Uma História de Um Capítulo

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Chego próximo ao espelho e posiciono ambas às mãos em cada lado do rosto. Pego a mão direita e passo gentilmente sobre minhas têmporas, então posiciono novamente a mão direita na mesma posição.
Minha respiração está arfante. Brusca. Desregulada.
Tentei manter a calma ali dentro, mas ela não quis ficar, resolveu sair pela porta da frente e então resolvi mata-la.
Puxo minhas bochechas contra o lado oposto do rosto. Cada mão puxando um lado. Estou desfigurada, um monstro.

"Um monstro, um mostro!" Meus pensamentos são insistentes e fazem questão de martelar incansavelmente essa verdade que tem um pouco de inverdade na minha cabeça, o tempo todo, a todo tempo. Tempo?

Não tenho tempo.

Estou suando. Estou tremendo. Não, não preciso de mais uma crise hoje, não é o melhor momento pra isso.

Meu coração está acelerado, e isso me assusta. Como assim eu ainda tenho um coração? Como assim ele está bombeando? Era como ele nunca estivesse ali, só o sinto em momentos como aquele. Apenas em momentos como aquele. Sim, em momentos como aquele. No dia a dia ele não aparece. Não, ele não dá sinal de vida.

Veias, sim, elas estavam ali.

Meu corpo todo está latejando, a adrenalina invade meu corpo e faz com que minhas pulsações acelerem em um compasso descompassado desesperado. Me sinto como uma estrela morta que parece permanecer no céu em um noite estrelada, mas é apenas a sua luz viajando a milhões de quilômetros no espaço-tempo por milhares de anos, ela não está ali como matéria. Um passado-presente? Talvez. É como se ela estivesse viva, mas ela não está. Não, não está.

O belo pode enganar. Uma noite estrelada a céu limpo é linda, nem pensamos no fato de que a metade daquelas estrelas podem estar morta, só vemos a beleza que ela transmite.

A única diferença que vejo entre mim e a estrela, é que a luz que eu transmitir após minha morte será negra e não resplandecerá, tampouco alguém irá admirar essa luz.

Sinto a pressão de dentro para fora. Rajadas de sangue passeando pelas minhas artérias.  A pressão está forte, posso sentir. Estou sentindo tudo. O sangue vem e vai, acompanhando às pulsações do coração, do meu coração. Meu. O coração contrai, e então o sangue pega impulso para ir, e então o coração descansa, e o sangue volta imediatamente para depois ir novamente, mas volta com uma pressão mais baixa do que foi. Às paredes das minhas artéria estão maleáveis. Maleáveis? O que estou pensando? O que está acontecendo?

Quando dei por mim, estava com os olhos fechados, na frente do espelho do meu banheiro,  ainda com minhas duas mãos posicionadas, um em cada lado do meu rosto. Estou parecendo um monstro.

Monstro, monstro!- meus pensamentos reafirmam.

Dou um grito, um grito que estremeceu tudo. Um grito de socorro. Um grito de desistência. Um grito de adeus. Um grito. Um.

Tudo está rodando. Está tudo bem. Não está tudo bem. Não, está tudo bem.

Aproximo mais meu rosto do espelho. Minha arcária dentária está acompanhada em perfeita sincronia com meu aparelho cor de azul, em uma linha nada tênue. Minha gengiva, língua, o céu da minha boca, parecido com um céu vermelho e triste, estavam ali. Isso me faz pensar que sou um amontoado de carne, está tudo amostra. Sim, sou um amontado de carne. Minha boca carnuda dava contorno em minhas mãos. Carne. Células. Veias. Eu sou isso. Eu sou apenas isso. Orgãos, líquidos gosmentos, membros, pele e osso. Skin and bone. Só isso. Milhões de células. Milhões de neurônios. Milhões de Átomos.

Então é isso que eu sou? Sim, só isso. Só isso e tudo isso.

Minhas mãos ainda estão ali, e meu rosto já começa a doer, às bochechas estão doloridas e ao mesmo tempo anestesiadas. Tiro às mãos da posição inicial e abaixo elas em posição reta, agora cada uma está em um lado do corpo, retas e eretas. Olhos arregalados centrados no espelho. Pupilas dilatadas. Piloto automático. Pareço um robô, um robô com coração e que sente dor; a dor carnal e a dor da alma.

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⏰ Última atualização: Jun 22, 2022 ⏰

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