Cap. 28: Horror (Parte II: Medo)

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Andei junto a Ônix por todas as passarelas. O sol havia sido engolido pelo horizonte, deixando tudo no mais completo escuro. Ao invés de as luzes ou velas estarem acesas como sempre, nada iluminava o caminho. Precisamos nos guiar pelos corrimãos dourados, esbarrando hora ou outra em eventuais vultos. Os sussurros de medo preenchiam o espaço, como o farfalhar de água. Me aproximei do garoto, quase agarrando seu braço, mas não me atrevi a sussurrar o que queria: um "estou com medo" totalmente infantil.

- Como você acha que vai acontecer? - perguntei, ao invés.

Ônix suspirou, atrás de mim, e seu hálito quente me fez arrepiar.

- Eu já vi, uma vez, algo assim. É terrível, pode acreditar. - respondeu. Ele havia apelado ao humor negro, mas o olhar assustado de seu olho bom entregava os reais sentimentos - bom, pelo menos ninguém vai ver a bela obra de arte em meu rosto, por causa do escuro.

Sem me virar, soquei-o no peito, ouvindo um "ai" como resposta.

- Você acha que falta muito? - sussurrei.

- Alessa... - sua voz era fria - nós já chegamos.

Então, ele puxou as cortinas (que mais pareciam fantasmas atormentados) à nossa frente, liberando um auditório lotado, repleto de murmúrios e com apenas uma lâmpada branca acesa, dentro de um abajur comprido no centro do palco. Tentei enxergar Rubi ou Meena, e até mesmo Bianca, mas não as vi. As sombras se derramavam por tudo.

Sabe um teatro abandonado e sinistro, onde você poderia ouvir os espíritos se lamentando? Então, o auditório, era 10 vezes pior que isso. Cada sussurro parecia um rasgo no peito. Todos estávamos com medo, sem exceções.

- Aqui. - Ônix sussurrou no escuro, empurrando-me de leve em direção a duas cadeiras na metade do auditório.

Quando me sentei, tentei encará-lo, mas estava escuro demais para isso, e seu rosto pareceu apenas um borrão inexpressivo. Estremeci ao olhar para frente, avistando, de longe, vultos se mexerem atrás das cortinas vermelhas. Meu coração quase me fazia saltar no lugar.

Então, o horror real começou.

A pequena lâmpada branca se apagou subitamente, substituída por outras menores, menos claras, e espalhadas em três pontos do palco. Babi, de repente, foi jogada no palanque. Literalmente, ela chegou a rolar. Quando parou e se levantou, arquejei.

Suas roupas estavam imundas, rasgadas, empapadas de sangue. Os cabelos morenos estavam cortados na altura do queixo, como que à faca. As mãos estavam esfoladas, e seus olhos, sempre tão corajosos, estavam repletos do mais completo terror. Ela pousou a mão sobre a barriga, ainda assim protetora.

Os próximos a entrar, foram dois homens e um pobre ser. O garoto estava sendo arrastado, sem conseguir manter o peso do próprio corpo. O que devia ser um cabelo preto e liso, estava todo emaranhado, misturado a sangue seco, com o que parecia fuligem entre os fios. O rosto estava machucado, a pele morena estava repartida em arranhões, inchaços e locais onde havia sido raspada. Vestindo o que seriam consideradas roupas de garçom (um colete preto com botões dourados, calças da mesma cor e uma camisa social branca), mais parecia que suas roupas haviam sido atropeladas por um caminhão e usadas como cabo de guerra. Só de olhar para seus olhos âmbar, soube o quão torturado aquele homem havia sido. Ele e Babi.

Então, se locomovendo como uma cobra prestes a dar o bote, Datha apareceu através das cortinas, em um vestido preto e volumoso. Como ela já era encorpada, o resultado da combinação se tornou um bolo de casamento da cor errada. Na verdade, se pensasse bem, aquele seria o tipo de bolo que distribuiriam em um velório. Quando ela pegou o microfone de seu pedestal, aproximando-o dos lábios vermelhos, me encolhi, da maneira mais covarde do mundo.

Porcelana - A Sociedade Secreta (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora