drunk.

mi luna.. (capítulo único)

Camila não pode deixar de olhar com tristeza para o horizonte. Sempre que tinha algo incomodando a latina, bastava ela observar a partir da sua varanda, a linda paisagem do centro histórico de Madrid. E era de noite que Camila mais gostava de ficar vendo a sua bendita vista, pois era de noite, que a praça se iluminava, que as famílias passeavam, parando na fonte ou simplesmente se sentando nas esplanadas dos cafés. Mas nem tudo era um mar de rosas. Mas a sua decisão estava tomada, e não tinha mais retorno. O barulho da porta a abrir-se, fez com que a latina suspirasse e encarasse a sua nova realidade.

Lauren caminhou cambaleando, visivelmente bêbada, como todos os dias, todas as semanas e todos esses meses. Mike Jauregui morreu faz um ano do ataque cardíaco e Lauren não tinha superado a morte do patriarca da família.

"Oi Camzi Camzi" a sua voz arrastada, rouca, fez Camila sorrir por segundos. Mas logo se recompôs.

"Bêbeda de novo Lauren?" Perguntou numa voz fria, indiferente.

Lauren parou no meio do corredor, olhando desorientada para a sua esposa. Porque Camila estava falando daquela forma?

"Eu não estou bêbeda..." A hispânica murmurou baixinho.

"Basta! Acabou! Eu não aguento mais ver-te a destruir a tua vida mês após mês. Eu não aguento ver-te a acabares com o nosso casamento por causa dessa maldita bebida. Pelo menos, pensas no teu filho quando bebes assim?" Camila fez um esforço tremendo para não gritar. Ela respirou fundo e colocou a sua mão direita acima da sua barriga.

"Eu..." Lauren começou, tentando se aproximar da sua esposa, mas Camila rejeitou qualquer tipo de contacto e se afastou mais.

"Todos os dias. Todos os dias eu vejo-te nesse estado lastimável. Já pensaste que não foste a única a sofrer com a perda dele?!"

"Ele não era teu pai..."

"Ele foi mais meu pai do que o meu verdadeiro foi!" Desta vez, Camila não aguentou, sua voz subiu alguns tons e ameaçava em tremer "Mike cuidou de mim mais do que eu possa agradecer, eu não era uma nora para ele. E eu também sinto saudades dele, mas eu tenho um filho para cuidar. E se tu não és capaz de tomar conta de ti, não és capaz de tomar conta de nós."

"O que isso quer dizer Camzi?" Lauren perguntou mesmo já sabendo, afinal ela tinha sido avisada antes.

"Eu quero o divórcio e quero-te longe do meu filho."

Lauren arregalou os olhos, mal acreditando que as ameaças estavam a tornar-se reais. Ela tentou, mais uma vez, se aproximar, mas embateu na esquina do sofá, caindo. No chão, a hispânica finalmente se deu conta do que se estava passando. Ela estava a perder não só a mulher da sua vida como o seu único filho. O seu precioso Alejandro. Mas estava tudo tão difícil, estava tudo tão bagunçado. A dor era insuportável, era como se no lugar do meu peito, estivesse um enorme buraco. E ele estava a crescer dia após dia, e a única maneira de eu não sentir era bebendo. Podia apenas ser de curta duração, mas pelo menos eu não sentia a angústia, o vazio, o sofrimento que foi, que é perder meu pai. Eu nunca imaginei que o ser humano fosse capaz de suportar tal perda, mas aqui estava eu, respirando.

"Não.." Murmurei com a cara contra o chão, eu não tinha nem forças para me levantar.

"Eu tenho vergonha, eu tenho vergonha de ser tua esposa. Tu disseste que nunca serias como a minha mãe, e olha onde estás! No chão Lauren! Sem noção do quão deplorável estas." Camila tremia quando Lauren levantou o rosto, olhando com aqueles olhos de esmeralda, completamente apagados. "Eu aguentei, eu juro que aguentei. Mas basta. Eu estou cansada, cansada de ficar a remar sozinha num mar onde a corrente me puxa contra as rochas. Eu amo-te, mas eu não aguento viver num inferno no qual eu passei 15 anos da minha vida."

A latina, retira a aliança do seu dedo.

"No dia em que saí de casa, eu disse para a minha mãe que não iria suportar ter uma pessoa alcoólica como minha esposa, e sabe o que ela disse?" Camila aproxima-se da sua companheira, colocando-se de cócoras. "Ela disse que as pessoas eram todas iguais, que a fraqueza de não suportarem a dor as fazem reféns do vício. Eu virei costas e recomecei uma vida do teu lado. Mas..." Chorando, a latina coloca a aliança no chão. "Mas ela tinha razão."

