Prólogo: Dias sombrios

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  O dia nasceu. Como já era esperado que assim fosse. A luz fraca do sol tentava freneticamente cortar as nuvens cinzentas e carregadas que queriam dominar o dia. A noite queria permanecer reinando.

  Seria isto possível? Talvez não na natureza, porem, homens estavam a descobrir o vasto reino noturno pertencente às trevas de seus fétidos corações.

  Naquela manhã tudo estava acabado. Havia um vasto campo de possibilidades para aquele momento, pois eles estavam preparados para tais possibilidades.  Convencidos de tal pensamento, encararam a única coisa que fazia questão de fugir da probabilidade e era justamente por isso, que eles descobriram, o quão despreparados estavam.

  Corpos  decapitados, mutilados e queimados enfeitavam grotescamente o chão, onde o caos festejava.

- O pior aconteceu à fortaleza... - Com suas últimas forças um homem, já sem suas pernas, proferiu suas últimas palavras.

  Quando ele finalmente rendeu-se à morte, teve o rosto amparado pelo chão que um dia caminhou. Caiu aos pés de um cavaleiro revestido com sua armadura de elmo e a cabeça em forma de lobo. A proteção de seu peito era em aço branco, casando com todo o restante de sua belíssima armadura sustentada por  altas, pontudas e afiadas, tal como navalhas, ombreiras. Por baixo de tamanha proteção torácica uma segunda proteção iniciava e lá um tecido, fabricado com pelos de um animal qualquer, corria o corpo até os quadris, onde um leve cinturão protegia e ocultava a parte mais intima do corpo. Suas braçadeiras estavam ficadas somente em seus antebraços e suas luvas carregavam varias lascas de metais pontiagudos, propositalmente, fundidos a ela. Tais lascas cobriam toda a costa da luva. Por fim, tal cavaleiro vestia-se com caneleiras que possuíam três grandes garras, cada uma afixada de forma superior a outra e todas voltavam suas pontas ao céu. Uma armadura que se tornava arma em um combate corporal.

   Assim foi forjada a armadura daquele cavaleiro que, ao observar o cenário em que estava, abismou-se ao ponto de perder sua compostura por um lapso momentâneo. Recuperou-se rapidamente de seu breve assombro e então partiu a caçar algum, possível, sobrevivente em meio à carnificina. Após algum tempo de procura, o cavaleiro escutou um agonizado pedido de socorro ao fundo da pilha de corpos.

  Não pensou. Correu na direção que seus ouvidos lhe guiaram e logo encontrou um homem. O cavaleiro envolveu em seus braços, o pobre homem enfermo com um de seus braços mutilados – que provavelmente teria sido arrancado durante qualquer coisa que tenha acontecido naquele  lugar.

- O que aconteceu? Perguntou o cavaleiro que tentava estancar o sangue que jorrava da parte que sobrará do braço amputado.

- O pior aconteceu... O pior aconteceu a todos nós! O enfermo respondeu. Era visível que os últimos acontecimentos tinham o desnorteado.

  Era notável para o cavaleiro, que o homem não sobreviveria. Em piedade, puxou de sua bainha, uma adaga manufaturada em osso. Manuseou a cabeça daquele homem até que os olhos se encontrassem, para que assim pudesse dizer:

- Diga-me senhor e eu expulsarei a enfermidade que lhe consome.

- A... A...

- Diga-me! - Encorajou ao enfermo que engasgava, com seu próprio sangue, a continuar falando.

- A fortaleza... Ela... Nós fomos amaldiçoados pelos deuses!

 Essas foram as ultimas palavras do enfermo, que lutava contra seu próprio sangue.

- Como  assim?

  O cavaleiro perguntou mais uma vez, porém, aquele já era um corpo sem nenhuma gota do fluido da vida.

   Enquanto do outro lado da ilha, onde os ventos sopravam mais fortes e as nuvens densas e cinzentas dominavam o céu. Naquele momento um homem calvo, com apenas alguns tufos de cabelos brancos e que aparentava ter mais idade do que a vida realmente tinha lhe proporcionado, coberto dos ombros aos pés por uma única peça de roupa, semelhante a uma batina, saiu correndo de dentro de um dos quartos do castelo, atravessou o corredor principal e desceu a escadaria que acessava o salão principal. Correndo contra o vento que balançavam os poucos e ralos tufos de cabelos que lhe sobrara, entrou por uma porta pequena, porém pesada, que concedia acesso a um salão secundário, onde se residia um cálice produzido em ouro e embelezado com rúnicas trabalhadas em prata. No objeto uma chama vermelha incandescente resplandecia.

  O homem tomou uma tocha que havia próxima dali e a ascendeu com a chama do cálice. Após o ato, voltou ao salão principal e passou pela porta de acesso a praça central.

Lá, subiu por uma escadaria e ascendeu um tronco banhado em óleo, que estava firmemente fincado no meio do púlpito do lugar. E, enquanto o fogo espalhava-se, a nuvem branca que era produzida pelo queimar do tronco, levava a triste mensagem para todos que ali estavam.

As Crônicas De Guerra Entre Luz E Trevas - Livro 1: A Fortaleza De FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora