Afeição ao Primeiro Toque

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Quando eu a coloquei na cama, seus olhos tinham um brilho diferente e suas bochechas estavam rosadas. Todos aqueles sentimentos que estavam me cercando durante esses dias haviam me dominado. Sempre fui o tipo de cara que pensa bem antes de fazer as coisas, mas com ela era diferente... era algo insano pulsando dentro de mim. Lá de fora se ouviam as risadas e gritos da galera que celebrava em volta de uma fogueira à luz da lua, enquanto que aqui a fogueira ardia em meu peito. Nós nos encarávamos em silêncio.

- Cara, como eu nunca percebi o quanto você é linda?...

Ela baixou os olhos timidamente. Pus minha mão esquerda em seu rosto e me aproximei,  ela olhou para mim suas pupilas estavam dilatadas e sua respiração irregular. Eu a beijei mais uma, duas, três vezes, vindo lá de fora trazido pelo vento os ecos da canção:

"...Hoje aqui, não importa para onde vamos. Vivo agora, não tenho outros planos. E é tão fácil viver sonhando, enquanto isso... a vida vai passando. ..." ⑼ 

Envolvidos por aqueles sentimentos impulsivos, nós nos amamos.

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Eu nem vi quando o William chegou, eu apaguei mesmo. Desci da cama, ele tava roncando, cara... deu uma vontade louca de zoar ele mas eu não tinha nenhum material disponível, tipo esmalte, batom...essas paradinhas. Quando cheguei no refeitório não tinha ninguém, oh beleza, sobra mais para mim. Passaram-se 10 min e nada de ninguém aparecer, aí já comecei a ficar grilado. Eles não iriam embora sem a gente e outra o ônibus só ia sair à noite. Decidi fazer uma investigação, caminhei um bocado até que encontrei os encontrei no cais seguindo o barulho da gritaria e dos risos, havia uma tirolesa, e uma imensa bóia onde os manos subiam por uma escada e pulavam, projetando quem estivesse do outro lado do ponto de impacto às alturas. Tinham algumas minas pegando um bronzeado na areia e outras passeando de lancha e tirando selfies. Havia até um churrasquinho rolando, porém...nada de cervejas... Enfim, o importante é que tinha carne.

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Acordei cedo, aliás não tão cedo para quem está acostumado a acordar às 3 h da madruga. Minha mãe dormia profundamente, estava cansada depois da faxina que demos no ap da Helena. Minha mãe é daqueles tipo que não pode ver um pouquinho de poeira que já acha que tá sujo. Peguei minha xícara e enchi de café, me postei à janela. O sol estava tímido entre as nuvens, as gotas de chuva caiam discretamente e eram arrastadas pela brisa suave. Do quarto andar eu podia observar todo o movimento na rua, os carros estacionados no meio fio, o sinal fechado na esquina, o vai e vem das pessoas, a lavanderia, a lanchonete, um grupo de vovôs jogando carteado na calçada do boteco, uma música antiga vencendo os barulho urbanos e me trazendo nostalgia da época em que meu pai e minha mãe ainda se davam bem.

"...Quando o segundo sol chegar, para realinhar as órbitas dos planetas...derrubando com assombro exemplar, o que os astrônomos diriam se tratar de um outro cometa..."⑽ 

Fiquei ali sentado viajando na poesia da Cássia, hoje a Helena chegava da excursão. Senti sua falta esses dias, talvez eu devesse falar com ela... Conferi no calendário, uma data estava circulada com marcador preto. E esse dia se aproximava trazendo todas as minhas oportunidades de um futuro melhor. 

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Abri meus olhos, aquela sensação de prazer inundou todo meu corpo. Ele não estava mais aqui, acho que adormeci e nem percebi. Todas as lembranças da noite anterior vieram à minha mente e eu sorri involuntariamente, quando a enfermeira me despertou de meus devaneios.

- Bom dia... parece que está se sentindo bem melhor, hein?

- Sim, rs.

- Isso tem haver com aquele rapaz que estava aqui? rsrs

Senti o rubor queimar minha face, eu não respondi nada, nem precisei...ela já sabia.

- Olha só, você já está liberada, use a botinha para comprimir seu tornozelo, em casa durante uma semana use gelo para diminuir o inchaço e você logo logo poderá caminhar normalmente.

Agradeci e sai do recinto, era hora de voltar para a minha cabana. Uma música ficou passando na minha mente desde ontem e me flagrei cantarolando enquanto caminhava.

  - "... Eu só queria te contar, que eu fui lá fora e vi dois sóis num dia e a vida que ardia sem explicação..." .⑽

Convergindo (Em Construção)Onde histórias criam vida. Descubra agora