heartless

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Oi, boa tarde. Como estão? Bom, espero que gostem do capítulo. Obrigada a quem dedica algum tempo para ler essa estória e a quem me cobra atualização também! Isso é importante, obrigada mesmo. Beijos da tia bea.

Jauregui's point of view

"Que vai ser quando crescer? Vivem perguntando em redor. Que é ser? É ter um corpo, um jeito, um nome? Tenho os três. E sou? Tenho de mudar quando crescer? Usar outro nome, corpo e jeito? Ou a gente só principia a ser quando cresce? É terrível, ser? Dói? É bom? É triste? Ser: pronunciado tão depressa, e cabe tantas coisas? Repito: ser, ser, ser. Er. R. Que vou ser quando crescer? Sou obrigado a? posso escolher? Não dá para entender. Não vou ser. Não quero ser. Vou crescer assim mesmo. Sem ser. Esquecer."

Era o que dizia o poema de Carlos Drummond de Andrade que eu relia pela milésima vez naquela manhã enquanto tomava meu café. Selma permanecia em silêncio, mas eu sentia seu olhar em mim.

— O que te preocupa, menina Lauren?

Pousei o jornal próximo à minha xícara de café e suspirei, direcionando meu olhar à velha mulher. Selma me tratava como se eu fosse sua própria filha, o brilho maternal em seus olhos não me deixavam mentir.

— Não há nada me preocupando. — Menti. Selma sabia de todos os meus problemas com os meus pais, sabia de todos os conflitos que tive com meu pai, sabia de absolutamente tudo. — Só achei uma de minhas poesias favoritas hoje no jornal e apesar de antiga, ainda diz muito sobre mim.

Ela me avaliou, seus olhos azuis brilhando com a idade e sabedoria que aquela mulher carregava. Eu sabia que podia confiar nela, sabia que se eu, por ventura, matasse alguém e precisasse de alguém pra me acobertar e interceder por mim, teria ela.

— Vamos, leia para mim.  — Ela me pediu com um brilho quase infantil em seus olhos e automaticamente, recordei-me de quando lia as poesias das aulas de literatura para Selma, quando ainda morávamos com meus pais. — Gosto quando você lê para mim, me faz lembrar de quando era apenas uma menininha. — Como quem lia minha mente, ela continuou e um sorriso abriu caminho pelo meu rosto.

Eu recitei a poesia que já conhecia de trás pra frente. Recitei como se contasse a ela os meus pecados mais abstrusos, e Selma me ouviu como se entendesse que aquela poesia era quase um grito de socorro, a compreensão nunca abandonando aquelas duas orbes azuis que já viram mais do que sou capaz de contar.

— É uma bela poesia, menina Lauren. Maltrata minha alma que ainda se veja presa a essas questões. Eu já estou velha, sei o que fui e posso te garantir que não fui nada do que não queria ser. — Ela pausou e levou a xícara aos seus lábios, sem nunca cortar o contato visual, eu sabia que ela ainda queria falar e esperei. — Não deixe que poesias antigas sobre alguém que não sabia ser seja tudo o que define você. Vi você viver a vida inteira tentando ser o que os outros esperavam que você fosse e esquecendo-se de ser quem você queria ser. Não faça mais isso, menina Lauren, não continue enforcando-se com cordas que não são mais suas.

Encarei-a enquanto absorvia tudo o que ela havia me falado. Sabia que ela estava certa, ela sempre estava. Olhei as horas em meu relógio de pulso e me levantei. Hoje era o dia da conferência, mas eu ainda precisava passar no hospital.

— Você é incrível, Selma, sempre tem a coisa certa pra falar na ponta da língua. Obrigada por isso. — Dei um beijo em sua testa e levei minha xícara para a pia. — Agora, preciso ir. Hoje o dia será longo.

— Eu quero que você seja feliz, menina Lauren. Viver uma vida regada de infelicidade é a pior doença para alma e a sua alma é uma das mais lindas que já conheci. Não a deixe adoecer. Seus dias sempre são longos! Deixarei seu jantar no forno. Tenha um bom dia, Lauren.

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