Ele não se lembrava bem de como era sua vida antes daquela guerra, antes de perder seus pais e passar a viver com sua tia Soyou, tudo que o garoto lembrava eram flashs e borrões e então o fogo na frente de seus olhos enquanto a casa que ele passou seus primeiros onze anos de vida queimava com seus pais dentro, após isso a única coisa que ele lembrava era acordar em uma sala branca com luzes fortes e o rosto adormecido de sua tia sendo coberto pelos cabelos castanhos da moça, ele sabia que estava em um hospital no momento que viu uma máquina medindo seus batimentos, logo sua tia abriu os olhos castanhos que estavam vermelhos e inchados enquanto dizia olhando para ele mexendo em seus cabelos castanhos:
- Que bom que esta acordado querido.
O garoto olhou para sua tia com seus olhos repletos de inocência infantil e disse:
- Onde estão meus pais tia?
O sorriso da mais velha logo sumiu de seu rosto quando ela disse se sentando reta na cadeira de plástico que estava sentada:
- Você se lembra de algo que aconteceu querido?
O garoto simplesmente disse olhando curioso para a tia:
- Lembro do fogo em casa depois que aqueles homens entraram em casa, depois lembro da mamãe gritando pra que corresse e eu corri, mas ai eu cai sentindo algo em cima de mim e não consegui levantar depois.
Soyou suspirou e disse enquanto olhava para o brilho inocente nos olhos do filho de sua irmã:
- Kihyun, meu bem você não conseguiu levantar porque ficou preso debaixo de alguns escombros da.... da sua casa, por sorte os bombeiros te resgataram antes que algo pior acontecesse com você, mas isso não foi sem consequências.
A mais velha mordia seu lábio inferior enquanto pensava em um jeito de dizer aquilo para a criança, dizer para ele o que tinha acontecido não só com ele mas também com seus pais não seria fácil e ela tinha certeza que tudo seria ainda mais difícil depois que ela o contasse aquilo, os olhos inocentes de Kihyun já tinham perdido o brilho no momento que ele viu sua tia parar de falar, mas mesmo assim ele disse:
- O que aconteceu comigo tia? E meus pais onde eles estão?
Soyou respirou fundo e disse segurando a pequena mão de seu sobrinho:
- Os médicos disseram que fizeram o melhor que puderam, mas você teve uma lesão grave em uma de suas pernas e não....não vai poder voltar a andar normalmente, sinto muito meu bem.
O cabelo castanho cobria completamente o rosto da moça enquanto ela olhava para baixo sentindo sua boca seca para falar aquilo, mas logo respirou fundo novamente e disse enquanto tirava o cabelo de seu rosto:
- Seus pais eles.... eles foram mortos no fogo, sinto muito.... muito mesmo meu bem.
Kihyun sentia seus olhos se encherem de lágrimas enquanto ele dizia com sua voz trêmula:
- Quem.... quem eram aqueles homens do incêndio?
A mais velha disse olhando para o sobrinho seriamente:
- Eles são os nossos governantes, tomaram o país a força anos atrás e seus pais entraram no meio de algo que eles nem mesmo sabiam no momento em que começaram a ajudar forças rebeldes.
E foi naquele momento que Kihyun não se sentiu mais uma criança, afinal crianças deveriam poder correr por ai com seus amigos rindo não é mesmo? Crianças deveriam poder correr pra casa sabendo que suas mães o estariam esperando com um abraço cheio de amor, crianças não deveriam viver no meio de uma guerra entre rebeldes e o governo, tudo isso fez a infância mal começada de Kihyun terminar mais rápido do que ele imaginava.
Doze anos tinham se passado naquela situação, Kihyun tinha acostumado a andar com suas muletas mas não se sentia bem fazendo isso, durante toda sua infância e adolescência sentiu falta de correr com seus amigos, sentiu falta de poder andar com seus amigos sem que eles tivessem que evitar caminhos com lama ou morros por medo de que aquilo prejudicasse o garoto, mesmo mais de uma década se passando as constantes brigas do governo e dos rebeldes não tinham se acalmado, a pequena cidade que Kihyun vivia estava sempre com soldados na porta a espera de algum rebelde e nas raras vezes que algum rebelde era pego na cidade ele era executado em praça pública, quem ajudasse rebeldes, perderia tudo inclusive a própria vida.
Kihyun estava no jardim da afastada casa que sua tia tinha lhe deixado dois anos atrás antes de morrer por um caso de leucemia que levou a mulher antes de sua hora, ele sentia falta da mais velha tanto quanto sentia de seus pais, afinal após tudo que aconteceu ela não se deixou abalar tão fortemente pela morte da irmã e criou Kihyun com tudo que tinha como se o garoto sempre tivesse sido filho dela, estava tudo calmo até que seus olhos capturaram uma movimentação entre as folhas do bosque do outro lado da cerca branca, ele logo se aproximou da cerca andando cuidadosamente com suas muletas dizendo alto o suficiente para que a pessoa que ele esperava pudesse lhe escutar:
- Changkyun, pode sair daí já.
