PRÓLOGO

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*Pim-rim! Pi-rim-riiiiim!*

A segunda-feira úmida raiava, para não dizer inundava, sobre João Pessoa, a capital paraibana. A chuva batia violentamente contra o apartamento mal iluminado de Woshi.

*Pim-rim! Pi-rim-riiiiim!*

Woshi despertou assustado, procurando loucamente por seu celular enrolado em meio aos lençóis negros de sua cama.

- Ah, despertador! - Resmungou sem convicção ao seu celular. -  Vamos lá, primeiro dia da rotina dos próximos quatro anos.

Ainda de mal-humor matinal, levantou-se cambaleando sobre as roupas da noite anterior ainda sem enxergar direito. Aliás, onde estão óculos, hein?

Passou pelo corredor curto do seu apartamento minúsculo, passou na cozinha acionando de pronto a sua cafeteira, seu item mais amado da cozinha. Assim que o aroma forte e suculento de café fresco começou a emanar no ambiente, Woshi começou a despertar.

Intercalando os afazeres matinais com ler e responder e-mails, conseguiu terminar no tempo certo. Assim que colocou suas coisas (mochila, pasta e várias baterias reservas) no carro, finalmente sentiu-se pronto para partir para seu primeiro dia no emprego que dera o sangue pra conseguir.

*PLIM*

- Mensagem já a essa hora? - Indagou-se ao sentar no banco do motorista. O visor indicava que o autor da mensagem era desconhecido, e dizia:

Hoje é dia de fazer escolhas.

Que estranho, pensou. Deve ser engano, com certeza. Ajustou o cinto de segurança e rumou para o seu escritório. O endereço? Assembleia Legislativa do Estado da Paraíba.

*PLIM*
Ainda dá tempo de voltar...

O deputado Mateus Polo era um homem de carreira política consolidada, com diversos mandatos no seu passado. Membro de uma família estruturada, filho de um ex-governador, tinha uma imensa barriga e a cabeça cheia de fios implantados com esmero. Na realidade,  não passa de um oligarca com tendências duvidosas.

*PLIM*

Mais uma mensagem... Ainda desconhecida.

Você ainda está certo disso?

- Humpft, brincadeira de mal gosto. - Fechou a cara - Deve ser um dos sacanas do interior morrendo de inveja...

Trabalhar pra Mateus nunca foi o sonho de Woshi, claro, mas foi uma forma oportuna de começar a traçar uma carreira política. Primeiro conhecer o ambiente, inteirar-se e criar contatos, depois aumentar sua influência e enraizar a ponto de ser parte da nata. Assim uma vida de luxúria se estendia em seu futuro.

Vinte minutos no trânsito preguiçoso e finalmente Woshi chega ao endereço. Dr. Mateus já está em seu escritório. Mal sinal. Um assessor não deve chegar após o patrão, jamais! Xingando mentalmente a chuva e a noite mal dormida, estufou o peito e entrou na sala.

- Bom dia, Dr. Polo.

- Bom dia. - Virou-se do smartphone para reconhecer quem havia chegado. - Ah, olha você aí. - Ergueu o braço pra olhar o relógio.

- Sim... Desculpe o atraso, com essa chuva o trâns...

- Mas você não está atrasado.

- Como? - Mas o que está acontecendo?

- Você chegou com vinte minutos de antecedência.

Woshi pegou seu celular no bolso e realmente, Dr. Polo está certo. Isso significava que quando acordou enxergou um 5 onde havia um 3. Tudo culpa dos óculos que sumiram. Afinal, onde estavam esses malditos óculos!?

*PLIM*
Começou mal, hein!

- Desculpa a confusão, doutor.

- Não tem problema. - Ajeitou-se na cadeira. - Olhe só, serei bem direto contigo. Você sabe porque o último assessor não está mais aqui?

- Não.

- Porque me atrapalhou. - Um curto silêncio atravessou a sala. - Veja bem, você foi bem indicado, tem um currículo bom, mas só isso não te faz ser nada aqui. Eu quero discrição sempre, nada de murmúrios, se ouvir algo, cale-se, ser ver alguma coisa, finja que nunca existiu. Se errar nisso, não posso ter você em meu escritório.

Com suor pingando nas costas, Woshi respondeu:

- Ok, doutor. Tudo bem, entendido.

EFÊMEROOnde histórias criam vida. Descubra agora