2. Papai e mamãe querem tudo em pratos limpos

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Minha mãe mal olhou na minha cara. Ela acha que vou amassar o meu futuro como uma bola de papel e jogá-lo no lixo de alguma esquina. Ou, pior, acha que eu vou ser traficada.

Ela tá preocupada, escreveu à minha melhor amiga, Josefina.

Estávamos conversando pelo whatsapp porque Josefina (e ela não gosta desse nome) estava no interior do interior do Brasil, onde a internet que prestava só vinha dos créditos, os quais não duravam muito.

Você entende, né?

Claro que eu entendo, mas Jo, é uma oportunidade única. Escrevi e enviei.

Eu não disse para desistir.
Estou contigo nessa.
Quando vai falar com o Bart?! Nossa, é quase inacreditável, Dorota!!

Ri imaginando Josefina empolgada.

Também não acredito!!
Daqui a pouco.
Vamos para o Rio, ele tá no Fasano.
Nunca fiquei tão ansiosa para ir ao Rio.

Josefina demora escrever de volta.

Tenho que ir, Dorota
a vovó quer que eu vá com ela ao supermercado
fica no FIM DO MUNDO
e ainda temos de ir de pé
Eu sou sedentária, ela não percebeu?!

Hahahaha

Boa sorte, amiga
toda a sorte do mundo

Obrigada. Vou precisar.

— Não acredito que estou indo fazer isso. — a voz da minha mãe tinha, sei lá, um tom de choro. (É isso produção?).
— Mãe, você tá chorando?
Estávamos no carro a caminho do Rio. Cinco horas de viagem.
— Não, caiu um cisco no meu olho. Tô bem. — fingiu, olhando para a paisagem borrada do lado de fora da caminhonete.
— Bruna, a gente só vai conversar com o cara, isso não quer dizer que ela vai sair voando por aí. Calma, mulher.
— Você fala isso porque não foi você quem carregou essa menina nove meses na barriga, não foi. — E lá vem o velho discurso de sempre: — Eu e você trabalhamos pra caramba para essa menina simplesmente decidir que não quer mais nada com a vida. Eu queira uma filha juíza, médica ou sei lá, bióloga, mas não, ela quer viver desses vídeos pro resto da vida!
É, fala dos vídeos que te dão de presente esses sapatos que a senhora usa, mãe, vai, fala.
Bufei indignada.
— Bruna, não vou discutir com você sobre isso agora. Vamos conversar com o cara e vê no que isso vai dar. — disse o papai, dando um ponto final naquela conversa.
A mamãe balança a cabeça, negativamente, e volta sua atenção a paisagem lá fora. De todos, a mamãe era quem menos acreditava nessa "carreira", dizia que não me levaria a nada, mesmo depois de dez sapatos comparados com o meu primeiro "salário". Ela queria me ver em algo sólido, fixo, como fazer faculdade de Direito e me tornar uma grande juíza, ou fazer Medicina e virar médica cirurgiã ou qualquer outra coisa que não envolvesse redes sociais e popularidade na web.

Chegamos na recepção do Fasano e o meu pai foi logo perguntando sobre um de seus hóspedes, o Bart.
— Um minuto, por favor. — disse a moça do outro lado do balcão. A moça ligou para o quarto de Bart e avisou que tínhamos chegado.
Depois, ela se voltou para nós com um sorriso gentil nos lábios.
— O senhor Bordelon disse que os esperam no apartamento dele. 203. É só pegar o elevador para o segundo andar. Não tem erro.
Agradecemos e caminhamos até o elevador.