Da folhagem densa apareceu um rapaz de cabelo negros que não devia ser mais alto que Kihyun e que tinha um sorriso gentil nos lábios, Lim Changkyun tinha sido como uma luz na vida de Kihyun, mesmo sendo mais novo e silencioso Changkyun tinha se aproximado do grupo de amigos do mais velho e depois de algum tempo tinha conseguido o coração do Kihyun sem o mínimo esforço e ao que parecia o coração do mais novo também tinha sido capturado por Kihyun, os dois eram totalmente apaixonados um pelo outro e segundo seus amigos formavam um belo casal porem o governo tinha aplicado uma lei há muitos anos de que relações românticas de pessoas do mesmo gênero eram extremamente proibidas e quem não seguisse essa lei era sujeito a prisão, aquela era uma das leis mais idiotas e mais bem respeitadas do país, mas existiam casos onde jovens apaixonados quebravam essa lei e se encontravam a escondidas em pontos distantes e escondidos da cidades onde trocavam beijos amorosos e juras de amor silenciosas, Changkyun e Kihyun eram dois desses jovens, toda tarde se encontravam na casa de Kihyun onde ficavam trocando carícias, beijos e palavras carinhosas até o sol se pôr e Changkyun ter que voltar para casa antes que a mãe do mais novo pudesse começar a ficar muito preocupada, já que desde que o pai do garoto tinha sido dado como desaparecieo após sair de casa depois das luzes da cidade terem se apagado a mulher sempre estava temendo que o pior acontecesse com seu único filho.
Changkyun sorria para Kihyun quando se aproximou do garoto para lhe roubar um beijo delicado dos lábios do mais velho que disse virando o rosto levemente corado:
- Você não devia fazer essas enquanto ainda estamos aqui fora, alguém pode ver Chang.
O garoto disse enquanto colocava suas mãos nos bolsos de sua calça jeans:
- Mas ninguém nunca passa na sua rua.
Kihyun suspirou e disse enquanto se dirigia para a casa:
- Ainda sim é perigoso, vamos entrar logo, aqui fora esta começando a esfriar.
O mais novo somente seguiu o namorado para dentro de casa em silêncio, a casa não era grande ou majestosa mas era aconchegante de um jeito que a casa de Changkyun jamais seria após o desaparecimento de seu pai, aquele pensamento surgia sempre que ele entrava naquela casa em que ele tinha formado tantas boas memórias desde as tardes que ele passava com seus amigos ali sem fazer nada somente conversando com todos até as noites de beijos dados em silêncio entre ele e Kihyun e para ele aquelas eram as melhores memórias que ele tinha daquele lugar, memórias de momentos de felicidade, momentos em que ele se sentiu protegido mesmo no meio de todo aquele conflito entre um governo carrasco e rebeldes que juraram a anos que iriam trazer liberdade para o país, mas depois de mais dez anos daquilo ninguém mais tinha fé naquelas palavras e só tentavam viver um dia de cada vez até que suas horas chegassem.
Kihyun estava sentado no sofá gasto da sala enquanto observava Changkyun que parecia pensativo assim como sempre que ele entrava naquela casa, o mais velho segurou a mão do garoto e disse com um sorriso no rosto:
- Esta pensando em algo especial?
O mais novo focou seu olhar em Kihyun com um sorriso doce nos lábios enquanto dizia:
- Estava só lembrando de memórias que fizemos aqui.
O mais velho disse enquanto soltava a mão do namorado para poder mexer nos fios escuros do mesmo:
- Como quais?
Changkyun fechou seus olhos aproveitando o carinho delicado de Kihyun e disse com um sorriso ainda em seu rosto:
- As tardes que passamos aqui com nossos amigos, minhas batalhas de rap com o Jooheon, você tentando fazer o Hoseok e o Minhyuk pararem de discutir por algo, nosso primeiro beijo, você dizendo que me ama pela primeira vez, esse tipo de coisa.
O mais velho sorriu e sem dizer nada deitou sua cabeça no colo do mais novo que sorriu enquanto mexia nos fios de Kihyun, após um tempo de um silêncio confortável Changkyun disse ainda mexendo no cabelo do mais velho:
- Em que você pensa quando esta aqui sozinho?
O mais velho riu antes de dizer com um tom alegre:
- Porque isso tão de repente Chang?
