• Na Sala Do Grêmio •

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Senti meu cigarro sendo tirado de minha mão. Encarei o ruivo, que ria e o tragava.

-Tenho idéias pra essa letra. Podemos colocar algumas palavras chave no meio, pra dar ênfase - ele me devolveu o cigarro, pegando a caneta e pensando no que escrever em seu pequeno caderno.

-Tipo quais? - perguntei meio desanimado, batucando na madeira do violão.

-Não sei. Mas é um truque legal que usam. Na maioria das vezes o público repete essas palavras no dia-a-dia. Por exemplo - parou um pouco, antes de continuar - Aquela, cinquenta reais...

-Toma aqui uns cinquenta reais - gritei no ritmo da música, fechando os olhos.

-Essa mesma - ele riu - Tem aquela frase no começo... Que bonito, heim? Minha mãe cantou ela pra mim umas três vezes ontem.

-Sua mãe tem um péssimo gosto musical - traguei o cigarro uma última vez, antes de jogar ali, debaixo da escada onde estávamos.

-Eu gosto dessa música - ele socou meu braço, de leve.

Repeti o ato, um pouco mais forte. Ficamos assim por alguns segundos, um socando o braço do outro, até que uma figura sai da pequena sala de funcionários. Debaixo dos degraus, eu e Flame tinhamos a perfeita visão do presidente do grêmio. O cara rosado.

-Quando ele entrou ali? - perguntei, me referindo ao tempo de quando eu e Flame nos plantamos debaixo das escadarias, para compor e falar merda.

-Não sei, ele deve estar adiantando as questões da prova do segundo ano, talvez? - ele deu de ombros e voltou para o caderno.

O presidente arrumava alguns papéis dentro de uma pasta. Ele era bem desastrado, se tratando de organização e pontualidade. Sempre chegava atrasado nas reuniões da diretoria, e, quando vinha nos adverter de alguma coisa, como... fumar debaixo da escada, mal sabia o que dizer. Ele se enrolava todo ao dar a adversão e jogar na nossa cara o quão politicamente incorreto era isso. Geralmente, recebemos uma nota, com nossos nomes, e nossa punição. Que no caso, era ir ter um passeio na diretoria. Sempre fui pra lá. Eu era o visitante diário do circo que era lá dentro. Ouvia o blá, blá, blá da diretora, e ia embora.

-Terra chamando Marshall Lee? - Flame abanava a mão na minha frente, o encarei confuso.

-Que foi, coiso? - ajeitei o violão em meu colo.

-Estou a meia hora te propondo frases de efeito na porra da letra, e você olhando pra parede - ele tacou o caderno na minha cara.

-Rude, você, bem rude - peguei o caderno, passei os olhos pela folha, e o entreguei em seguida - Estou quase desistindo de fazer isso com você.

-Foda-se, eu não preciso de você - ele se levantou, recolhendo sua mochila e mostrando a língua antes de quase bater a cara no degrau, saindo em seguida, típico do drama que eu aturo.

-Bem trouxa você - sussurrei, voltando minha atenção para as cordas do meu instrumento. Tentei montar algumas melodias, sem sucesso, só pra matar o tédio.

Nesse meio tempo, Flame voltou pra pegar um cigarro e ir embora de novo. Aproveitei e acendi outro pra mim.

Senti um movimento ao meu lado, e me deparei com o rosado, se acomodando ali.

-Proibido fumar - ele me encarou, cruzando as pernas.

-Quem liga? - o encarei também.

-Eu ligo, a diretora liga, meu pulmão liga, e agradece - ele retirou o cigarro da minha mão e jogou longe.

-Não mandei se sentar ai, essa escola tem uns oitenta bancos - o vi meio desconfortável, como sempre.

-Só queria um pouco de paz - ele disse baixo, desviando o olhar para o chão.

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⏰ Última atualização: Dec 23, 2016 ⏰

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