Uma pontinha brilhante aparece no canto do céu no meu campo de visão, e nesse momento já imagino o que Be irá dizer.
— Faça um pedido — Ele me olha de relance e confirma minhas expectativas.
— Eu desejo o mundo. — Falo, baixinho, em sussurro para as estrelas.
— Não se pode desejar o mundo. — Ele junta a boca ao meu ouvido — E pedidos não são feitos em voz alta. — Sua voz se perde no vento.
A estrela cadente cruza o céu, no mesmo instante em que fecho os olhos e desejo que tudo fique bem. Uma esperança guardada entre o céu e meu coração.
Permaneço algum tempo de olhos fechados, ouvindo o quase silêncio da noite estrelada.
— O que você desejou? — A voz dele atravessa meu corpo e me faz abrir os olhos lentamente.
—Pedidos não são feitos em voz alta — Repito sua frase.
Ele sorri, me observando. Minha boca se faz em um sorriso também, acompanhando o dele. Meus olhos tornam a observar o céu. Bernardo passa os braços ao meu redor, me aquecendo contra o frio da noite. Sentados assim, parecemos um monumento contra o mundo.
— Be? — Chamo e ele passa a me fitar.
— O quê?
— Posso perguntar uma coisa?
— Acabou de perguntar — Ele sorri, zombando de mim. — Vá em frente. — Seus braços me apertam.
— O que você acha das estrelas?
— Que diabos de pergunta é essa? — Seu tom é brincalhão e ele vira o rosto para mim. — Eu acho elas brilhantes. E distantes. E bonitas. Como você. — Ele diminui o tom na última parte.
— Como eu? — Nossos olhares se encontram. — Não estou distante. — Reviro os olhos.
— Porquê da pergunta? — Ele ignora meu comentário.
— Eu gosto de estrelas. Só isso. — Volto minha atenção para os pontos brilhantes no céu azul escuro — Elas estão sempre lá, nos observando. — Me acomodo em seu abraço. — Talvez elas sejam donas do mundo, já pensou? Talvez estejamos só dentro de uma grande caixa, e elas sejam os feixes de luz que nos guiam. Talvez sejam pontinhos de quem já se perdeu por aí, tentando achar o caminho da lua...
— E talvez você pense demais, Stella. — Bernardo completa e interrompe meus pensamentos perdidos. Ele muda a expressão, para um rosto pensativo. — "Stella"... Até daria um bom nome de livro, sabia? A menina que pensa em estrelas: "Stella e as estrelas".
— Acho que agora não sou eu quem está pensando além dos limites do mundo. — Solto um riso leve.
— Não existem limites para pensar, existem? — Ele sorri também — Talvez sejamos loucos.
— Ou talvez o mundo seja louco para nós. — Completo sua linha de pensamento.
— Sabe o que eu acho agora? — Ele olha para a rua abaixo de nós. — Talvez sejamos poesias perdidas de um velho louco que enlouqueceu o mundo.
— Eu já penso que nós somos o próprio velho louco, dividido em dois corpos...
— E por quê? — Seu riso fácil se perde com a brisa leve.
— Porque nós nos completamos. Assim como a poesia completa as pessoas, e as estrelas completam o céu...
— E a esperança completa a vida. — Mais uma vez, Bernardo finaliza minha fala. Ainda acho que ele sabe ler pensamentos, para me entender tão bem assim.
Nossos corpos transmitem calor um ao outro em meio ao mar de estrelas, ou almas perdidas, ou pontos de esperança, ou o que quer que seja que brilha no céu. Em muito tempo não me sentia bem assim. Uma velha esperança brota no interior da minha alma, uma esperança de que tudo fique bem para sempre, mesmo que isso seja impossível. Talvez acreditar nisso me faça sentir bem. Talvez precisemos de alguma esperança na vida. Talvez... Tudo é um grande talvez.
— Sté? — Ele me chama.
— Oi?
— Eu te amo.
O amor é um talvez.
— E eu amo o mundo. — Sinto ele me lançar um olhar incompreensível, após esperar um "também te amo" de volta. — Mas, não se preocupe, amo você também. Sorte sua estar no mundo. — Seus músculos relaxam ao ouvir isso e eu dou risada.
Eu não deveria amar o mundo, sei disso. Mas o amor é só um talvez, como todo o resto. Então talvez o mundo também se perca. Tanto quanto o amor, as pessoas, a vida. É tudo tão vago...
Mais uma vez, me sinto em casa no abraço dele. As estrelas nos observam e o vento nos permite sentir como é voar, mesmo sentados numa mera varanda. Penso mais uma vez em como seria tocar a lua. Não literalmente, é claro, mas eu chamo de lua o que eu sinto quando estou com o Be. Porém, como se faz para tocar o amor? Por isso eu o chamo de lua. Uma hora está bem, outra não está. O amor é de lua. São só estrelas juntas que formam a lua, sendo as estrelas o mundo todo, e a lua o amor. Um mundo sem amor, apenas não é um mundo. Assim como o céu não é feito só de estrelas. E por isso pedi para que tudo ficasse bem. Pedi para que tudo tenha amor.
Me aconchego em meio a noite, esperando que a estrela cadente decida me ouvir. Ou só desejando dormir bem, me sentir bem. Às vezes se sentir bem é pensar bem, ou ter um pouquinho de esperança. Esperar é o primeiro passo para conseguir.
Acho que Bernardo está certo. Eu penso demais...
— Boa noite, Stella. — Ele beija minha testa, que está repousando em seu ombro. Dormir com as estrelas é uma das coisas que mais gosto de fazer.
— Boa noite. — Sorrio para ele e mergulho em meus pensamentos novamente.
Esperança. É só ter esperança...
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Stella e as estrelas
Short StoryStella adora as estrelas. Para ela, esses pontos brilhantes no céu são sinal de que ainda podemos ter esperança, como uma luz no fim do túnel. Observar o céu a faz sentir em casa. Na noite em que uma estrela cadente resolve cruzar o céu, Stella só t...