Totalmente suja, segui Ônix pelas passarelas da Sociedade. A curiosidade me corrompia, mesmo após chegarmos até o estúdio.
Ali, entramos e fechamos e porta, cada um sentando-se em um canto diferente.
- Muito bem. - murmurou, apontando para a mesa de madeira à sua frente - por favor, sente-se ali. O sol está... batendo com mais intensidade.
Ônix mentia muito mal. Mas, mesmo segurando o riso, fiz o que pediu, tentando adivinhar quais eram suas intenções.
Ele passou para trás de uma tela em branco, arregaçando as mangas e sacudindo a camiseta manchada, que marcava seu corpo perfeitamente. Ainda cheirava a doce, algo que me fez sorrir.
Sentada no balcão, começei a sacudir as pernas e olhar em volta, percebendo a falta de pinturas. Normalmente, as paredes encontravam-se repletas de trabalhos seus, como um quarto pessoal. De acordo com o que eu mesma vira, ele era o único a utilizar aquele espaço.
- Andou tendo entregas? - perguntei, distraída.
- Aham. - respondeu, pegando um lápis e deslizando-o pela tela. O som macio foi como a primeira nota de uma música - um Frequentador quis vários quadros de paisagens. Era isso o que eu estava fazendo.
Pisquei.
- Ah.
Alguns momentos de silêncio se passaram. O som do lápis raspando na tela era o único ruído audível, confortável e relaxante. Me peguei até sonolenta, algo que não acontecia frequentemente. Estava tendo muita insônia, virando as noites com uma dor de cabeça infernal, que sumia pela manhã. A preocupação estava tomando forma, e pensei seriamente em contar para alguém. Só ia esperar Rubi melhorar, para não sobrecarregar Bia nem Ônix.
- Hã... eu... - o garoto começou, fazendo-me virar em sua direção - resolveram que irão fazer as visitas familiares em breve.
Não nego que fiquei surpresa. Achava que demoraria mais para que nos permitissem sair.
- Como morávamos longe - continuou, antes que eu argumentasse - em Alexandria, para ser mais exato, Datha nos permitiu levar uma companhia, por assim dizer. E, claro, na volta, essa companhia poderia visitar os próprios familiares.
Arregalei os olhos, percebendo para onde se dirigia o assunto.
- Ônix...
- A questão é: você quer ser essa companhia? - despejou, parecendo tirar vários quilos de cima dos ombros.
O choque me percorreu. Ele queria que eu fosse junto para visitar sua família? Família a qual ele jamais mencionara? Saltei da bancada.
- Nossa...
- Quanto mais longe, é melhor levar mais pessoas, para ser mais fácil de vigiar e poderem fazer uma viagem só. - falou rapidamente, quase atropelando as palavras - Sei que não é exatamente seu sonho de viagem, mas...
- Eu aceito! - exclamei, interrompendo suas divagações.
Percebi o quanto ele mesmo ficou surpreso, chegando a parar o lápis que usava para desenhar. Esperava que eu negasse.
- Sério? - perguntou.
Sorri, correndo para o seu lado.
- Claro!
De repente, olhei para o que ele tanto desenhava e apagava, arrastando materiais de um lado para o outro. Meu queixo caiu.
- Desculpe. Sei que ficou horrível, mas eu tento consertar mais tarde... - falou, torcendo os dedos.
Na tela, eu estava desenhada, sentada no balcão de madeira e olhando em volta. Minha expressão era distraída, viajante, meio alegre meio triste. Meu cabelo, ao invés de loiro, estava retratado com a cor do grafite, uma representação do castanho que era antes. Tudo era apenas um rascunho, mas, mesmo assim... era tão lindo. Se eu olhasse aquilo por muito tempo, conseguiria imaginar que nada havia acontecido, que a Sociedade não havia me encontrado, e que eu própria não tinha mudado. Que o mundo era... bom.
Sem perceber, meus olhos umedeceram, e minhas mãos começaram a tremer. Agarrei o colarinho de Ônix, ignorando as manchas vermelhas.
