Existiram e ainda estão para existir muitas teorias sobre o fim do mundo. Todos sabem que as chances do mundo acabar são mínimas, mas mesmo assim, todos sentem uma coisa bem lá no fundo do coração, um aperto desnecessário, a intuição, dizendo: "Ei, nada é impossível".Ás vezes nos sentimos infinitos demais, completos demais, invencíveis demais, imortais. Talvez sejamos.
Dissemos essas coisas na nossa primeira conversa e Rachel adotou como nosso princípio. Não foi nem um pouco inconveniente quando ela me disse isso. Não soou nem um pouco estranho e mórbido, continua não soando. Pelo menos não pra mim.
Numa noite de inverno duas semanas antes do ocorrido, eu preparei uma coisa pra nós dois. Rachel adorava as estrelas, principalmente no inverno. Era sua estação favorita. Pessoas arrumadas, neve, frio, ventos normais – não de mormaço. Ela costumava dizer que até enxergava as estrelas mais claramente. Mais brilhantes.
Então, naquela noite, coloquei em cima do meu telhado, sim, o da minha casa, edredons e muitas almofadas. Pedi a Rachel que fosse até minha casa de noite e depois que avisasse aos pais que não voltaria cedo. Quando ela chegou subimos até lá em cima, levando apenas meu iPod.
Quando terminei de subir a escada e olhei pra Rachel, me culpei mentalmente por não ter levado pelo menos uma lanterna. Eu sabia que ia me acostumar apenas com a luz natural das estrelas, mas queria ver sua primeira impressão. Mais tarde isso não importaria mais.
- É lindo Gram. Sabe... – Rae suprimiu um riso – Achei que nunca faríamos isso.
- Nunca poderia deixar isso acontecer. – Peguei em sua mão e a conduzi ao edredom. Sentamos e ela apoiou sua cabeça em meu ombro – Iríamos pro inferno só por não fazer isso.
Rachel soltou uma risada e deitou. Continuei sentado e a fitei.
- Sempre tive o sonho de estar lá em cima. Pensava muito nisso quando criança, e agora, em plena adolescência, inverno dos dezessete, eu estou destruindo meus sonhos de infância.
Ela tinha um olhar nostálgico. Seus cabelos castanhos pareciam negros e seu olhar, ah, que enigma.
Eu sabia do que ela estava falando. Tínhamos a mania de comentar as coisas e depois de um tempo conversar sobre a mesma coisa novamente, como se precisássemos de um tempo para processar e formar uma ideia concreta. Eu não pensava da mesma forma sobre esse assunto que ela tocara.
Nem antes, nem naquele momento e muito menos agora.
Lembro de me deitar ao seu lado e pensar muito sobre a pequena Rachel sonhadora numa janela encarando o céu. Sonhando com o seu futuro. Planejando tudo. Tantas coisas se passando... coisas demais pra uma garotinha.
- Tudo parece mais feio de perto - citei.
- Tudo perde a magia.
- Não que exista magia.
- Claro que não – ela concordou e bufou.
Olhei para sua silhueta.
- Você não parece mais feia de perto. E o que eu sinto por você não perde a magia.
Ela se virou pra mim e eu sorri. Quase nunca Rachel levava as coisas que eu falava a sério. Eu só queria dizer pra ela que todas as brincadeiras eram sérias e desejava que todos os sonhos se tornassem realidade. Só queria voltar e acrescentar coisas.
- Eu queria acreditar nesses contos sobre estrelas. - Rae disse depois de um tempo. - Que estrelas são almas e etc. Mas... Elas parecem tão perdidas. Qual o sentido de você não entender a vida, viver o que tem pra viver perdido aqui, e quando morrer continuar perdido?