Estrelas Frias

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Naquela constelação havia apenas estrelas azuis, nenhuma branca ou vermelha. O que significava que todas tinham uma temperatura bem alta. Karen sempre achou aquilo engraçado, porque, de um ponto de vista humano, sempre se tinha a impressão de que as azuis eram frias e as vermelhas quentes. Eram impressões herdadas do tempo em que a humanidade ainda habitava a Terra. Mesmo tendo colonizado outros planetas por séculos, os humanos nunca abandonaram completamente sua cultura terráquea. Infelizmente, isso incluía o dom natural de aniquilar uns aos outros.

Os humanos haviam se espalhado por três sistemas planetários, unidos como uma nação interestelar. Mas questões políticas separaram os governos e deu-se início a uma guerra. Karen Dantas era uma capitã do sistema Central, mas já era considerada uma heroína militar por eventos antecessores à guerra separatista.

Sua nave não era dos modelos mais novos por própria escolha da capitã. Ela a batizara de Lumus décadas antes e não largara nunca, mesmo com o exército oferecendo outra mais nova. Karen não interagia muito com as pessoas, não tinha família, e era provável que ninguém a chamasse de amiga. Sua tripulação a temia e a respeitava, embora muitos dos soldados acabassem por pedir transferência. Mas a nave tinha valor sentimental, era uma das duas únicas coisas que Karen tinha amado na vida. A outra deixara de existir há muito tempo.

– Senhora? – Kirk, o subcomandante, chamou pela capitã ao entrar em sua cabine.

A nave era enorme, com quartos para os soldados, salas de holograma para treinamento e a espaçosa cabine de comando com os pilotos e cientistas. A capitã, porém, ficava em sua cabine particular na parte cima, onde podia ter toda a visão do universo à sua frente e ficar sozinha como sempre preferia.

– Sim? – o cabelo preto era curto, sem muita vaidade; os olhos castanhos e tristes, somados a algumas rugas e à periódica falta de sorriso, contribuíam para um semblante de uma pessoa sofrida. Ela estava sentada em sua cadeira flutuante.

– Apenas Julia e Silas conseguiram retornar.

– Conseguiram alguma coisa? – ela não demonstrou nenhum remorso em saber que menos da metade da equipe regressara da missão.

– Trouxeram um prisioneiro.

Karen levantou-se da cadeira e foi até o elevador, que desceu rapidamente à cabine de controle. Silas estava ao lado do prisioneiro com uma arma de plasma na cintura. Havia sangue em seu rosto. O prisioneiro estava ajoelhado com as mãos para trás presas a algemas magnéticas. Julia estava do outro lado da sala recebendo cuidados. A médica da nave, Dra. Selly, usava um objeto pequeno, semelhante à extinta caneta, que emitia um laser azul capaz de fechar feridas rapidamente e parar o sangramento.

– Conseguimos, Capitã – anunciou Silas. – Perdemos alguns soldados, mas sabotamos a entrada da nave deles no nosso sistema. E conseguimos arrastar um dos canalhas – chutou o prisioneiro, que estava tão machucado quanto seus raptores.

O sistema Central era o maior e o que tinha mais poder bélico, o que obrigou aos sistemas Norte e Sul a formarem uma aliança. Constantes ataques vinham dos dois lados. Lumus era uma das centenas de naves localizadas nas fronteiras entre os sistemas, incumbidas de interceptar qualquer ataque vindo dos separatistas. Karen analisou o prisioneiro e depois foi até uma das mesas e pegou um objeto cilíndrico. Quatro agulhas saíram da ponta do objeto, três na beirada e uma maior no meio. Voltou ao prisioneiro e enfiou as agulhas no olho esquerdo dele.

O cativo gritou de dor enquanto as três agulhas menores encravavam para manter a posição e a agulha maior penetrava o sistema nervoso e espalhava nanorrobôs em busca de dados neurológicos. A maioria dos soldados estava acostumada, mas os mais novos se impressionavam com a falta de compaixão da capitã. A "operação" levou cerca de trinta segundos e os nanorrobôs voltaram ao objeto. Karen entregou a Mark, cientista responsável da nave, que rapidamente conectou ao computador.

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