O dia da caça

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Havia chovido aos montes naquela tarde. Grossas gotas despencavam, enquanto relâmpagos iluminaram o céu constantemente. Mas a noite chegou e o céu carregado se dissipou. De forma que a lua cheia podia ser vista nos flancos que as nuvens deixavam.

Buscando comida, uma rã achou que seria uma boa ideia atravessar a estrada de terra. E talvez até fosse, em dias normais. Só que, no meio do caminho, a desavisada rã foi esmagada pelas rodas de uma picape, que acelerava com vigor para dentro da mata. Ela nem teve tempo de dizer olá à lua.

No volante do automóvel estava Leandro, 36 anos. Advogado, fã de poker e de blues. O carro era dele e, naquela viagem, eles apreciavam os solos de B.B. King. Leandro era razoavelmente gordo para os padrões da boa saúde. Ao seu lado estava Cristiano, seu irmão caçula. Com 33 anos, ele era forte e mais alto do que Leandro. Lutava jiu jitsu e participava das jogatinas poker. Ao contrário do irmão, era casado. No banco de trás, fechando o trio, estava Caíque. Ele havia sido colega de Cristiano no curso de contabilidade e era um ano mais velho.

Os três rapazes estavam juntos para caçar javalis. Eles começaram a prática há cerca de um ano e estavam se divertindo com a atividade. Para ajudá-los, além das armas que portavam, Tigre, Kazão e Nego, os pitbulls de Leandro, viajam na carroceria da picape.

Fim da estrada, hora de entrar na mata. Enquanto alguns grilos eram ouvidos por todos os lados, predominava o som das botas dos rapazes amassando a lama. Leandro e Cris levavam os pitbulls que, excitados, os puxavam. Havia muitos javalis na área, provavelmente os cachorros já farejavam algo.

Para deixar a caçada mais interessante, os rapazes dividiam uma garrafa de uísque. A bebida ia se esvaziando a generosos goles, na medida em que a busca avançava.

Seguiam a caminhada para dentro da mata, com as veias inundadas por adrenalina. Qualquer ruído poderia indicar um alvo em potencial. Os cães arrastavam os irmãos que, com seus punhais, abriam caminho pela vegetação. Atrás deles, Caíque empunhava a arma de fogo. Se alguma ameaça aparecesse inesperadamente, ele, que possuía a melhor pontaria do trio, faria o disparo.

Foi Caíque quem observou as pegadas no barro. Eram recentes e indicavam que um animal grande estava nos arredores. Com certeza era o javali que os cachorros farejavam.

Aumentou, portanto, a atenção do grupo. Guardaram a garrafa de uísque, que já passara da metade. Os irmãos ajustaram suas armas, ajeitaram a faca na cintura. E Caíque, que já dava cobertura ao grupo, redobrou a vigia.

Os cachorros ficaram mais ansiosos, puxando o grupo com força. O javali estava perto. Eles podiam ouvir seus passos, o ruído do animal amassando a vegetação. Mais alguns metros e eles poderiam avistar a presa.

Foi Caíque quem primeiro viu o vulto, cerca de vinte metros à frente. Ele avisou aos colegas, apontando a localização. O javali era grande, devia ter algo em torno dos 100 quilos. A besta revirava o solo, desatenta, sem perceber o que a aguardava.

Haveria duas formas de fazer o abate. A primeira, mas conservadora, consistia em executar o animal à distância, com disparos de arma de fogo. Correriam, entretanto, o risco de errarem o tiro e o animal fugir.

A outra opção era soltar os cães. Em maior número e treinados para o ataque, eles afugentariam o javali, tornando-o presa fácil.

O trio optou pela segunda opção. Soltos, Nego, Tigre e Kazão se lançaram com ferocidade sobre o animal. O javali custou a perceber o ataque. Quando tentou fugir, era tarde demais. Os três cães já o cercavam, latindo ameaçadoramente. Aterrorizado, ele tentou encontrar alguma solução, um caminho para poder fugir. Mas os cães fechavam seu horizonte de possibilidades.

O dia da caçaWhere stories live. Discover now