9. Bruna - Calma, Bruna.

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─ Calma, Bruna. Calma. Você é muito exigente com você mesma. – Carlos Eduardo estava tranquilo como se estivesse em um chá com a rainha da Inglaterra. Nem suava. Eu, em compensação, quase derretia. Era a quinta vez que ele me explicava o mesmo passo. Tantas vezes eu girava quanto caía. – Presta atenção. Você não vai se apoiar em mim como se eu fosse a última tábua de salvação. É só um apoio. Vamos novamente devagar. Respira. Segura o abdômen. Gira. Ok?

Devagar era moleza, mas no ritmo era quase impossível. Eu ficava com medo de cair, me agarrava nele, o giro ficava imperfeito e eu acabava caindo para o outro lado.

─ Você precisa confiar em mim, garota. Eu não vou te deixar cair. Prometo. – A maneira como ele disse isso me fez criar coragem para tentar. Era impressionante a transformação de Kadu dentro daquela academia. Lá dentro, ele era só certeza. Na escola, quase ninguém ouvia sua voz. Talvez só os esquisitos da turma dos desenhos japoneses.

Tentamos mais uma vez. E eu consegui. Girei e não caí. Entrei direto no passo seguinte sem um errinho sequer. Ele sorriu para mim satisfeito. Eu pulei nos braços dele eufórica. Depois de tanto esforço, eu merecia um abraço. Eu merecia uma capa de jornal, uma medalha de honra ao mérito para falar a verdade. Estava apenas me contentando com o abraço.

─ Eu sabia que você conseguiria, Bruna. – Carlos Eduardo retribuía meu abraço, ele brincava com os cachos dos meus cabelos. – Bastava acreditar mais em nós dois. Nós somos parceiros, não somos?

─ Somos. – Eu disse e me soltei do abraço, ainda feliz com o passo.

O ensaio entrou pela noite, quando nos demos conta de que horas eram, passava das oito. Deitamos um do lado do outro no chão frio. Aquilo era bom. Esticamos as costas. Eu estava exausta, cheia de hematomas e bastante descabelada. Nem liguei, Kadu estava nas mesmas condições. Pelo menos fizemos progresso.

Encostei minha cabeça no ombro dele, ficamos olhando para o teto, tentando encontrar o ritmo da respiração. Engraçado como esse negócio de dança faz as barreiras físicas caírem. Depois de tanto esfrega, queda e riso, eu não vi problema nenhum em me encostar ao garoto de cabelos oleosos da minha sala. Deitados no chão, completamente exaustos, nós éramos apenas amigos.

Eu não tenho muitos amigos, por isso, ao pensar nisso fiquei meio sem jeito. Nessa hora, sem tirar os olhos do teto, Carlos Eduardo pegou a minha mão e levou aos lábios dando-lhe um beijo delicado.

O gesto me desestruturou. Era de uma sutileza doce. Sem segundas intenções, sem nada. Daí ele virou para o outro lado, apoiou as mão no chão, se levantou e depois me ofereceu a mão para ajudar a me levantar. Kadu sorriu e eu sorri de volta. Nós encontramos nossa parceria. E agora ela estava em todos os nossos movimentos.

Kadu tirou a camiseta enquanto arrumava suas coisas. Finalmente tinha conseguido fazê-lo suar. Não resisti e caí na besteira de olhar para ele como mulher. Depois de tantas horas encostada naquele corpo, não podia deixar de notá-lo.

Ele era magro, mas um magro definido. Os braços eram bonitos, bem delineados. E tinha aquele tigre de olhos azuis como os dele. O tigre me hipnotizava. Kadu colocou uma camiseta limpa, limpou as lentes dos óculos e reforçou o perfume.

Ah! O perfume!

Nossa! Como ele cheira bem. Cheiro de perfume caro. Cheiro de menino rico. Mesmo depois de horas de atividade física, ele tem um cheiro inebriante. Eu nunca tinha reparado como esse garoto é cheiroso. Dá vontade de ficar abraçada com ele de tão gostoso que é, do desodorante ao cabelo aloirado. Tudo cheira bem.

─ Quer lanchar, Bruna? – Ele me convidou.

─ Não dá. Amanhã logo cedo eu tenho um comercial para gravar. – Respondi meio sem pensar, ainda embriagada pelo cheiro dele no ar.

─ E o que é que uma coisa tem a ver com a outra? – Ele ficou olhando para mim com a carinha mais desconfiada do mundo.

Garotos, ele não fazem a menor ideia dos sacrifícios necessários para aparecer sem um pingo de barriga numa campanha publicitária. Meu jantar seria um copo de suco de laranja sem açúcar.

***

Por Onde AndeiOnde histórias criam vida. Descubra agora