— Puxa diabo, estou cozinhando aqui! — disse Butter.
— Então volte para dentro do carro — volveu Craw.
— Não mesmo!
— Então cale o bico.
— É assar dentro do carro ou frigir cá fora. —i Está certo. Mas pare de falar nisso.
O gordo hesitou. — Desculpe, Craw — disse ele.
— Tá bem.
Craw tinha vontade de levantar-se mas não o fazia. O sol pegava o automóvel de viés, no ângulo das três horas da tarde, empoçando uma sombra ardente ao lado do estribo. Era ali que Craw se agachara, lidando com duas vasilhas de lata que lhe queimavam as mãos. Havia quase uma hora que martelava e cortava as latas. Tinha vontade de estirar as costas, olhar ao longo da estrada para ver se descobria sinais da aproximação de algum carro. Mas não queria virar o rosto para o sol.
— Dê uma olhadela à estrada — disse ele.
— Não vem nada — respondeu Butter. Mas pousou a mão carnuda no estribo e levantou-se, arfando. A cara de Craw tinha aquela expressão de quando estava danado e Butter sabia que o mais prudente seria levantar-se e olhar a estrada. E assim fez, respirando o ar tórrido, sentindo-o arder no seu rosto, encher-lhe os olhos de água. Nada. Para o norte, a estrada de terra solta estendia-se em linha reta, completamente vazia. Para o sul, fazia uma curva e desaparecia das vistas por trás das rochas vermelhas. Nada.
— Vê alguma coisa? — Craw voltara ao seu trabalho.
— Nem sequer um lagarto.
— Alguma poeira?
— Já disse que não tem nada.
Butter acocorou-se na sombra estreita e pôs-se a enxugar o suor com um trapo azul.
Tinham começado a viagem três dias atrás, partindo de uma vila do deserto que possuía uma bomba de gasolina, um armazém de campo, mas nenhum hotel. Era para ser uma viagem de prospecção, mas o que eles queriam na realidade era gozar a vida.
Atulharam o velho automóvel de latas de conservas, equipamento para acampar, ferramentas e água em bolsas de borracha. Craw procedera a uma revisão geral do carro antes de partirem,
— Pode ser velho, mas dará conta do recado — dissera. E Butter respondera:
— Você é quem manda — porque Craw tinha sido mecânico em Los Angeles. Mas não dera conta do recado, não. Nem por sombras. Talvez porque Butter se esquecera de incluir na bagagem a lata de dez galões de óleo. Não falou nisso a Craw para ele não se danar. Craw ficava sentado dentro do carro enquanto Butter verificava a água do radiador e o óleo do cárter. E Butter dizia sempre:
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SELEÇÃO NATURAL - ALFRED HITCHCOCK
Mystery / ThrillerEsta é a quinta historia do livro um pouco do meu sangue e outras historias. Boa leitura e bons sustos.