"O fim"

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Suas palavras foram como uma apunhalada no peito. Não doeu mas um desafio assim é difícil de não se aceitar, você se sente superior a tudo e todos e quer mostrar que é capaz de fazer qualquer coisa. Cada vez mais que nos aprofundamos na adrenalina não há como voltar, a liberação de dopamina já não é mais suficiente, mas você precisa sentir toda aquela paz, todo aquele seu prazer.
Sim. É claro, eu deixo você livre.
- Nós dois. - Ela corrigiu.
- Não! Você! Seu irmão ficará aí mesmo por precaução. - Digo.
- Como é? Vamos, me solte.
Lívia parecia tão confiante quanto eu, mas talvez, talvez, eu estivesse insegura quanto ao que aconteceria logo mais. Então eu a desamarrei com olhar desconfiado, ela levantou e me encarou. Olhava fundo os meus olhos, talvez um sentimento estivesse ali, preso. Alguma coisa. Apesar de fria em seu olhar, Lívia parecia transmitir aflição.
- Amora, diga que me perdoa! - "Mas o quê.? deve ser algum truque dessa espertinha!", penso.
- Eu não caio nessa, não mais.
- É sério. Me deixe ir, eu saio da cidade e não volto nunca mais, é uma promessa. - Ela diz séria me deixando confusa. Mas e agora? O que diabos tava acontecendo, tudo cada vez pior mais confuso do que nunca. Uma parte em mim queria acreditar nela, mas a outra, queria dor, morte. Ela veio em minha direção, eu recuei. Dionatha não pronunciava nehuma palavra, apenas tentava se mover para perto da janela, movimentos inúteis.
- O que você está tramando hã? - Perguntei apontando o cutelo em sua direção. Ela se encostou na ponta não-afiada - Nada. Eu realmente estou tentando te salvar. - Ela disse - Tentando, agora que vi isso tudo acontecer, morte aos nossos amigos, à nossa querida Mirna, estou tentando por um fim em tudo isso, eu fui longe fe mais. E quando você me ligou, e quando disse sobre o Dio, eu vi que fui longe demais, eu não posso mais continuar.
Me desculpa por tudo Amora, deixe estar, é tarde para dizer, mas antes tarde do que nunca.
Eu sou inocenteEu matei a Mirna com uma dosagem a mais da medicação, sim. Mas desde o começo, não foi nada pessoal, eu fui obrigada. Foi tudo uma faixada, um pano de fundo para encobrir o verdadeiro mentor. Me perdoa! - Sem palavras eu não pude revidar. Lívia estava de joelhos sob meus pés e em lágrimas sinceras chorava. Muito. E mais uma vez ela conseguiu me deixar sem chão, se mesmo ela tendo matado não era ela a verdadeira culpada de tudo, Deus, ainda não acabou.
- Liv, eu te perdoo. - Falei apreensiva - Mas isso, isso precisa ter fim, então me diz quem é, e juntas vamos acabar com a raça dele. - Ela não parava de chorar, e soluçava ainda mais quando eu falava em acabar com tudo. - E Liv, me perdoa pela sua perna.
- Na...não é nada, eu realmente não sinto dor, e você sabe o quê, eu tenho altos índices de psicose mesmo. Mamãe sempre tentou esconder, até mesmo de você Dionatha - Ela olhou para ele - Eu posso ir com meu irmão?
- Claro Lívia. Você pode ir embora da cidade, só precisa me dizer alguma coisa, me dar alguma pista, sei lá.
- Eu só posso dizer uma palavra, uma única palavra.
- Diga-me.
- Sumiço! - Depois disso, ela me abraçou muito forte como nunca antes, soltamos o Dio, e eles se foram.
                          * * *
Acho que caí no sono, acho não, tenho certeza, nem sei como consegui pregar o olho sabendo o que sei.
Olho no celular, 9 horas, "foi uma dormida e tanto", penso. O bom é que quando a gente acaba de acordar não nos recordamos de nada por alguns segundos, depois o caos retorna, o celular vibra, um número que desconheço.
- Alô.
- Amora, eu, eu... - Ouvi ele chorar.
- Peter, calma. Vai ficar tudo bem, vou estar sempre com você!
- Ela era minha única família de verdade! E agora ela se foi!! Como vai ficar TUDO BEM? - Ele estava alterado, até pudia ouvir a enfermeira dizer para ele se acalmar, ele já estava praticamente gritando comigo.
- Pee, por fav..
- NÃO, NÃO VOU FICAR CALMO! ME LARGA! - Ouvi o que pensei ser um tapa.
- Peter! - Gritei - O que você fez? Peter!? - Sem perder tempo saio correndo da casa da Lívia, e pela rua procuro por algum táxi ou mototaxista mas a rua ali sempre foi muito deserta, então eu corri o mais rápido que pude, até que arranjei uma carona até o hospital D'avicom.
Foi chegando e passando direto atrás do Peter, ele precisava de mim. Abri a porta do quarto e ele me encarou sem um pingo de amor no olhar, a fúria o possuiu.
- Ah Peter, eu fui a culpada. Por minha causa ela morreu, não mereço seu perdão.
- Eu.. Eu vou matar a Lívia!! Aaahr! - Ele gritava e chorava sem lágrimas, seus olhos verdes se destacavam na vermelhidão ao redor da íris dos olhos, suas pupilas estavam dilatadas absurdamente. - Vou matá-la... - Mais calmo ele abaixou a cabeça e disse "que seja feita justiça", seu semblante agora era frio, sem vida - e sem vontade de viver também.
- Vou deixá-lo descansar.. - Saio e fecho a porta atrás de mim - Dê um sedativo à ele para que não saia daqui até que eu diga que ele sairá! - Eu digo à enfermeira.
- Você não é a mãe dele, menina- ela diz me desafiando. Olho nos olhos dela e repito as mesmas palavras, "não vou repetir outra vez", completo.
Tudo o que eu queria era relaxar um pouco, e com o Pee em segurança eu teria algumas horas de paz.
Passei o dia todo andando pela cidade, olhando os aviões, pessoas felizes em suas viagens em família, refletindo sobre tudo. Quase na hora do pôr-do-sol eu estava sob uma árvore robusta em cima de uma pequena colina à uns dois quilômetros de Charlleston, recostada sobre o grande tronco tentei chorar, mas não consegui, como se algo prendesse dentro de mim aquele sentimento ruim. Nada é pior do que um sentimento que não pode ser compartilhado.
Mas ainda assim aquele alaranjado do céu um pouco antes das seis da tarde ne proporcionou paz. Mal a paz chegou e vi de longe uma movimentação suspeita, viaturas policiais, talvez uma ambulância e muitos carros de pessoas curiosas com certeza, mesmo sem querer ir até lá, algo me dizia para ir algo não bom, senti uma pontada no coração que quase caí, "não posso morrer agora Deus", penso.
Cheguei perto do local, parece que alguém tinha caído do terceiro andar da biblioteca principal e se estripado em uma árvore seca que fica bem ao lado do lugar.
- Licença..  Com licença, por favor, deixa eu passar aqui e... - Quando vi ele ali naquela ambulância, eu mal sabia o que tinha acontecido mas lágrimas surgiram em meus olhos, e saí correndo até ele com a vista embaçada pela água dos olhos, e me joguei sobre ele.
- Não, não, não, não, NÃAAAAOOOOO!

Psicose - A árvore forca [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora