama e se pôs a caminho do banheiro. A essa hora sua mãe já deveria ter tomado banho, então ela teria algum tempo para si. A avó, Akemi, estava passando café, e o cheiro da bebida despertou não apenas os sentidos de Aiko, como também o seu estômago.
Ela foi rápida no banheiro, e então voltou ao quarto e vestiu seu uniforme, que havia sido meticulosamente preparado pela avó no dia anterior. “Assim você ganha tempo”, ela dizia, e a menina concordava que estava certa. Em pouco tempo ela já estava penteando os cabelos partidos ao meio como de costume.
Aiko era uma menina pequena e franzina, de rosto alongado e longos cabelos negros se espalhando por sobre os ombros. Fora o cabelo, poderia facilmente se passar por um menino de oito anos, apesar de já ter doze.
Parecendo-se com o coelho de Alice no País das Maravilhas, Suzana enfiou a cabeça pela porta para dizer que estavam atrasadas. Não estavam. Aiko sabia da mania da mãe de sempre dizer que estavam atrasadas. Assim como o coelho, ela estava sempre com pressa.
Calçou os tênis, pegou sua mochila e correu para a mesa, onde sua avó, uma filha de japoneses já idosa e com o rosto cheio de “marcas da vida”, como costumava dizer, a esperava com o café pronto e o lanche para comer na escola embalado no balcão da cozinha.
As três tomaram café juntas, como sempre faziam no primeiro dia de aula. Suzana teria que readaptar sua rotina, pois seu trabalho e a escola da menina ficavam em direções opostas, além do trânsito, que deveria se intensificar.
-Se nós sairmos bem cedo vai dar tempo de chegar. A essa hora o trânsito é mais rápido.
-O trânsito já vai estar o inferno, cedo que for. Hoje é a volta às aulas, Suzana. –Akemi cortou. –Você sabe o que eu penso. A menina já é quase uma adolescente, é hora de ela começar a fazer algumas coisas por conta própria.
-Nós já conversamos sobre isso, mãe. Isso está fora de cogitação.
Aiko, como sempre, permanecia em silêncio, percebendo que não importava o que dissesse, estaria sempre errada.
-Estamos atrasadas. Anda logo, vou te esperar no carro.
Aquilo significava que Suzana ficaria buzinando na garagem até que Aiko fosse, então a menina desistiu do pão que comia e pegou uma maçã para comer no caminho. Despediu-se da avó sob desejos de boa sorte, e agradeceu com um abraço e um beijo, enquanto a buzina cantava seca através das paredes.
O portão estava aberto e Suzana se agarrava ao volante com tanta força que os nós dos seus dedos estavam brancos.
A mãe de Aiko sofria de ansiedade e transtorno do pânico, o que tornava quase impossível andar de ônibus. No entanto, o financiamento do carro, um popular usado de pintura verde escura bem gasta, as doenças da mãe e os outros estresses do dia a dia deixavam-na esgotada, e nem as altas doses dos seus remédios eram suficientes para deixá-la tranquila.
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A História de Aiko
RomanceAiko é uma garota comum, com o seu próprio mundo e seus próprios problemas. Acompanhe-na enquanto ela descobre a adolescência, o amor e os mundos de outras pessoas.