Comatose

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Quando me dei conta, estava de pé numa clareira.

Não sabia se aquilo era um sonho ou realidade, apenas sabia que o céu estava azul como nunca antes, as nuvens eram poucas e a floresta parecia ser a mais bela de todas que eu havia visto. O verde das folhas cintilava, fazendo-as parecer que tinham vida própria.

De repente, alguém chegou perto de mim. Era uma mulher de cabelos negros, pele bronzeada e olhos escuros. Tinha o rosto marcado por tintas vermelhas e pretas, vestia um vestido feito de palha fina, bem trabalhado e trançado, com pedras preciosas pregadas ao busto.

– Eu sou Kira – ela falou, e aquela voz suave e sedosa me lembrou do dia em que fui atacada por Bryan no shopping –, sua ancestral.

Eu não conseguia falar nada. Queria muito, mas parecia que algo me impedia. Como se minha boca estivesse colada com fita isolante, ou como se estivesse costurada firmemente.

Kira fez sinal para que eu me sentasse, e foi o que fiz. Ela sorriu docemente para mim e falou:

– Ah, querida, me desculpe por não deixá-la falar – ela olhou para os lados –, temos pouco tempo e eu não posso usá-lo para responder suas perguntas.

Assenti, pelo menos aquilo eu conseguia fazer.

– A lenda de Kira é verdade – ela contou –, mas antes que eu morresse, deixei um bebê aos cuidados de uma feiticeira. O fantasma do Homem Branco fugiu e viveu no mundo, atormentando pessoas a cada geração.

Ela fez uma pausa, parecendo pensar.

– Eu não sei como foi possível, mas o destino achou um jeito de juntar as peças novamente – ela me encarou. – A feiticeira é sua avó, mãe de Nicolas, a cartomante. Meu espírito esteve com você e sua mãe, nesses tempos. Ah! – Kira lembrou-se de algo. – Sua mãe, Alexia, era uma adorável pessoa. Ela descobriu que poderia ver fantasmas muito pequena, e sua avó está certa quando disse que Nicolas sabia sobre os poderes da esposa, mas ela errou quando disse que ele enlouqueceu porque descobriu que você herdou dele. Ele enlouqueceu porque sua mãe fez um enorme sacrifício por você.

Ao longe, pude escutar um barulho estranho. Kira encarou o céu atrás de mim e respirou fundo.

– Temos pouco tempo, ele nos descobriu – ela continuou: – Sua mãe, para tentar tirar este fardo de você, consultou um demônio maior, por Charlotte. Ele possuiu sua avó para se comunicar com Alexia e disse a ela seu preço em troca de eliminar seu poder. O demônio quis a memória de Alexia, e ela não hesitou em lhe dar. Foi quando ela foi diagnosticada com alzheimer. Quando seu pai soube de tal coisa, dessa forma, ele enlouqueceu.

Mais outro barulho e Kira me encarou com medo.

– Por favor, não queira me fazer perguntas! – ela voltou com o assunto: – Essa é a sua história, Aimee. Aquela carta que sua mãe enviou para o Canadá, foi destinada à Dorothea, sua grande amiga. Ela não tinha familiares em Londres coisa alguma, Dorothea cuidou de você a pedido de sua mãe. Se precisar de alguma ajuda, ela vai estar lá para você, como sempre esteve.

Com este terceiro e último barulho, percebi que ao meu redor as coisas haviam escurecido.

– É ele – Kira levantou-se. – Ele chegou.

*

De início, minhas pálpebras pareciam estar coladas, mas com um pequeno esforço, consegui abri-las. Encarei um teto branco, com uma luminária fluorescente acesa. As memórias da noite anterior vieram como uma enchente em noite chuvosa, mas apesar e acima de tudo, fiquei feliz por estar viva.

Ghost (EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora