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- IDIOTA - ouço o grito vindo da casa ao lado.

Isso está virando frequente e irritante. Saio preguiçosamente do sofá e vou para a casa vizinha.

Os gritos continuam.

Bato na porta.

Ninguém atende.

Bato de novo.

Nada.

- VOCÊS PODEM PARAR DE GRITAR? EU NÃO CONSIGO OUVIR NEM A M*RDA DA TV - grito.

Uma garrafa de vidro cai perto de mim.

- ERA PARA CAIR NA SUA CABEÇA - o garoto grita do segundo andar.

- DEIXE DE SER IMBECIL - a garota grita com ele.

Ouço um barulho forte vindo de lá de dentro.

- EU VOU LIGAR PARA POLÍCIA - grito.

- AINDA SÃO NOVE E CINQUENTA, A LEI DO SILÊNCIO COMEÇA ÀS DEZ, IDIOTA - o garoto grita de volta.

- VÃO PRA M*RDA - grito e volto para casa.

Diferente de algumas pessoas, eu não quero saber da vida alheia. Na verdade eu queria dormir um pouco antes de fazer o trabalho da faculdade, mas esse barulho todo não deixa. Tomo um remédio para a dor de cabeça que começou há pouco tempo e volto ao sofá.

Eles finalmente alcançam o silêncio.

Cochilo por um tempo mas acordo quando um barulho forte vem da casa ao lado. Olho pela janela e tem uma mala no chão. Vejo a garota descendo pela árvore próxima da casa.

Quando ela está quase no chão, mais ou menos uns dois metros, ela escorrega e cai, mas se recompõe rapidamente e sai determinada. Mas sua determinação vai diminuindo até chegar no final da quadra quando cai sobre os joelhos.

Pondero lá, e chego à conclusão de que não é da minha conta. Mas  minha casa é a última do quarteirão e começo a ouvir seu choro baixo.

Eu não podia deixar ela de noite, no frio, chorando no chão.

Pego um casaco a mais e vou em direção à ela.

- Você está bem? - pergunto chegando perto dela.

- Claro. Todo domingo de noite eu me jogo no chão e começo a chorar, adoro fazer isso - ela responde sarcástica.

Tudo bem, não foi uma das perguntas mais inteligentes.

- Terminou com seu namorado?

- Ele é meu irmão.

- Ah - a conversa morre ai por alguns minutos, a noite está esfriando. - Vai sair de casa?

- Sim.

- Vai para onde? - pergunto.

- Não sei, algum hotel.

- São... - olho no celular. - Meia noite e vinte - Eu dormi isso tudo? - Não vai conseguir uma vaga em um hotel agora.

- Então vou para um parque próximo.

- Vai dormir na rua? - pergunto assustado.

- É o jeito.

- Não pode ir para casa de uma amiga?

- Não quero perturbar elas agora, e elas vão fazer perguntas.

- Volta para casa.

Ela volta a chorar.

Não acredito que vou fazer isso.

- Pode passar a noite na minha casa se quiser.

- Eu não quero atrapalhar - ela diz.

- Não vou conseguir dormir sabendo que você está dormindo em algum banco por aí.

- Não é verdade - ela tenta secar as lágrimas.

- É sim - olho sério para ela.

- Ok.

Vou até a porta de casa mas ela não me segue.

- Vamos - digo. - Se está pensando nisso, eu não vou te fazer nada. Ainda sou o mesmo garoto que te acompanhava até a escola cinco anos atrás.

Ela não se move.

Vou até ela e estendo a mão.

- Vem.



21st Century Girls - myg (Concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora