Capítulo Único

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POV Rosé

Era sempre a mesma coisa. Ela entrava, fazia o mesmo pedido e ia embora. Não me dirigia nem mesmo o olhar, sempre olhando o celular.

O dia era chuvoso e fazia bastante frio, o que significava mais movimento no café onde eu trabalho. Eu adorava o cheiro de café e como ainda estava me treinando para ser barista fiquei com o papel de atendente. Passava cerca de oito horas atrás de uma caixa, atendendo clientes, passando pedidos e contando dinheiro. Não era o que eu queria, mas pelo menos o cheiro de café estava ali. Entre todos clientes, um se tornou especial. Uma garota morena, muito bonita. Todos os dias eu ansiava pela sua chegada (sim me apaixonei por alguém que nunca me olhou, ou falou mais do que "Um cappuccino, por favor"). Chegava ao ponto de eu sorrir quando a via passar pela porta e fazer os sininhos soarem no estabelecimento.

Minha amiga sempre me dizia para esquecer, que pessoas como aquela menina só se importavam com aparência e dinheiro, mas eu sabia que ela não era assim.

Um guarda-chuva rosa foi posto contra a grande janela de vidro e quando se fechou meu coração palpitou. Lá estava ela. Os cabelos castanhos escuros estavam um pouco molhados pela chuva, o rosto bonito estava sério (talvez ela não gostasse de chuva.) Colocou o guarda-chuva dentro do suporte e caminhou na minha direção. Usava um vestido delicado rosa claro, com salto não muito alto da mesma cor. O corpo estava quase que totalmente molhado, denunciado que ela não esperava por uma queda d'água.

Mas o que me atraiu a atenção foi que mesmo assim ela não estava sem os fones de ouvido branco. Torci o lábio em um pequeno bico, perdendo minha coragem de falar com ela. E se ela fosse aquele tipo de gente que odeia ser interrompida durante uma música?! À medida que ela se aproximava parecia se distrair mais e mais com o celular nas mãos. Parou na frente do balcão e manteve o olhar baixo.

- Um cappuccino, por favor. - Disse baixo, sem me olhar então guardou o celular. Por um momento achei que fosse olhar para mim, mas ela estendeu o braço e pegou uma trufa de chocolate que ficava sobre o balcão.

Lancei um olhar na minha amiga, já que ela também sabia do costume da morena que arrumava a franja levemente molhada. Assim que entreguei seu pedido ela colocou o dinheiro na minha frente e saiu andando, porém não saiu do Café como sempre fazia. Ela se sentou em uma mesa ao lado da janela e ficou brincando com o copo, sem dar um gole. Pensei em ir lá falar com ela, mas iria perder meu emprego se largasse o caixa sem mais nem menos. Tive de me contentar a ficar olhando a garota, que mexia os lábios e mexia os pés no ritmo da música de seus fones.

●●●

Um ano havia passado. A menina (cujo nome eu ainda não sabia) continuava a ir no café, pedindo sempre a mesma coisa e desde aquele dia da chuva ela passou a ficar sentada na mesma mesa, olhando o movimento da rua enquanto cantava baixo. Lisa, minha amiga, às vezes me batia por ignorar um cliente, sem querer, para ficar olhando a garota, que naquele momento havia mudado os cabelos para castanhos mais claros.

Apesar de antes me dizer que era impossível ter uma relação com a garota dos fones de ouvido, Lisa passou a me apoiar, claro que mantendo a razão na minha cabeça. Ela me dizia para falar com a menina antes de me declarar completamente e descobrir que nem tudo era o que parecia.

- Já pensou em dizer que ela te pagou errado? Pode funcionar. - Lisa comentou, preparando um macchiato. Continuei contando o dinheiro do caixa, verificando tudo antes de fecharmos o café. - Se quiser eu roubo a bolsa dela e você diz que ela esqueceu aqui.

- Você só pode estar brincando. - Dei uma risada alta. Lisa ficou séria, porém deu de ombros e desligou as máquinas. - É isso. - Suspirei e abaixei o rosto. Meu estômago estava embrulhado.

A garota dos fones de ouvidoOnde histórias criam vida. Descubra agora