As batidas do coração

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Angelina

       Deveria ter feito isso a muito tempo, mas não tive coragem. Ver o sorriso dele sempre me faz sorrir. Quando ele dá risada, me contagia e acabo soltando risos estrondosos. Tudo que Marcus faz acaba me alegrando ou me influenciando a fazer alguma coisa também. Ele é perfeito – a sua maneira – e um ótimo ser humano. Além de ser, inegavelmente, um homem altruísta.

        É por isso que eu vou embora amanhã pela manhã.

        Marcus é tão insistente que parece não perceber que nosso casamento vem se deteriorando mais a cada dia que passa. Sim, eu o amo e sei que ele sente o mesmo, mas o amor nem sempre é o suficiente. As vezes é preciso ter mais e nós não temos.

        Talvez, eu devesse estar chorando por ter resolvido ir embora. É provável que a maioria das mulheres estivesse soluçando, com lágrimas banhando a face. Mas eu não estou, nem vejo motivos para isso. Minha situação é tão simples – não deveria dizer isso nessa circunstância, mas é a verdade. Eu amo o Marcus e por isso reconheço que ele merece ser feliz com alguém que dê a ele mais do que eu estou dando – o mesmo vale para mim. Não somos mais felizes como deveríamos ser; não sentimos mais prazer ao compartilharmos da companhia um do outro; não sorrimos mais amplamente como, outrora, fazíamos. Nosso amor ainda existe, mas de que adianta?

        Acho que começamos a namorar apenas por achar que era o esperado que fizéssemos. Nossos pais eram grandes amigos e nunca esconderam que gostariam que fôssemos um casal. Então foi o que fizemos. Nos tornamos um casal.

        Nosso primeiro beijo aconteceu com onze anos e estamos juntos desde então. Já faz nove anos que estamos casados, mas estamos juntos à dezesseis.

        Eu tenho a certeza de que minha decisão é correta.

        Percebi a alguns dias atrás que nós vivemos mais como amigos que se relacionam sexualmente do que como um casal apaixonado. Então, não seria mais fácil vivermos separados para podermos encontrar uma pessoa pela qual possamos verdadeiramente nos apaixonar?

        — Boa noite — Marcus me cumprimenta assim que chega em casa.

        Da posição que estou no sofá – deitada com a cabeça em uma almofada e os pés sobre o estofado – observo ele tirar sua gravata e abrir os primeiros botões da camisa. Esses são seus costumeiros movimentos ao chegar em casa, mas hoje eu o fito atentamente enquanto os faz (será a última vez que os verei ser realizados). Assim que tira os sapatos, se ajoelha próximo ao meu rosto e deposita um beijo casto sobre meus lábios.

        — Eu senti sua falta hoje — informa e acaricia minha face.

        A empresa fora fundada pela parceria entre nossos pais. Ambos morreram faz pouco tempo. Marcus é o dono agora, mas trabalhamos juntos.

        — Não estava me sentindo bem — minto e levo minha mão até seu pescoço – apertando, para massagear seus músculos tensos.

        — Vou tomar um banho — diz e deposita um beijo suave em minha testa. — Quer se juntar a mim? — pergunta com malícia.

        Balanço a cabeça — Não.

        Dou risada de sua incredulidade perante minha recusa e ele segue para o banheiro, também rindo.

        É tão estranho pensar que amanhã a essa hora eu não estarei o vendo.

        Minutos depois Marcus regressa a sala e se senta na outra ponta do sofá, colocando meus pés sobre seu colo.

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