Capítulo 20

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Eu enrolei o máximo possível, mas por fim cumpri o combinado com o Dylan. Completados cinco meses de gravidez, eu terminei meu expediente do dia e logo depois pedi demissão.

Já acostumado ao Senhor Jones, não me choquei quando ele apenas sorriu, e disse que sentiria minha falta. Percebendo que comecei a chorar ele me ofereceu um milho-na-manteiga, e disse que aguardaria meu retorno, caso eu mudasse de idéia.

Foi difícil. Chorei todo o caminho em direção às pedras negras, e ao encontrar Dylan chorei ainda mais. Pela história que eu inventei ao senhor Jones, eu e Dylan passaríamos alguns meses conhecendo o mundo.

A verdade é que aquela tarde ensolarada de outubro seria meu último dia de liberdade.

"Não precisa ficar assim, meu predestinado." Dylan me abraçou delicado, não querendo causar dor ao inchaço enorme no meu ventre. Sua voz era doce e chorosa.

Meu Dylan... aquele bobo precisava parar de chorar ao me ver triste ou seríamos pior que um casal de novela mexicana.

"Estou melhor." Me forcei a parar as lágrimas, e olhei para o horizonte.

O mar do pôr-do-sol refletia tons cor-de-rosa, tornando as enormes ondas tubulares uma cascata de ametista, com um cheiro salgado e fresco que aprendi a amar. Perto de nós algumas gaivotas descansavam, já sabendo que Dylan logo pescaria algum peixe. Aqueles bichos sempre interrompiam em momentos bem inadequados, mas naquele momento eu quis abraçá-las, e abraçar as pedras, e até as anêmonas que cresciam entre as fendas. Eu sentiria tanta falta de tudo.

"Por que não monta a fogueira? Trarei o melhor peixe que encontrar." Dylan beijou minha testa, acariciando minha barriga por cima da camisa.

Eu concordei, e Dylan saltou graciosamente na água. Suas pernas tornaram-se uma cauda instantaneamente, e ele desapareceu na profundidade do mar.

Se algo poderia me deprimir mais, era ficar sozinho. Eu torci para Dylan não demorar e me procurei alguns galhos e pedaços de coqueiro que pudessem servir de lenha. Assim que terminei a fogueira Dylan emergiu arrastando o nosso jantar: um peixe quase do meu tamanho, metade azul e metade branco, com um nariz longo e pontudo.

Sempre que eu pensava ter visto de tudo, Dylan me chocava de uma nova maneira. Eu nunca vi um peixe tão grande, e nem tão bonito. Eu considerei perguntar como Dylan pescou algo tão grande desarmado, mas uma dentada profunda na cabeça do bicho respondia a minha pergunta.

O pobre peixe não se manteve bonito por muito tempo. Com um canivete Dylan decepou sua cabeça e destripou a barriga, calmo como quem fazia isso todos os dias.

"É um espadarte." Falou Dylan, rindo do meu espanto. "Meu predestinado está num dia ruim, então resolvi trazer algo especial."

Só então percebi sangue no braço do Dylan. Com o coração nas mãos eu me ajoelhei ao seu lado e confirmei que não era o sangue do peixe (que, aliás, jorrou vermelho em todas as direções até o bicho morrer por completo). Havia um furo no bíceps do Dylan, e parecia profundo.

"Você exagerou. Não precisava pescar algo tão grande."

"Isso não é nada." Dylan riu, terminando de acender o fogo.

"Como assim, não é nada? Olha o tamanho desse bicho, você podia ter se ferido de verdade, por um motivo tão idiota."

Dylan aproximou o rosto do meu e beijou meus lábios.

"A felicidade do meu predestinado não é, de forma alguma, um motivo idiota." Disse ele, e em seguida desceu o olhar à minha barriga, agora exposta. "Pela felicidade dos meus dois amores, eu faria qualquer coisa."

O Amante Do Tritão (AMOSTRA)Onde histórias criam vida. Descubra agora