Capítulo 08

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No fim, só mandei aquele selfie vários dias depois. Enviei sábado, no último dia do prazo, só para causar um suspense. Ainda assim quem me surpreendeu foi Michel. Ele não comentou nada da foto, apenas me passou o endereço dele e escreveu 'passa aqui depois do trabalho'.

E o convite não foi a maior surpresa. Eu estava chocado com o tamanho do lugar à minha frente.

Tremendo de nervosismo, eu verifiquei o endereço de novo, parado diante do enorme portão de ferro preto e dourado. Logo adiante, após o vasto jardim de grama verde e árvores esculpidas, havia um espelho d'água e uma mansão branca e rosa de quatro andares, com terraços que davam vista para o mar.

Nem pensar que aquele surfista maconheiro vivia nesse lugar. Eu caí em alguma pegadinha dele.

Quando eu já considerava ir embora, desconfortável com os olhares dos seguranças, um cara atravessou o gramado e acenou para mim.

"Gabe, oi! Abram o portão, ele está comigo." Falou Michel, com um sorriso empolgado e roupas normais que pareciam ser de grife. Era a primeira vez que eu o via fora dos shorts de surfe, e agradeci internamente ter me vestido nas minhas melhores calça e camiseta, para vir aqui.

Assim que entrei Michel me abraçou, todo amigável. Sua voz não-chapada era difícil de reconhecer, e seu cabelo sempre duro de água salgada com areia estava bem penteado, preso para trás com um rabo de cavalo, com uma mecha estrategicamente solta em frente ao rosto.

Para um cara de vinte e oito anos, Michel era muito bonito. Agora que não estavam avermelhados pela maconha os seus olhos brilhavam, revelando um tom cinza-azulado que me lembrava as nuvens de chuva.

"Por quê me chamou?" Perguntei, enquanto contornávamos o espelho d'água. A mansão parecia ainda mais imensa conforme nos aproximávamos.

"Precisa perguntar? Você passou no desafio, somos amigos agora."

Assim que demos um passo na varanda frontal, dois mordomos abriram as portas duplas da entrada. Michel passou à frente com os ombros retos e todo confiante, então me esforcei para fazer o mesmo.

Uma sensação estranha borbulhou meu estômago, e não era a náusea com o qual eu começava a me acostumar.

Talvez eu devesse ter avisado o Dylan que eu viria, mas nós nos encontramos todos os dias daquela semana, sempre para nos divertir e transar como animais. Eu temia que tanta proximidade acabaria nos enjoando um do outro.

Além do mais, algo me dizia que se eu avisasse Dylan ele reagiria mal, então achei melhor vir em segredo. Não queria brigar com ele.

Eu e Michel atravessamos vários corredores e escadarias de madeira escura, com tapetes de veludo. Eu olhava os arredores o tempo todo como um idiota, admirando os largos lustres de cristal e pinturas nas paredes. Quando chegamos ao quarto do Michel eu já me perguntava se conseguiria encontrar o caminho de volta.

O quarto do Michel era grande e bem decorado como o resto da casa, com uma cama de docel branco e uma varanda com piscina de onde podia se avistar o oceano. Mas o que me surpreendia eram as estantes de livro e mesas de estudo. Haviam cadernos e livros abertos por toda a parte, com anotações à caneta e papéis rabiscados.

"Não repara na bagunça." Michel riu. "Eu estava estudando quando você chegou. Tenho prova na semana que vem."

"Prova?" Eu folheei um dos livros mais espessos, chocado com a quantidade de anotações. Era um livro sobre doenças do sangue, ou coisa assim.

"Eu curso medicina, você não sabia? Estou no penúltimo semestre da UniOrse."

Eu arregalei os olhos. Só podia ser piada. Esse idiota que bebe e se chapa até cair, estudando na melhor faculdade do estado? Não, nem pensar. A medicina de lá era conhecida pela dificuldade, quase ninguém conseguia passar pelos primeiros semestres.

O Amante Do Tritão (AMOSTRA)Onde histórias criam vida. Descubra agora