Após o almoço, voltamos ao teatro para o resto das mesas daquele dia. Por algum motivo, o tempo pareceu passar mais rápido nessa segunda metade do evento. Em alguns momentos, olhei ao redor em busca de Fermi e Elisabete, mas só encontrei a segunda, e inevitavelmente Cordelia. Não conseguia evitar a sensação de estranhamento que tudo aquilo me trazia.
Às sete horas, quando o dia foi encerrado, voltamos para o hotel antes de seguir para o jantar com Fermi. Atena insistiu que eu e meu pai tomássemos banho antes enquanto ela conjurava as proteções que achava necessário. Depois de sairmos, Atena entrou. Fiquei sozinho com meu pai naquele quarto. Nenhum de nós tinha levado roupas para se trocar dentro do banheiro, então era inevitável que nos vestíssemos ao mesmo tempo.
Ainda assim, algo naquela situação me deixava nervoso. Desde o momento em que meu pai saiu enrolado na toalha, eu mesmo também sem nenhuma roupa, um desconforto pairou sobre mim, uma sensação estranha que eu sequer conseguia compreender direito, ainda que agora, vendo tudo em retrospectiva, eu sinta que sabia, sim, o que eu sentia.
Eu não queria tirar aquela toalha. Eu não queria que meu pai visse meu corpo nu. No fundo, eu mesmo não queria ver o dele. É dolorosamente óbvio para mim o medo que eu tinha de descobrir a pele que existia por baixo daquelas roupas, ver os pelos, as marcas de idade, as falhas daquele corpo. Enquanto a toalha era tirada, revelando toda a forma de meu pai, seu corpo de cinquenta anos marcado de cicatrizes, estrias e varizes, o que se mostrava diante de mim era alguém que eu não conhecia.
Sem óculos, sem terno, sem a sobriedade e distâncias forjados por toda a indumentária formal, sem a gravidade profunda do seu conhecimento, restava ali meu pai como um homem de carne e osso. Um homem que tinha rugas, manchas na pele e cabelos grisalhos, que envelhecera com os anos e continuaria a envelhecer a cada dia até sua morte.
Pela primeira vez em muito tempo, eu quis falar, mas nenhuma palavra veio a mim.
Foi por volta das oito da noite que chegamos ao restaurante em que Fermi tinha marcado o jantar, um restaurante conceito a beira-mar, perto do Museu de Arte Sacra, em plena zona rica da cidade. No estacionamento, uma Mercedez era comentada por dois dos seguranças. Fermi tinha reservado uma mesa no exterior do restaurante, lugar aberto, perto do mar. Enquanto íamos até lá, pedi a Atena que mantivesse defesas de pé para qualquer caso de emergência, enquanto eu mesmo media o local. O restaurante era grande, as mesas muitas, mas afastadas umas das outras, apenas os garçons caminhavam entre elas. Em vários pontos, havia mesas grandes para exibição dos pratos. Entre os clientes, a maioria parecia empresários ou coisas do tipo. Era, de fato, o tipo de lugar que esperava daquele homem. Fermi estava acompanhado do mesmo rapaz com quem estava durante a manhã. Assim que chegamos à mesa, ele nos cumprimentou um a um, começando por meu pai, indo para mim e, por fim e visivelmente hesitando, para Atena. Após algumas introduções breves e conversas sem importância, todos pedimos. Durante todo esse tempo, percebia o olhar do acompanhante de Fermi concentrado em mim.
A cerca altura, senti meu celular vibrar. Ignorei da primeira vez, mas uma segunda mensagem chegou logo depois. Pedi licença e me afastei para conferir do que se tratava. Eu não conhecia o número do remetente, mas não foi difícil saber quem tinha enviado uma vez que abri as mensagens. A primeira mensagem era simples, dizia simplesmente "um pequeno agradecimento por ter me ajudado". A segunda era só uma foto de Cordelia, provavelmente tirada por ela mesma, nua no banheiro, os cabelos soltos cobrindo seus seios e um sorriso lascivo, terrivelmente confiante exposto junto a um olhar insaciável. Considerei responder, mas desisti rápido. Fechei a mensagem e voltei à mesa.
Quando me sentei de volta, Fermi pediu uma garrafa de vinho, a mais cara disponível no catalogo do restaurante. Ela não demorou a chegar e assim que a bebida estava servida, Fermi propôs um brinde à "ocasião". Hesitei em beber, esperando a confirmação de Atena de que era seguro, o que não demorou a chegar. Considerando o sorriso do assistente de Fermi, ele notou minha preocupação.
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Linhagens
FantasyA cada quatro anos, um congresso ocorre entre os maiores magos do país, onde assuntos correntes na teoria mágica são discutidos e tramas políticas são tecidas. Proibidos de utilizar magia, porém, eles contam com a ajuda de seus assistentes para se m...