Lauren estava sóbria. Algo nela fez com que ela fosse mais forte que os litros de álcool que tinha bebido. Ela tinha que pensar no seu filho. Mike morrera, e por mais dor que Lauren sentisse pela perda do seu pai, ela tinha que se concentrar no seu futuro. E neste momento, a luz que tantas vezes a guiou fora da escuridão, estava a fugir. Camila abanou a cabeça, preparando-se para sair da sala, quando a mão de Lauren na sua perna esquerda a fez parar.

"Quando eu te levei pela primeira vez a jantar em minha casa, o meu pai chamou-me a meio do jantar. Estava distraída a falar com a minha mãe, mal notaste que desaparecemos os dois. Ele levou-me até ao escritório, abriu a sua garrafa mais antiga de whisky escocês, e fez-me sentar. Eu nunca tinha visto o meu pai a beber um único copo de álcool" A voz de Lauren continuava a soar rouca, como de costume. Mas Camila conseguia ver o esforço que a sua esposa estava fazendo para falar direito. Ela sabia o quanto magoada Lauren estava, o quanto destroçada ela estava.. "Naquela altura, ele estava tão saudável, tão feliz. Ele levantou o copo e disse "Um brinde". Eu fiquei confusa, perguntei qual era a razão especial que fez com que meu pai quisesse fazer um brinde. Então ele olhou para mim e disse "Minha filha. Durante 25 anos, eu vi os teus desgostos amorosos, assisti a todos os seus corações partidos, vi o quanto isso magoava, o quanto tu te esforçavas por alguém e essa pessoa simplesmente dava 25% de si. Mas aquela garota ali embaixo, ela é o teu sol. Eu vejo a diferença, eu vejo o brilho no teu olhar, o sorriso, a tua expressão muda quando os teus olhos fixam os dela. Ela é a tua luz, e um brinde a isso. Mas um pequeno aviso sobre a minha filha, ela é como uma lâmpada, se a partires uma vez ela apagasse. E o teu quarto retorna à escuridão de novo.". Uma semana depois ele morreu."

Lauren levantou-se, pegando na aliança. Os seus olhos brilhavam, a vontade de chorar era mais forte que ela. A hispânica, acabou por abaixar o seu olhar, envergonhada. A sua mão apertava com força a aliança que nunca deveria ter saído do dedo de Camila. Foi preciso ela sentir a perda da sua mulher para entender o quão errada estava. Foi preciso magoar Camila esses meses todos, meu deus o quão burra e egoísta ela é!

"Tu és a minha luz, o meu sol." Lauren pegou gentilmente na mão da sua esposa e colocou de novo a aliança. "Perdoa-me."

Os seus olhos tentaram procurar os da esposa. Seus dedos, tremendo, pegaram no queixo da latina, obrigando a de olhos castanhos a fixar os seus. Um pequeno sorriso nasceu da boca de Camila. Bastou esse sinal, para Lauren a agarrar pela cintura e a puxar para perto de si. Seus lábios estavam a uma pequena distância, tão pequena que o bafo de whisky de Lauren ainda era cheirável.

"Mi luna" Camila sussurrou, roçando os seus lábios nos da sua mulher. "Regresaste para mí..."

O beijo foi lento. Lauren depositou todo o seu arrependimento nele, e Camila, o perdão, porque ambas sabiam que sem sofrimento não existia amor. Que sem tentar, que desistir, não era opção. E Camila sabia isso melhor que ninguém, porque mesmo tendo saído de casa, ela visitou sua mãe todos os dias até à sua morte. Mas a latina também sabia o quão destroçada Lauren estava e que era preciso um choque de realidade para a trazer de novo à vida real.

Quando o beijo acabou, ambas encostaram as suas testas, olhando profundamente uma para a outra. Castanho no verde, lua no sol. Os dois mundos se chocando de novo, a prova viva que Lauren estava prestes a perder tudo...

"Yo te amo. E a ti también" Ela sussurrou de volta, colocando as suas mãos na barriga bem saliente da sua mulher. Meu campeão.. Camila rodeou o pescoço de Lauren e sorriu. "Tamaño del sol."

Ou seja, do tamanho da Camila.

Porque Camila era o sol de Lauren, e sempre seria, até ao final dos tempos.