Meus olhos estavam a ponto de sair das órbitas de tanto que eu revezava entre olhar pra porta, e olhar para o teto. Valentina havia aprendido muito comigo no pós-acidente, já que agora ela estava se escondendo, e muito bem, porque procurei em cada canto desse lugar -ao menos os que eu conhecia, já que acredito que mesmo com o fim da minha internação não vou ter visitado tudo- e mesmo assim não a encontrei, isso que o pior de tudo era esperar. Eu não nasci pra esperar, eu sou do tipo que faz o outro esperar não o que espera, e cá entre nós, essa atividade era chata pra caramba, eu já estava entediada, e olha que mudei de posição a menos de cinco minutos.
O céu lá fora já estava escuro, e apesar da grade de proteção, que a meu ver não servia pra nada, a visão das estrelas era bem nítida. O jantar havia sido a mais ou menos meia hora atrás, mas não vi Valentina, o que só me deixou ainda mais revoltada. Que tipo de pessoa perde o jantar, sabendo que a próxima refeição é o café da manhã? Valentina é claro, a diferentona. A única coisa que me acalmava era saber que lá fora, no corredor, há essa hora, um ser aterrorizantemente fofo vagava em seus saltos plataforma, atrás de qualquer alma que se aventurasse a desrespeitar o toque de recolher. Sim, Silvinha era minha última esperança no momento, e graças a ela, depois de mais dez minutos encarando o mural e o armário, Valentina deu o ar da graça.
_Valentina Maia, olha nos meus olhos e me diz que você não me sabotou! -falei assim que ela fechou a porta atrás de si. Valentina me encarou surpresa, mas depois iniciou um sorriso sorrateiro de criança que aprontou
_Eu não te sabotei -afirmou com a cara lavada, ah essa garota
_Você está mentindo -rebati, ela mesmo havia afirmado com todas a as letras que seu plano havia dado certo e o meu não, se isso não é sabotagem não sei que nome recebe
_Você me pediu pra falar isso -então se tratava de uma diversão pra ela, brincar comigo, bem, eu nunca fui adepta a esse tipo de brincadeira. Lhe lancei o olhar mais ameaçador que consegui e ela revirou os olhos com isso, se sentando na cama a minha frente - afinal de contas, prefere que eu fale o que quer ouvir ou a verdade?
_Acredito que as duas opções possuem a mesma resposta -minha vez de arquear a sobrancelha. Parece que o jogo virou não é mesmo?
_Depende do ponto de vista -Seu sorriso se alargou ainda mais com minha resposta- e como eu disse, eu não te sabotei.
_Você chegou exatamente no momento em que eu ia conquistar minha liberdade, fez sua melhor atuação como coitada e depois ainda acrescentou o quanto era importante a minha presença na sua recuperação -cruzei meus braços me lembrando do infame momento em que perdi meu plano B- e ainda por cima, veio se vangloriar pelo sucesso obtido. Se isso não é sabotagem como se chama?
_Ajuda? -sugeriu- Olha, eu sei que pode não parecer, mas eu estava te ajudando- encarei-a como se dissesse 'É sério isso?'- você pode não perceber agora mas ainda vai me agradecer por não ter te deixado ir.
_Ah claro, no dia em que chover chocolate -ironizei
_Sonhar não custa nada -ela disse dando de ombros
Valentina começou a se arrumar para dormir, aparentemente ela tinha novos pijamas sempre, já eu dormia com uma camisa velha do Mamonas Assassinas, presentinho do meu pai que era fã. Voltei minha atenção para o que era importante, -e eu não estava falando das pantufas de coelhinho- de qualquer forma nossa conversa não nos levou a lugar nenhum, ela não havia afirmado nada, mas eu não precisava de confirmação, Valentina aprontou comigo e essa história de ajuda é mentirinha pra boi dormir, não vou cair nessa. O problema é que quando ela quer falar ela fala até demais, quando não quer não há quem abra o túmulo que se chama sua boca.
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Minha geração problema
Novela JuvenilAlexia era uma garota normal, ou pelo menos queria ser. Ela não se lembrava exatamente quando começou a se sentir diferente, mas se lembrava de quando teve certeza que não era como as outras pessoas. Agora ela precisa provar que não tem um problema...