Retrospectiva

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Minha mente borbulha de tantos pensamentos simultâneos, a semana de provas serve para tirar o juízo de qualquer um. Os alunos passam discretamente respostas uns para os outros. Como num jogo de sobrevivência, se você for pego, já era. As questões de física à minha frente parecem bastante lógicas, porém sem dominar o pré-requisito que são as fórmulas, não há muito o que se fazer.

 — 5 min para o término da aula, deem uma última conferida no gabarito e passem as folhas para frente.

Pela trigésima vez apago minhas tentativas de cálculos. Não acredito nisso... se ainda fosse no meio do ano até seria tolerável, mas agora não! É  sem dúvidas, uma péssima hora para ficar abaixo da média. Mesmo matérias como esta em que sou incapaz de tirar nota máxima, sempre passei "me arrastando", porém não acho que isto vá acontecer desta vez. Eu me matei de estudar, horas e horas lendo e relendo, calculando as questões do livro, mas foi inútil... É como se meu cérebro tivesse chegado ao limite de informações e tudo que eu aprendesse a respeito disso apenas entrasse em um ouvido e saísse do outro lado. 

De repente me lembrei de quando eu era mais jovem e de como eu sempre fui a aluna número um... ! Parece um passado distante de uma pessoa totalmente diferente do meu Eu de agora. E nesse clima de sentimentos nostálgicos logo penso em Fernando... Ele adora esse tipo de coisa... fórmulas, incógnitas... números. Faz pouco mais de cinco semanas que ele e a mãe estão morando juntos no meu maravilhoso 4º andar. Ele saiu do hospital sem sequelas daquela terrível noite de sábado e desde então viramos ótimos amigos, as coisas estavam indo muito bem e aí... como sempre eu estraguei tudo.

— Helena? 

Pus meus pés no chão novamente, William me encarava com um olhar interrogativo ao mesmo tempo que estendia a mão, a fim de que eu lhe entregasse o gabarito da prova. Eu não conseguia encará-lo. As coisas eram mais fáceis quando ainda éramos desconhecidos. Desviei meu olhar e fingi ajeitar as canetas no meu estojo. Ele continuou me observando, senti sua hesitação, era como se quisesse me dizer algo mas no fim acabou desistindo. Ele virou-se e foi entregar nossas respostas da prova ao Victor que passaria para a Alice e finalmente chegariam as mãos do professor.

A sala já se enchia de conversas paralelas mesmo diante das repreensões do professor. Era inútil conter os ânimos depois de uma prova. Fiquei ali inquieta, inventando qualquer coisa para que meu olhar e o dele não se cruzassem. Quando enfim ele voltou e se acomodou no assento a minha frente, tomei coragem e o encarei, ele percebeu que era observado e virou um pouco o rosto em minha direção. 

— Quem já tem idéia de que está na recuperação... estude o capítulo 16...

A voz do professor tirou minha atenção do garoto, era um aviso destinado a pelo menos uns 15 alunos, inclusive a mim. Eu apenas suspirei profundamente. De alguma forma essas fórmulas tem que entrar na minha mente.   

 Abro a mochila e pego meu caderno, uma última olhada antes de ficar de frente para a prova de biologia. Os alunos continuam tagarelando, o rapaz à minha frente não demonstra mais nenhum sinal de interesse em puxar assunto. É... nossa relação, desde que entramos no território um do outro não tem sido nada fácil. Respiro fundo, nesses últimos dias tenho estado muito ansiosa, talvez por causa do resultado do teste de proficiência, ou por causa do ... Balanço minha cabeça tentando afastar aqueles pensamentos. A professora entra na sala pedindo silêncio pois a próxima prova está para começar.

Ela se posiciona próximo à sua mesa e começa a nos repassar as instruções... apenas repetindo o mesmo discurso do professor anterior. Mantenho meus olhos fixos nas páginas riscadas do meu caderno, somente observo as letras e os números sem me concentrar em focalizar nenhuma imagem ou absorver nenhuma informação. 

— Guardem seus cadernos, livros, celulares... qualquer coisa que possa servir como fonte de pesquisa... Já sabem, quem for pego com cola ou passando respostas...

A voz da mulher ecoava pela sala com um tom ameaçador. Só assim que se podia arrancar um comportamento decente dessa galera. Logo todos os alunos se preparavam para o desafio em forma de prova. É incrível como uma simples folha de papel tem o poder de nos deixar tão tensos.

Convergindo (Em Construção)Onde histórias criam vida. Descubra agora