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{ Se quiser, leia ouvindo }

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O sol já se punha, mas ninguém estava reparando nisso. Apenas o horário poderia dar essa indicação já que uma chuva tomava a cidade a horas. O céu havia escurecido rapidamente e ela tinha que chegar logo no metrô .

Ouviu seu barulho e viu a fumaça a algumas esquinas. Começa a correr já com a roupa molhada e o cabelo provavelmente todo bagunçado, sentia frio e só queria chegar em casa.

Ela entrou vagarosamente no enorme estabelecimento e rapidamente se aqueceu e acalmou. Andou observando enormes malas jogadas aqui e ali, estava tão cansada que não conseguia se preocupar com a bagunça ou perdas.
As cadeiras de descanso estavam quase todas vagas e a Tv do pátio estava ligada inutilmente já que ninguém prestava atenção.
Ver o movimento no local lhe dava uma certa satisfação, de que a rotina estava ajustada apesar dos empecilhos trazidos pela chuva .

Ela seguiu caminho até um banco e se sentou. Fixou seu olhar no grande relógio, tentou avaliar se o clima poderia melhorar e ficou nisso por alguns minutos. Ainda precisava comprar sua passagem, mas não tinha pressa. Acabou se distraindo vendo o rosto de cada pessoa passando ali. Ela gostava disso, ver novos rostos, na sua cabeça ela inventava uma história de como teria sido o cotidiano de cada um, como teria sido o trabalho ou talvez o encontro em família.
Estava tao profundamente concentrada que só se despertou quando se ouviu soar um grande estrondo vindo dos trilhos.
De um momento ao outro varias pessoas estavam correndo naquela direção, alguns, tomados pela pressa e curiosidade, acabaram até mesmo se engarranchando na roleta de pagamento.

Ela se levantou e foi indo ate lá tentando entender o que poderia ter acontecido. Se aproximou do aglomerado, mas vários olhares curiosos pousados no mesmo lugar não facilitavam sua tentativa, fazendo a visão da mulher ser impossível, o que, apesar de ela não estar muito interessada, causava um pouco de angustia.
Alguns minutos passaram e ao longe uma sirene pôde ser ouvida. Homens com vestimenta branca entraram correndo abrindo espaço entre as pessoas. Nesse instante finalmente ela conseguiu avistar algo, um corpo sendo retirado dos trilhos.
Todos começaram a se desagrupar e sair de perto do local, a maioria estava bem assustada e alguns choros eram audíveis. A mulher ficou ainda ali sem uma reação ao certo. Alguem tinha pulado na frente do trem, realmente nao era algo esperado para o fim de um dia. Apesar de todo o pânico e movimentação ali, ela não conseguia se sentir daquela maneira. Chorar, se assustar, e se sentia num universo paralelo ao das outras pessoas por isso.

Era com certeza algo fora do comum. A maioria deveria estar pensando o quanto aquela pessoa era tola, ou o quanto tinha passado para chegar a fazer isso, mas ela não, por mais difícil de pensar que pareça, ela finalmente tinha encontrado a palavra que descrevia aquilo que sentira, acabava sendo compreendida.
Olhara para aquele corpo e pensamentos tinham corrido em sua mente.

Agora aquela pessoa estava livre.

Livre da vida, livre do sofrimento, pôde acabar com a dor. Sua alma já estava longe. Longe das guerras e iras do nosso mundo.

Ela já pensara nesse ato varias vezes e por diversos motivos, mas, porque nunca o tinha feito? Eram tantas dúvidas, o que encontraria do outro lado? E se, existe um outro lado. Era algo sem volta, e se ela se arrependesse? Na verdade, nem esse sentimento poderia sentir, não sentiria mais nada.

Tinha chegado a uma conclusão, pra ela, mesmo com amarguras, a vida era preciosa demais para ser perdida. Voce poderia tomar como exemplo uma árvore, tem varias folhas, incontáveis, várias raízes, sempre pode ter mais frutos. Ou então, seu cabelo, também vários e vários fios, aliás, sempre nascem mais deles. E as células? Milhares e milhares. Mas ... e a vida? Temos uma. Apenas uma mísera vida.

A tristeza poderia a preencher, principalmente ali naquele momento, mas ela sabia, um ponto de felicidade ainda poderia ser achado nela, bastaria procurar. Aquilo existia nela, existe em todo mundo.

Andou cabisbaixa e comprou sua passagem. Não demorou para o seu trem chegar, ou talvez ela não tenha percebido o tempo. Entrou e se sentou sozinha no fundo. Olhou para a janela com as gotas ainda escorrendo e pensou, ela estava ali agora, tudo podia mudar. Uma vida passageira, com minutos passageiros. O tempo e mágoas tomando sua vida e a deixando de viver.
Ela estava agora voltando a mesma rotina e deixando o conturbado dia pra trás , estava voltando para casa, o seu refugio onde estaria salva.

Perturbações de uma menteOnde histórias criam vida. Descubra agora