Papai só precisou bater na porta uma vez, Bart atendeu de imediato. Usava um short preto e camisa cinza, um chapéu virado para trás e tênis. Pronto para um passeio pelo Rio, supôs.
Ele nos recebeu com aperto de mão e sorriso branco, nos direcionando para as duas cadeiras que ele havia encontrado naquele cômodo. Eu me sentei na beirada da cama ao lado dele enquanto meus pais nas cadeiras de madeira diante de nós.
— Estou muito feliz por estarem aqui, sr e senhora. Guimarães, muito mesmo. Bom, se vocês tiverem alguma pergunta, esse é o melhor momento.
Meus pais se entreolharam, e quem perguntou no final das contas foi a minha mãe.
— Se concordamos com os termos e tudo mais, como vai funcionar? Onde ela vai ficar? Quem vai cuidar dela? — Papai pressionou seus dedos nos da minha mãe antes que ela metralhasse mais perguntas.
— Bem, acho que a Dorothy já deve ter falado um pouco sobre o que é o Magcon, certo? — meu pai assentiu — Então, é uma turnê, fazemos turnês pelos mundo para que os fãs possam conhecer aquelas pessoas que de alguma forma tocam suas vidas. Um amigo meu enviou um dos vídeos da Dorothy, eu vi e, ainda que eu não entendesse nada de português, achei muito interessante. Um novo conteúdo, muito diferentes das coisas que normalmente os meninos postam. Eu gostei. Vocês já devem ter visto.
— Não, muito, Dorothy tem vergonha. — disse minha mãe, me encarando. Isso era meia verdade, eu tinha mostrado pra ela, só que ela nunca dava atenção — Mas, vamos tentar um dia. Assistir tudo.
— Ela fala sobre bullying, auto-estima, sobre religião, preconceito, aceitação... essas coisas... Isso me interessa. — disse Bart — Mas, voltando, a Magcon trabalha focando no Meet&Great, e o que seria isso? Os fãs vão conhecer seus ídolos, vão poder abraçar, beijar e essas coisas. Por pouco tempo, mas vão. A Dorothy, assim com os outros garotos, será muito bem cuidado. Temos segurança, temos a Becky, que é uma mãe para todos, e todos cuidam um dos outros. Como estamos em turnê no momento, ficamos em hotéis, quando termina, voltam pra casa.
— Ótimo. Bom saber. — um suspiro de alívio passou pelos lábios da minha mãe.
— Agora, quero saber mais sobre você. Se importam...? — Bart pergunta para os meus pais.
Meus pais não demoraram a entender, eles se levantam e saem no corredor.
— Obrigada por isso. — agradeço vendo a porta fechar — O que quer saber?
— Tudo, se quiser.
— Tá. Meu nome é Dorothy Allen, tenho dezessete anos, sou brasileira. Meu pai é americano, então eu falo fluentemente inglês graças a ele, que me ensinou desde pequena e minha mãe é brasileira, claro. Nasci em Macae, hoje moro em São Paulo com meus quatro irmãos e os meus pais. Comecei a fazer vídeos no último ano em Macae com a câmera do celular, meus vídeos tem mais de milhões de visualizações e meu canal ultrapassou os dois milhões a algumas semanas. Nas minhas outras redes sociais é a mesma coisa.
— Ama seu fãs?
— Amo. Muito. Os meus fãs me dão força pra continuar. Tenho períodos de depressão, de baixa auto-estima e é só ver eles me mandando mensagens que isso muda, que eu volto pra superfície.
— Porque DramaQueen? — Bart quis saber, um toque sutil de curiosidade.
Suspirei, o olho coçando pra derramar lágrimas.
— DramaQueen era o apelido que me deram no início do ensino fundamental. Minhas "sessões" de bullying começaram nesse tempo, o do ensino fundamental, e simultaneamente a ele, minha depressão. Então, quando batia em mim essas coisas; suicidou, baixa auto estima, essas coisas, eu entrava em crise, e as pessoas achavam tudo uma frescura. "Ah, é drama dela, ela é adolescente, jovem tem isso mesmo" e ouvir tudo aquilo... — As lágrimas desciam, rolavam pelo meu rosto — Machucava, machucava muito. Por isso, o nome.
Bart ficou silencioso e choroso por um momento, até que se recompôs.
— Vamos chamar seus pais, quero saber dos seus pais agora.

— Bem, conversei com Dorothy e acho que... será muito bom te-lá com a gente. Mas, isso fica a cargo de vocês. Topam?
— A Dorothy é a minha única filha — a voz da mamãe embargou pela segunda vez no dia — Ela tem dezessete anos e quer sair de casa por meses, sabe o quanto isso dói pra mim? Muito.
— Temos garotos mais jovens do que ela, senhora...
— Bruna. Me chame de Bruna.
— Bruna, temos mais crianças na turnê, crianças, e como Dorothy está em período letivo mês que vem vamos providenciar professores para lhe dar aula durante esse período. Certo?
— Deixa que essa parte, eu cuido. Mas, certo. — disse a minha mãe.
Ela adota um semblante passivo, calmo.
Papai olhou para a minha cara de interrogação e disse sorrindo:
— Você vai, Dorothy. Topamos.

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Gritos de animação pela Dorota!
Ela vai!
COMENTEM, tá? AJUDA AÍ, VAI!
amo vocês

Oh, my God! ;; magcon Where stories live. Discover now