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Já teve a sensação de frustração eminente próxima? Você até pode abreviar, FEP.
É por causa da FEP que deixo de fazer muitas coisas,  nunca sei se fiz certo em deixar de fazer algo, mas eu funciono assim,  com poucas ações e muitos sentimentos. É por isso também que me sinto constantemente transbordando e ao mesmo tempo vazia de emoções. Eu posso imaginar, desenhar, planejar, não importa, os acontecimentos me ensinaram a aceitar a FEP como uma amiga, no fundo eu sei que ela só me destrói.
Não sei se tenho um tipo de transtorno psiquiátrico muito raro e bizarro ou se algo no universo está muito louco para todos, ou até que finalmente os aliens tenham chegado e mexido nas cabecinhas humanas, também tem a hipótese de ser um experimento do governo ou apenas um sonho muito muito estranho e longo,  tudo que sei é que estou vivendo o mesmo dia há 32 dias,  isso é realmente sem sentido, mas sei que está mesmo acontecendo, eu tenho um diário e todos os dias escrevo nele, sempre me lembro do que aconteceu e tenho meu diário para confirmar,  nas últimas 32 páginas está a data 19/11/16,  curiosamente ninguém além de mim se lembra de qualquer coisa após o dia 18/11/16 e ninguém consegue ler as minhas últimas 32 páginas,  depois de alguns dias eu resolvi que não importava mostrar meu diário para as pessoas, alguém devia me ajudar a entender o que estava acontecendo, tudo que consegui foi "mas a letra está tão apagada", "desde quando faz esses garranchos? ", " eu não entendi nada do que está escrito " entre outros motivos, meu diário encantado me fez desistir de compartilhar qualquer coisa com alguém e apenas continuar tentado me arrastar através do mesmo dia sem enlouquecer, já cogitei suicídio, claro,  mas ainda parece uma idéia fraca por enquanto. E se tudo continuasse da mesma forma no outro dia? (no caso de serem os aliens) Se nada mudasse seria ainda mais infinitamente frustrante, eu ainda não queria arriscar.
Essa a minha página 32 na verdade, e segue a minha rotina de todos os dias 19/11/16 :

Sete horas : minha mãe me acorda com a notícia de que o grande orgulho da família, vulgo Joyce, foi aprovada no vestibular de medicina para a melhor faculdade do país.
Sete e dez : Volto a dormir.
O horário em que realmente levanto tem sido diferente, no primeiro dia foi às 8h, hoje levantei 12:30,  e só porque estava morrendo de fome.
O dia é sempre cinzento, tenho a impressão de que nunca mais sentirei o sol na minha pele.
Quinze horas: Minha vizinha e melhor amiga, Lia, vem falar sobre o carinha com quem ela está ficando,  eu costumava achar ele vagamente legal, mas tenho mudado de opinião, acho que na verdade não conseguimos absorver o que é realmente essencial à primeira vista,  eu não costumava perceber o grau elevado de babaquice na frase "ele disse que não sente nada assim por mim, mas que como eu gosto dele podemos continuar ficando até ele ter certeza" isso pareceu sincero quando ouvi pela primeira vez,  até um pouco bondoso,  como dar uma chance a alguém,  há alguns dias tenho percebido como isso é mesquinho e egoísta,  que o cara retardado só quer ter um leque de opções abertas enquanto experimenta tudo que acha que deve,  e não deve, sem se importar realmente com nada e com ninguém. Percebi como a maioria das pessoas vive um dia após o outro montando esquemas para um dia que pode nunca chegar, assim como Lia em sua vida amorosa baseada em "vou fazer o que ele quiser porque talvez assim, ele realmente se importe comigo, um dia" Todos nós nos prendemos a esperanças de pequenas sementes, e talvez isso realmente seja o melhor e mais certo a se fazer,  eu nunca tentei muito,  por causa da FEP,  nunca costumei me prender a coisas que "podem talvez quem sabe dar certo", talvez o certo fosse afirmar que não costumava me arriscar, e é verdade, a mentira aqui é o "nunca costumei" "sempre fui assim" nunca e sempre são palavras muito fortes e dificilmente realistas,  mesmo com muito muito medo,  eu já tentei lutar por algo que realmente queria, felizmente isso não era tão comum,  infelizmente já não importa porque atualmente é sempre hoje,  e não posso tentar mais nada, lutar por coisa alguma, não tenho o luxo de plantar uma pequena semente e esperar que ela brote amanhã,  não importa o que eu faça, é sempre esquecido,  ao ficar presa em um tipo de "presente solitário", tudo que realmente me resta é o passado cheio de arrependimentos e vazios, e nossa, como eu me arrependo dele.
Lia costuma sair da minha casa às dezesseis horas,  dependendo um pouco do meu estado de espírito,  acho que esse é o máximo em que minha individualidade paralela pode afetar.
Vinte horas: eu almoço um lanche que minha mãe encomenda para mim porque ela e meu pai saem para jantar fora,  como é domingo eu fico a maior parte do tempo deitada, escrevendo ou escrevendo deitada.
Tenho tido mais atenção ao analisar o que tenho escrito /vivido,  parece que todos os dias se repetem com o nada acontecendo, mas faz sentido porque não há realmente nada que eu possa fazer em um dia que será esquecido, mas o que realmente me irritava era o nada acontecendo antes disso, quando todos os dias eram diferentes, reais e promissores.
Eu era "apaixonada" por Calvin há 7 meses,  agora já não acredito nesse sentimento, mas eu costumava acreditar e nossa, não fiz nada por isso, costumava ter medo de que alguém percebesse e me achasse estúpida e como isso era ridículo porque todos nos apaixonamos e todos somos estúpidos e isso não deveria ser mais importante do que a sinceridade e a felicidade que buscamos.
Calvin não se importava comigo, e é por isso que não faz tanta diferença,  acho que nenhum cara já se importou muito comigo de tal forma,  e isso não me entristecia,  apenas tornava tudo mais calmo,  controlado e menos emotivo,  me dei conta das várias vezes em que inventava uma paixão só para sair do tédio, não era algo em que eu acreditava e nem que esperava ou queria que desse certo,  era a iluminação que a emoção dava a vida,  a quebra de rotina,  era só isso,  acho que nunca acreditei realmente em algo verdadeiro ligado a isso, mesmo assim eu podia sofrer por dias,  poucos dias, tudo logo se tornava frio e bobo até se transformar em uma lembrança desprezível e sem sentido. De qualquer forma eu sentia falta de tudo isso e mantinha um pequeno sentimento de que as coisas ainda funcionariam de verdade.
Eu escrevi bem mais que nos outros mesmos dias hoje, isso parece engraçado, está tarde, vou dormir na esperança de o hoje não se tornar o amanhã.

Com Amor
Boa noite
19/11/2016

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