Durante | parte 2.

602 85 33
                                    


Gustavo me contou que passou o último ano focado nos estudos. Ele estudava design gráfico e sonhava em ser animador de desenhos. Conseguira participar de alguns projetos e disse que estava ansioso para que eu pudesse ver seu trabalho. Eu concordei, mas sabia que provavelmente isso nunca aconteceria. Gustavo me contou que conheceu Lara há pouco tempo, em uma festa de um amigo seu. Ele disse que esse tal amigo o convidou para tocar algumas músicas ao vivo naquela noite. Perguntei, rindo, se ele havia tocado Dois Rios, esperando um não. Mas ele, me contrariando, confirmou, e ainda me contou que sempre que dava, tocava a música em seus bicos de cantor.

Suas mãos rondavam meus cabelos e clavícula, suavemente, deixando com que os dedos passassem lentamente sobre minha pele. Gustavo sabia onde me tocar e isso era um tremendo perigo para minha sanidade. Tentei recuar algumas vezes, mas seu toque me compelia a continuar onde estava. Então, enquanto ele fazia carinho em minha cabeça repousada em seu colo, deixei com que ele falasse. E assim o fez.

Gustavo nunca foi um homem de muitas palavras; para ele, nada mais que o necessário. Porém, naquele sábado, friamente peculiar de memórias e fantasmas do passado, ele se pôs a me falar sobre a sua vida desde quando havíamos decidido tomar caminhos diferentes.

- Foi difícil para mim, sabe? Eu percebi o quão errado eu estava apenas depois que você foi embora. Mas, eu conheço você, minha flor de maracujá – maracujá era sua fruta preferida.

Suspirei.

- Nunca disse que foi fácil tomar tamanha decisão. Foram longas noites matutando. Minha vida estava arquitetada em sua função.

- E esse foi o maior problema para você, não é? Eu estava acostumado a deixar as coisas passarem e apenas não percebi o mal que a fazia.

Ele contou que depois de alguns meses do término, havia se relacionado com uma outra garota. Fernanda, ele comentou. Gustavo também disse que ela era viciada em cafeína e carregava consigo balas de café para todos os momentos. Perguntei qual era o grande problema nisso.

- Ela não era você.

Marte, de vez em quando, subia no sofá para se aninhar entre nós. Meu gato sempre gostara muito de meu ex-namorado, pois era sempre Gustavo quem comprava brinquedos novos para ele. Imaginei que, talvez, Marte pudesse estar decepcionado dessa vez. Eu estava decepcionada comigo mesma, ao comprovar a força de controle que eu não tinha. Provavelmente, era algo que eu deveria deixar fora de um futuro currículo profissional.

Pensei, por alguns instantes, em todas as diversas coisas que eu poderia estar fazendo para satisfazer a mim mesma. Além de descansar, poderia estar alternando minhas horas de sono com a atualização de alguma série que eu estivesse querendo assistir. Mas, ao invés disso, gastava meu tempo jogando papo fora com o cara o qual eu mais conhecia os detalhes. Bem, ao menos, assim costumava ser.

Depois de falar, Gustavo permaneceu quieto por um tempo, assim como eu. Apenas continuamos deitados no sofá, vendo as horas passar. Confesso que me sentia um pouco perdida dentro da confusão que se instalava na minha cabeça e coração. Sua presença não aliviava em nada saber o que eu teria que fazer uma hora ou outra. É claro que Gustavo havia sido uma parte muito importante para mim. Mas eu não era eu com ele. Eu apenas era algo. Não era alguém.

E eu queria ser alguém além de um amor que não deu certo. Não poderia deixar que Gustavo me fizesse esquecer de quem eu era, mais uma vez.

Ficamos o que pareceu horas na mesma posição. Cheguei a dormir e imaginei que ele fez o mesmo. Acordei assustada, por um instante sem saber onde estava. A sala agora estava vazia, senão eu e meu gato. A presença antes tão forte de Gustavo minguou e senti um arrepio estranho ao cogitar que ele pudesse ter ido embora sem se despedir. Uma despedida era o mínimo que eu gostaria dele.

Agora Eu Quero IrOnde histórias criam vida. Descubra agora