- Está... perfeito. - murmurei, ainda abalada pelo choque de realidade.
Ele levou suas mãos ao meu rosto, a expressão preocupada.
- Não chore, musa. Eu fiz isso para você ficar feliz. Se soubesse que ia chorar...
- Não apague isso. - interrompi, perdendo a força do aperto - se não eu te mato.
Ônix sorriu levemente, aproximando ainda mais seu rosto do meu.
- Olha... você já está chorando. - secou uma lágrima com o polegar, cuja qual eu nem percebera ter derramado.
- Não é de tristeza... - sussurrei, a voz trêmula - estou chorando de alegria.
Seu sorriso aumentou.
- Melhor, então. - murmurou, terminando a distância.
Sua boca encostada à minha, novamente, me fez arrepiar. Fazia alguns dias que eu o havia beijado, mas parecia muito tempo. Era como se... qualquer espécie de distância fosse grande demais para aguentar.
Inclinei a cabeça, sentindo o sabor de seus lábios. Pitanga. O gosto das frutas de mais cedo. Ônix, então, começou a acariciar minha bochecha com uma mão, enquanto passava a outra para as minhas costas. Enlaçei seu pescoço com os braços, tocando os cabelos brancos e cacheados. Estavam repletos de doce, mas continuavam macios ao ponto de deslizar pelos dedos. Apoiamo-nos em uma mesa de madeira, sem prestar atenção no que acontecia em volta. A única coisa que importava no momento, era o ponto que nos mantinha conectados.
Ele apoiou as mãos na mesa, em seguida levando-as ao meu rosto. Senti algo frio em seu toque morno, mas não consegui abrir os olhos. Sabia que se o fizesse, ficaria presa na imensidão verde e negra de suas íris.
Tirei minhas mãos de seu cabelo, descendo para os ombros e para a marca em seu peito. Quase me desequilibrei, precisando buscar apoio no balcão, e senti novamente o toque frio, dessa vez em minhas mãos.
Ônix suspirou, seu hálito quente fazendo cócegas em meu pescoço. Novamente, segurei seu rosto com as mãos, fazendo círculos com os indicadores. Delineei seu queixo angulado, suas maçãs do rosto retas e peguei as pontas de seu cabelo. Tudo era tão vicioso, que relutei em me afastar. Ele, percebendo minha luta interna, respirou fundo e afastou nossas bocas, abrindo os olhos. Encarou-me profundamente, demonstrando um carinho brilhante em seus olhos.
Somente neste momento, depois de ter recuperado o foco da visão, foi que percebi: o toque frio, na verdade, era tinta.
- Ah, não! - exclamei, olhando para mim mesma.
Em minha pele e roupas, além das manchas vermelhas de antes, encontrei tinta azul escura, que escorria pela saia do vestido. O balcão no qual me apoiara, estava cheio de potes de tinta, que tínhamos virado um no outro. O rosto de Ônix, por minhas mãos, estava repleto de amarelo.
- Eu realmente deveria fazer mais desenhos seus, musa. - murmurou, mais para si mesmo.
Encarei-o, pela segunda vez.
Ao invés de estar assustado com toda a bagunça esplêndida, ele sorria, brincalhão. Era a primeira vez em que eu via um sorriso inteiro dele, que chegava a mostrar os dentes.
Talvez por isso, meu rosto tenha refletido tal emoção, misturada a um medo arrasador. Não era por causa do coração acelerado, aquecido. Não mesmo.
☆
☆
☆Oi gente!!!!
E então? O que acharam? Cap adiantado, eu sei. Mas, gostaram?
Espero que sim. ^^
Bjsss, comentem!!!
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Porcelana - A Sociedade Secreta (Completo)
Fantasy☆Sociedade Porcelana - Livro 1☆ "Pareciam bonecos em uma estante. Seus rostos, tão lindos, não tinham emoção alguma. Suas peles, tão brancas e sem marcas, pareciam porcelana. Seus olhos, tão multicoloridos, pareciam pingos de cor em uma tela vazia...