O mais novo somente disse enquanto descia sua mão pelo braço de Kihyun distraidamente:
- Só.... curiosidade
Kihyun sentiu um arrepio percorrer seu corpo quando a mão fria de Changkyun passou por seu pescoço antes de voltar a traçar uma linha reta pelo braço do mais velho que suspirou calmamente antes de dizer:
- Eu penso principalmente sobre a minha tia, em como ela sempre costumava cantar pra mim antes de dormir, de como ela estava sempre sorrindo não importava o quão mal estava nossa situação, lembro também dos últimos momentos dela e de.... e de como mesmo estando mal ela sempre tentava sorrir quando me via, ela dizia que queria que eu me lembrasse dela sorrindo e não presa a uma cama.....
O garoto logo se calou sentido sua garganta seca, sempre que falava sobre os últimos momentos de sua tia ele sentia que iria desmoronar a qualquer momento, lentamente ele se sentou reto novamente enquanto deixava uma ou outra lágrima cair de seus olhos em silêncio enquanto algumas cenas de momentos passados com sua tia rodavam sua mente sem parar, Changkyun olhou para o namorado e sem pensar duas vezes o puxou para um abraço delicado enquanto o ouvia dizer com a voz trêmula:
- Eu sinto tanta falta dela Chang.
O mais novo somente abraçou o mais velho mais forte que antes enquanto fazia pequenos círculos nas costas de Kihyun em uma tentativa de acalmar o garoto que tremia em seus braços.
Quando o mais velho enfim parou de chorar o mais novo disse em uma voz calma para o namorado:
- Desculpa por ter te feito lembrar dela.
Kihyun respirou fundo e saiu do abraço do namorado e disse com um sorriso triste em seu rosto:
- Não é sua culpa Chang.
Changkyun ainda se sentia culpado enquanto olhava para suas mãos que estavam no sofá fechadas em punhos, o mais velho levantou o rosto do garoto com uma de suas mãos e disse com um sorriso doce em seus lábios:
- Eu falo sério quando digo que não foi sua culpa Chang.
O mais novo deu um sorriso fraco enquanto se aproximava um pouco mais de seu namorado que também sorria com a sutil aproximação, os dois estavam com as testas encostadas uma na outra enquanto tinham seus olhos fechados, aquilo era um gesto comum entre os dois, um gesto que transmitia segurança para os dois, seus olhos continuavam fechados quando juntaram seus lábios e como sempre sentiram um arrepio ao fazer tal coisa, era como se a cada contato mais íntimo que os dois dividiam fizesse eletricidade e adrenalina percorrer seus corpos e talvez aquilo nunca fosse mudar enquanto eles fossem eles e estivessem ali naquela sala trocando beijos escondidos, fora da vista de todos.
Porem os tempos de calmaria logo se foram a partir do momento em que os ataques rebeldes aumentaram, cada vez mais era possível ver soldados pelas ruas em patrulhas que duravam horas a fio, tudo tinha se tornado mais rigoroso do que já era, e então um dia tudo foi por água abaixo quando Minhyuk chegou na casa de Kihyun aos prantos dizendo que Hyungwon tinha tentado cometer suicídio, milhares de perguntar surgiram assim que o garoto do cabelo platinado entrou na casa e perguntas as quais ele demorou a responder, mas uma coisa ele assegurou, aquilo tudo era culpa dos soldados da cidade, mais especificamente a divisão que o padrasto de Hyungwon fazia parte, mais tarde Minhyuk contou a história de que tinha achado o amigo na banheira desmaiado mas não morto, mas se ele tivesse chegado um pouco mais tarde a história teria sido diferente, após tomar um gole do chá que Kihyun tinha acabado de prepara Minhyuk continuou a história:
- Ele me contou que fazia meses que o padrasto vinha batendo nele e....e o ameaçando de morte caso ele continuasse sendo uma pessoa impura, vocês sabem o quão religioso esse homem é e o quão a sério ele leva a lei de relações de pessoas do mesmo gênero.
Hoseok olhou para o amigo e disse enquanto ajeitava seu cabelo loiro:
- Mas Hyungwon nunca nem mesmo teve relações com alguém.
Minhyuk suspirou e disse antes de terminar o chá que começava a esfriar:
- Mas aparentemente esse homem acha que sim, talvez por ter me visto abraçando o Hyungwon uma vez ele se convenceu disso sozinho.
Naquele momento ninguém disse mais nada, somente fizeram uma promessa silenciosa de vingar seu amigo, eles sabiam que a partir daquele momento eles podiam ser considerados rebeldes por causa de seus planos.
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All In
FanfictionEm um mundo destruído e a beira da guerra poderia o amor ainda existir? nem mesmo que seja uma leve faísca? Poderia o amor surgir não importando o quão ruim seja o momento a sua volta? Amor no fim é como uma flor, sempre irá florescer mesmo em um...