Multifacetas

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Às 18 hrs todos fomos chamados para o jantar. Era um refeitório do tipo self-service, as mesas e bancos feitos de madeira. Eu tratei logo de fazer um pratão daqueles, estava morrendo de fome. Meu parça de quarto era o William, ele nem tretou quando disse que queria ficar com o colchão de cima. A viagem até agora tava de boas, exceto a parte da Alice serrando as unhas e jogando aquele pó em cima de mim durante todo o percurso. Foda foi que esqueci os fones e como a Geo estava bem na nossa frente eu nem podia ir lá para onde estavam os meus manos zoar um pouco.

Pelo que entendi bem, amanhã vai ser um dia cheio de atividades vamos fazer uma trilha, achar um lugar bacana acampar e fazer uma festinha na fogueira... acho da hora esses lances meio "perdidos na selva", inclusive semana passada assisti um filme nessa linha com minha mãe. Os caras daqui disseram pra gente ter cuidado porque vez ou outra tem uns ursos dando uns rolês por aí e podem nos atacar. Terminado o jantar nos mandaram dormir porque teríamos que acordar beeem cedo, cara cê nem sabe o quanto odeio acordar cedinho... só acordo para ir pra aula porque enfim...

Quando apagaram todas as luzes ficou só o frio e os barulhos da floresta. Me deu um negócio assim meio sinistro... Tá ligado que sempre nos filmes nessas horas os personagens são atacados? Pois é, fiquei meio com o cú na mão. O William vazou daqui, devia estar lá fora contemplando a lua...foda, eu tava sem sono e não tinha ninguém para bater um papo... espero não descobrir amanhã que meu parceiro foi morto por algum animal selvagem. 

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- Já tá dormindo?

Puta que pariu... só pode ser brincadeira, logo quando eu tava serrando no sono...

- hmmmm, não...

- Mals, se te acordei...

- De boas...

- E aí... qual o lance entre você e o Will?

Nesse momento abri os olhos sobressaltada, inda bem que estava escuro e ela não pode ver minha expressão.

- Nenhum...

- Sei... tenta se aproximar dele, sei lá...conversar alguma coisa...

- Conversar sobre o quê?

- Sei lá, sobre o...tempo?

- Por quê???

- Ah, sei lá... já reparou que geralmente quando a gente não sabe sobre o que falar, fala sobre o tempo...?

- E qual seu interesse nisso?

- Ah, acorda querida... ele tá tão na sua...

Confesso que era bem estranho essa garota, logo essa, tentando fazer amizade comigo e pior, me empurrando para cima de um cara. Eu não sei o que ela ganhava com isso, mas eu não confiava nela. Parecia ser bem o tipo que gosta de pregar peças nos outros.

- Aíii, tá cheio de mosquitos aqui!

- Sério? Nem tinha notado...

- Percebi o sarcasmo hein...

De repente ela desceu a pequena escada e foi tateando no escuro até a cômoda onde ela havia guardado suas coisas.

- Por que você é assim?

- Assim como?

- Uma chata.

- Não sei... deve ser erro de fábrica...

-... até que enfim achei, agora sim. 

Olhei para ela, os poucos raios lunares que atravessavam o vitral iluminava debilmente o quarto. Ela olhou para mim.

- ... você quer um pouco de repelente?

Neguei com a cabeça e me virei na cama, o colchão não era tão macio apesar do tempo que já vem sendo usado. Agora sou eu que não consigo dormir com pensamentos aleatórios circulando em minha mente. Confiro o celular, ainda são 23 Hrs. Lá fora o céu devia estar bem nebuloso... aqui dentro a temperatura era fria, gélida como toda madrugada pode ser somados à umidade natural da floresta que nos cercava. Depois de uns 10 minutos que mais pareceram uma eternidade levantei da cama, Alice já havia subido e ressonava baixinho, peguei meu casaco, fones e caminhei em direção àquele chamado misterioso.

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Minha mãe dormia tranquilamente e eu como sempre, atacado por minha insônia. Não tinha disposição física ainda para subir para o terraço, então me contentei com minha janela. O céu era de um azul profundo, as estrelas eram pequenos pontinhos luminosos ofuscados pelas luzes da cidade. As cortinas dançavam conduzidas pelo vento. Amanhã vou dar uma olhada no ap da Helena, ela deixou aos meus e aos cuidados da minha mãe por conta de sua viagem. Me pergunto o que ela deve estar fazendo agora... Eu não sei bem o que tá rolando, tipo... sua presença tem sido constante na minha vida ...e vez ou outra no meu pensamento. Ela é muito reservada e esse mistério me atrai. Por fora ela quer aparentar ser uma pessoa muito forte... mas por dentro parece ser sensível demais. Ponho as mãos no bolso do meu casaco e sinto algo, é um papel com número de telefone.

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 Eu a vi entre as sombras da noite, sua cabana ficava a alguns metros no lado oposto da minha, o que denunciou sua posição foi o brilho da tela do celular. Estava sentada no parapeito olhando para o céu. Acho que ela era uma criatura da madrugada. Duvido que a Alice roncasse ou tagarelasse tanto quanto o Victor, o meu motivo pessoal de estar aqui fora nos batentes da nossa cabana ao invés de dormindo tranquilamente na minha cama. Acima e ao nosso redor a brisa fresca era simultaneamente doce e fria, que nem sorvete de creme. Aquela melodia ressoava nos meus ouvidos, e quando fechava os olhos podia sentir a textura de sua pele, naquele minuto em que pela primeira vez toquei sua mão. Quando ela abriu os olhos, despertada de seu sono, uma fração de segundos de sinapses nervosas pareceu algo muito lento. O que será que está havendo comigo?

Convergindo (Em Construção)Onde histórias criam vida. Descubra agora